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Quem Lula poderá indicar para a vaga de Barroso no STF?

De um lado, uma demanda social: é preciso ter mais mulheres e pessoas negras no Supremo; do outro, o Messias A aposentadoria precoce do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso está movimentando o mundo jurídico em Brasília (DF). O magistrado deve deixar a Corte no próximo sábado (18), e uma lista longa […]

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Ricardo Stuckert/PR

De um lado, uma demanda social: é preciso ter mais mulheres e pessoas negras no Supremo; do outro, o Messias

A aposentadoria precoce do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso está movimentando o mundo jurídico em Brasília (DF). O magistrado deve deixar a Corte no próximo sábado (18), e uma lista longa de possíveis candidatos já circula nos corredores do Planalto, ao contrário do que dizem alguns analistas.

“Deve haver nomes que não foram ainda expostos ao público. Certamente há algumas dezenas de candidatos”, disse ao Brasil de Fato o ex-procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) e advogado membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Roberto Tardelli.

“Ninguém que é efetivamente candidato vai chegar e dizer o seguinte: ‘Eu quero ser ministro do Supremo Tribunal Federal’, até para não correr o risco da rejeição. Então é aquela história, todo mundo nega, mas é uma estratégia”, avalia o jurista.

Quando questionado sobre o assunto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tem a prerrogativa constitucional de indicar os ministros do STF, a resposta é sempre o óbvio ululante: “notável saber jurídico” e “reputação ilibada”, exatamente aquilo que diz a Constituição Federal. E numa linha de afastar qualquer questionamento de favorecimento pessoal, o presidente tem repetido que “não quer nenhum amigo” na Suprema Corte.

“Quando ele [Lula] disse que quer um ministro, não quer um amigo, me parece que ele pretende indicar alguém que tem solidez jurídica, solidez doutrinária, solidez conceitual e um sentido de independência funcional bastante desenvolvidos. Porque é um cargo em que você se torna vitalício, em que você só sai por idade ou porque quer sair, como foi o caso do ministro Barroso, ou morte”, avalia Tardelli.

Figura próxima ao presidente Lula, e um dos seus conselheiros em matérias jurídicas, o advogado e jurista Marco Aurélio de Carvalho avalia que além dos critérios estabelecidos pela Constituição, há um critério do qual o presidente não abre mão: a lealdade.

“A indicação é política, então a lealdade é fundamental. Ao lado dos requisitos constitucionais que são: notável saber jurídico e reputação ilibada, é fundamental, indispensável, exigível, [que seja] uma pessoa leal, uma pessoa íntegra, que tem espírito público”, considera o jurista, que integra o Grupo Prerrogativas, formado por advogados, professores e juristas brasileiros.

“Ele nomeou pessoas para STJ [Superior Tribunal de Justiça], desembargadores federais, desembargadores eleitorais, sempre levando em consideração, fora da formação jurídica, que é um requisito constitucional indispensável, a reputação ilibada e a confiança”, lembra o advogado, ponderando que aplaudirá “qualquer que seja a escolha”.

“Nós vamos apoiar qualquer que seja a escolha dele [Lula]. Nós achamos que só a ele, apenas e tão somente a ele, cabe o direito e o dever de fazer essa escolha. Nós vamos reconhecer, louvar e aplaudir qualquer que seja a escolha, porque é a ele que cabe o direito e dever de fazer ser escolha. O que não quer dizer que eu não posso, evidentemente, ter o meu preferido”, afirmou Carvalho ao Brasil de Fato.

O favorito

O critério da confiança é o que tem elevado o perfil do atual advogado-geral da União (AGU), Jorge Messias, que tem o respaldo de Carvalho.

“Acho que talvez a pessoa melhor colocada seja o Messias. Ele tem história de formação política, tem reputação ilibada, tem espírito público e tem sensibilidade social”, considera o jurista.

O advogado-geral da União e favorito para a vaga de Barroso, Jorge Messias. | José Cruz/Agência Brasil

“Eu fico feliz de saber que o meu preferido hoje é o que mais reúne condições de ser escolhido. É uma análise das circunstâncias dessa indicação, por um lado, e um desejo, porque eu acredito que ele é melhor nome, por outro”, afirma.

Nomes como do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, também estão entre os cotados.

Representatividade feminina: “Um escândalo nacional”

Contra as candidaturas masculinas, tem ganhado força um movimento para que o presidente Lula indique uma mulher, preferencialmente uma mulher negra, para ocupar a vaga de Barroso. Atualmente, o STF só tem uma ministra mulher, Carmen Lúcia, que deve se aposentar compulsoriamente em abril de 2029, após completar 75 anos, como determina a Constituição.

