A Advocacia-Geral da União (AGU) apresentou pedido ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), para suspender os efeitos da liminar que restringiu a legitimidade para apresentação de denúncias por crime de responsabilidade contra ministros da Corte. A manifestação, assinada pelo advogado-geral da União, Jorge Messias, foi enviada no âmbito das ADPFs 1.259 e 1.260, que tratam da Lei 1.079/1950, a Lei do Impeachment. O tema será analisado pelo plenário virtual do STF entre 12 e 19 de dezembro.
A liminar de Mendes concentrou na Procuradoria-Geral da República (PGR), chefiada por Paulo Gonet, a prerrogativa de apresentar pedidos de impeachment de ministros do STF e elevou o quórum mínimo para abertura de processo no Senado de maioria simples para dois terços. A decisão retirou a possibilidade de cidadãos, associações e parlamentares formularem denúncias, o que levou a AGU a contestar a medida.
AGU critica exclusividade da PGR e defende legitimidade popular
Para a AGU, a liminar suprimiu um dos mecanismos de controle previstos pelo ordenamento jurídico, ao afastar a participação direta de cidadãos e parlamentares. O órgão sustenta que a restrição viola o artigo 1º da Constituição, segundo o qual “todo poder emana do povo”. A manifestação afirma que o Senado já dispõe de filtros institucionais suficientes para barrar pedidos infundados e que a exclusividade da PGR cria concentração excessiva de poder.
A AGU argumenta que o STF não pode atuar como “legislador substitutivo” ao modificar, por decisão liminar, regras definidas pelo Congresso. O órgão também afirma que a liminar afeta a separação entre os Poderes.
Ao mesmo tempo, a AGU endossa dois pontos da decisão: a vedação ao chamado “crime de hermenêutica”, que impediria punições por divergências interpretativas, e o quórum de dois terços para abertura de processo, considerado um mecanismo adequado contra iniciativas com finalidade política. A AGU defende ainda a constitucionalidade do afastamento automático de ministros quando o Senado decide abrir um processo, mas considera inconstitucional a redução salarial prevista na lei após a denúncia, por violar a irredutibilidade de subsídios estabelecida no artigo 95 da Constituição.
Senado reage e vê invasão de prerrogativas
A liminar gerou reação imediata no Senado. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), criticou o alcance da decisão e afirmou que “não é aceitável” que uma regra aprovada pelo Congresso e sancionada pelo Executivo seja alterada por decisão monocrática.
Alcolumbre indicou que buscará acelerar propostas que limitam decisões individuais de ministros do STF e revisar a legislação sobre crimes de responsabilidade. O senador também defendeu que a Casa poderá avaliar mudanças constitucionais para tratar do tema.
Lideranças de diferentes partidos criticaram o que classificam como desequilíbrio entre os Poderes. Eduardo Braga (MDB-AM), Rogério Marinho (PL-RN), Omar Aziz (PSD-AM) e Tereza Cristina (PP-MS) afirmaram que o STF promoveu uma “blindagem” indevida ao restringir a legitimidade para denúncias e ao elevar exigências processuais.
Entre parlamentares da oposição, o tom foi mais duro. Jorge Seif (PL-SC) disse que a liminar é “flagrantemente inconstitucional”, e Bia Kicis (PL-DF) chamou a decisão de “aberração”. Flávio Bolsonaro (PL-RJ) declarou que houve “lawfare institucional” contra o Legislativo.
Base do governo busca alinhamento com a AGU
O líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), afirmou que a Constituição reconhece o direito de qualquer cidadão de apresentar pedido de impeachment contra o presidente da República e que não haveria justificativa para excluir ministros do STF desse mecanismo. A posição aproxima a base governista da argumentação da AGU, ao insistir que a participação popular não deve ser restringida.
Impactos e projeções internas no STF
Nos bastidores do Supremo, relatos indicam que a liminar seria uma forma de antecipar tensões previstas para 2027, quando um Senado mais alinhado a grupos conservadores poderia ampliar a pressão por abertura de processos contra ministros. Avaliações internas apontam que deve haver maioria no plenário para preservar parte da decisão, como a vedação ao uso do impeachment como instrumento de intimidação e a exigência de quórum qualificado. O ponto relativo à retirada da legitimidade popular, porém, é considerado mais controverso.
A decisão final dependerá do julgamento no plenário virtual, momento em que poderá ocorrer modulação dos efeitos. O tribunal poderá definir se as regras valem apenas para novos pedidos ou se alcançam os já protocolados no Senado.
Conflitos institucionais em escalada
A disputa ocorre em meio a outras frentes de tensão entre Congresso e STF, como o debate sobre decisões monocráticas, divergências em torno do marco temporal de terras indígenas e reações a investigações conduzidas pela Polícia Federal que atingem figuras do Legislativo, inclusive no caso Banco Master.
A manifestação da AGU tenta equilibrar posições: defender mecanismos que evitem o uso abusivo do impeachment contra ministros, mas rejeitar a retirada total da legitimidade popular e parlamentar para apresentação de denúncias. A postura busca afastar interpretações de que o Executivo apoia a blindagem integral dos ministros do STF.


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