Pega-pega continua

Nenhuma manchete para Lupi, e olha que era um bom dia para isso. Tirando a capa do Globo, que traz uma denúncia bombástica (embora talvez um tanto sensacionalista, baseada apenas na palavra de um traficante), os outros jornalões trouxeram manchetes enfadonhas sobre a crise na Europa, quando tinham material novo sobre “mal feitos” de Ongs conveniadas ao Ministério do Trabalho.

O pega-pega prossegue, contudo: os escândalos do Trabalho ocupam as seções mais importantes dos cadernos de política. No Globo, são duas páginas inteira, 3 e 4. A matéria do Globo, no entanto, traz um título enganoso para quem não ler a reportagem.

A matéria informa que a Brasol, uma OSCIP (organização da sociedade civil de interesse público), que está sendo investigada por várias instituições (Ministério Público, prefeituras, Polícia Federal) tem na verdade mais contratos com o governo de Minas Gerais, do PSDB, do que com o Ministério do Trabalho. Cria-se uma certa confusão junto ao leitor, portanto. Se o governo do PSDB e várias prefeituras assinaram tantos contratos com a Brasol, então o título “Só Ministério do Trabalho não viu” está equivocado.

De qualquer forma, temos aí mais um caso de uma entidade fortemente investigada pelas autoridades, incluindo a PF, o que esvazia o discurso udenista sobre leniência do governo para com o “mal feito”. Neste caso, ao menos, há combate à corrupção.

Na Folha, nenhum editorial atacando o Trabalho, o que, dentro do roteiro desse tipo de crise, já é uma pequena vitória. Mas igualmente temos o espaço mais importante do caderno de política dedicado a um escândalo do Ministério. Lupi aprovou dois convênios com a ONG Adrvale em fevereiro de 2010, nove meses depois da Polícia Federal ter iniciado uma investigação sobre a empresa. A própria reportagem, contudo, informa que a investigação da PF “tramita em segredo de Justiça”. Ou seja, o ministro realmente não podia saber. A matéria não deixa isso claro.

No Estadão, temos um editorial ranzinza contra Lupi, mas tão previsível que me pareceu até carinhoso. Não é desta vez, portanto, que a mídia derruba um ministro. Quer dizer, os ataques devem continuar, e o ministro se mostra disposto pra luta. A iniciativa de publicar, num blog do ministério, as perguntas e respostas dos jornalistas causou profunda irritação na imprensa. A Associação Nacional de Jornais (ANJ) até soltou um muxoxo oficial. É uma coisa desconcertante isso, porque de fato prejudica o interesse comercial das empresas jornalísticas, que precisam do ineditismo, mas ao mesmo tempo confere mais transparência às respostas de um ente público à sociedade, e coibe a prática nociva (e infelizmente comum) da imprensa de quase nunca proporcionar um espaço adequado à defesa. E, finalmente, reforça a importância, para o Estado, de criar um relacionamento direto com o cidadão.

PS: Tem outra denúncia contra o Ministério do Trabalho no Correio Braziliense. O resto da mídia provavelmente vai seguir a pista. Mas por enquanto não se descobriu nada de irregular.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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