“Há o movimento feminista que reivindica a nomeação de uma jurista, de uma mulher no cargo, o que me parece absolutamente razoável, porque o Brasil talvez seja, dos principais países do mundo, o único que na sua Suprema Corte só tem uma mulher. Isso é efetivamente um escândalo, um dos escândalos nacionais”, aponta Tardelli. “Há dezenas de brilhantes juristas que podem fazer uma judicatura do Supremo”, pontua.

Composição atual do STF, mais o Procurador-Geral da República, Augusto Gonet (faixa vermelha). | Fellipe Sampaio/SCO/STF

“Ele [Lula] tem que se manter numa reserva estratégica e dizer o seguinte: ‘Olha, eu vou escolher aquele que eu achar melhor’. Mas ninguém pode deixar de afirmar que ele não esteja considerando isso, porque é algo que obrigatoriamente deve ser considerado”, completa.

Marco Aurélio Carvalho concorda que há muitas possibilidades de escolhas entre juristas mulheres, no entanto, pondera, “elas não possuem o convívio” com o presidente, necessário para ganhar a “confiança” do mandatário.

“Tem várias mulheres, mulheres incríveis, inclusive do [Grupo] Prerrogativas, eu posso te citar aqui várias: Dora Cavalcante, Flávia Rahal, Vera Araújo, Edilene Lobo, todas elas mulheres incríveis. Só que a confiança não é uma coisa que você simplesmente ganha, você conquista. E uma coisa que é determinante na confiança é o convívio. Ele [Lula] não tem convívio com essas mulheres”, avalia.

Por outro lado, Carvalho afirma que “não pode passar despercebido” o fato de que o presidente Lula é o “recordista” na indicação de mulheres para cargos do Judiciário.

“O compromisso que o presidente tem com a nomeação de mulheres é um compromisso indiscutível. Ele foi e continua sendo o recordista absoluto em nomeações de mulheres para o sistema de Justiça”, avalia.

“Ele nomeou as duas únicas mulheres pretas da história do TSE, que atualmente compõe a Corte, a ministra Edilene Lobo e ministra Vera Araújo. Recentemente, uma terceira mulher para compor a mais alta Corte eleitoral do país, que é a Estela Aranha. Portanto, são três indicações para o TSE”, completa, reafirmando sua posição pela indicação de Jorge Messias.

“Embora eu mesmo tenha um compromisso com a nomeação de mulheres, nesse momento, acho que a indicação do Messias seria, digamos, um grande acerto. O Messias tem um apoio de todo o entorno do presidente, ministros de Estado, lideranças políticas da base, no meio evangélico, tem apoio dos amigos e ele tem um convívio com o presidente”, ratifica o jurista.

Atitude deve ser fiel da balança

Na avaliação do advogado Breno Cavalcante, membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, é preciso “desfulanizar” o debate sobre a confiança necessária para receber uma indicação ao STF.

“Eu acredito que a gente tem que deslocar esse debate da confiança em pessoas. As pessoas, para serem escolhidas precisam ser analisadas em relação a sua trajetória, a seu compromisso com projeto, e não só o projeto político do Partido dos Trabalhadores, é um projeto democrático-popular, é um projeto de construção de uma nação soberana, com justiça social, que diminui desigualdades sociais, regionais, raciais, de gênero. Então é a trajetória da pessoa e os compromissos assumidos, as atitudes tomadas, é que devem ser determinantes”, avalia.

“Onde essa pessoa estava em 2016, quando houve um golpe parlamentar, jurídico e midiático no Brasil, que tirou a presidenta Dilma [Rousseff] do poder? Onde essa pessoa estava em 2018, quando Lula foi preso, quando a operação Lava-Jato fez uma série de crimes e nós da ABJD lutamos, denunciamos esses crimes? O que essa pessoa fazia? Como ela se posicionou?”, questiona.

Por outro lado, Cavalcante acredita que é preciso reconhecer as “más escolhas” feitas no passado, levando ao Supremo pessoas que tem atuado na desconstrução dos direitos sociais e trabalhistas, o que vai de encontro ao projeto político defendido pelas forças progressistas.

“Em relação aos direitos sociais, o STF tem sido terrível, desde a terceirização irrestrita passando pelo fim da ultratividade das normas coletivas, pela permissão de redução de salários por acordo individual durante a pandemia, sem participação dos sindicatos, e a tendência que a gente vem observando em recursos extraordinários que chegam ao Supremo, é que a Suprema Corte tem tido um posicionamento majoritariamente patronal. A gente precisa mudar isso. E os nomes ajudam a mudar isso”, considera o advogado.

Não é só simbólico

Cavalcante propõe que o debate sobre a indicação de uma mulher negra, comprometida com a pauta da classe trabalhadora, vai ao encontro da necessidade de combater as causas do avanço da extrema direita no Brasil.

“Quando você terceiriza irrestritamente, quem é que mais sofre acidente de trabalho senão as pessoas mais pobres? As camadas populares que são majoritariamente negras, sobretudo, os trabalhadores precarizados. Quando você amplia a informalidade com a pejotização, quem sofre mais são justamente as classes populares, em sua maioria, mulheres negras. Então você vai desconstruindo a proteção social da Constituição Federal de 1988, por meio de decisões judiciais, e prejudicando justamente essas maiorias numéricas do país. E essa desproteção social é terreno fértil para o crescimento do fascismo”, alerta o advogado.

“O Supremo agiu muito bem no julgamento da tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023. É preciso parabenizar o ministro Alexandre Moraes e os demais ministros que se posicionaram com firmeza na defesa da democracia. Mas se na outra ponta o STF, que tem maioria identificada com a perspectiva patronal, você vai desconstruindo a proteção social, os direitos trabalhistas, a Previdência Social, vão se criar novos ‘8 de janeiro’”, pondera Cavalcante, agregando que o STF “combateu as consequências” do fascismo, mas não as causas do ressurgimento dessa ideologia supremacista.

“O STF precisa se voltar para combater as causas. E para isso, a indicação de pessoas com esse perfil, de defesa da democracia, e também alguém que viva essas contradições, que viva essa vulnerabilidade social, econômica, racial, que saiba do que se está falando quando se fala em racismo, se fala em racismo estrutural, quando se fala do machismo”, defende o advogado.

Finalmente, Cavalcante critica o lobby exercido por poderes econômicos e políticos sobre a Suprema Corte, enquanto os trabalhadores seguem desprotegidos. “A gente tem que ter uma ministra ou ministro que chegue no Supremo e não tenha receio de desagradar grandes grupos empresarias, mas, sim, [que tenha receio] de desagradar o sindicalista, o sem-terra, o sem-teto, o movimento negro, feminista”, conclui.

Outros tempos

“Fosse em outro momento, o Diário Oficial da União já estava publicado”, disse um fonte do Planalto consultada pelo Brasil de Fato, em referência ao dilema que o presidente Lula enfrenta, entre uma escolha segura ou a resposta a uma demanda social.

Luís Roberto Barroso, de 67 anos, foi nomeado ao STF em 2013, indicado pela então presidente Dilma Rousseff. | Asscom/STF

Outro aspecto que deve ser considerado pelo chefe do Executivo, ressalta Roberto Tardelli, é o forte protagonismo que o STF tem tido nos últimos anos. “Eu acho que o presidente está atento a uma situação nova que a gente vive, que é o protagonismo do Supremo na cena política institucional brasileira. Há 15, 20 anos, esse protagonismo era bem menos candente do que hoje”, disse Tardelli.

As mudanças no STF são atribuídas fundamentalmente à grande exposição que o tribunal passou a ter, sobretudo após o julgamento do chamado “esquema do mensalão”, e das transmissões ao vivo dos debates.

“É tudo mais público, é tudo mais assim exposto, virou quase um Big Brother, tem torcida, fã clube. Quando a TV Justiça não existia, eu me lembro muito bem desse tempo, nós mal sabíamos o nome dos ministros do Supremo”, afirma Tardelli.

“O fato é que ser ministro do Supremo hoje, no século 21, é diferente do que foi no século 20. Se você pegar um aplicativo qualquer em qualquer lugar do Brasil, seja em Brasília, seja em São Paulo, no Rio, Curitiba, Quixeramobim, onde for, qualquer motorista escala os ministros do Supremo e nenhum deles escala a seleção brasileira, por exemplo. Nós sabemos até como se compõe as turmas”, brinca o ex-procurador de Justiça.

A popularidade do STF pode interferir na indicação do presidente, de acordo com a repercussão que deve ter qualquer que seja o indicado ou indicada. Após a decisão de Lula, o escolhido precisará ser sabatinado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal e aprovado pelo plenário da casa. Não há registro de rejeição de um indicado pelo chefe do Executivo.

Sobre o tempo que o presidente deve levar para tomar essa decisão, há divergências entre as fontes consultadas. “Eu imagino que essa negociação seja lenta e gradual, um passo de cada vez, um nome a cada dia”, considera Tardelli.

“Acho que ele vai dar celeridade até para tentar diminuir um pouco essa pressão”, diverge o jurista Marco Aurélio de Carvalho.

Publicado originalmente pelo Brasil de Fato em 15/10/2025

Por Leonardo Fernandes – Brasília (DF)

Edição: Maria Teresa Cruz

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