O que aconteceu com Dilma? Por que esse apagão político no governo?

Essa entrevista de José Gabrielli, ex-presidente da Petrobrás, para o Estadão, admite algumas interpretações diferentes, conforme se confira destaque a um ou outro aspecto. Paulo Henrique Amorim, no Conversa Afiada, onde eu a vi primeiro, destaca a afirmação dele de que não existe divergência entre ele e Graça Foster.

A manchete no Conversa Afiada:

GRAÇA CONCORDA COMIGO: O objetivo da oposição é desconstruir a Petrobras, o Governo e partilhar a partilha.

É uma declaração política e diplomática de Gabrielli, que é um político na acepção mais nobre da palavra.

Nassif destaca, no título que deu a seu post sobre a mesma entrevista de Gabrielli,  um outro ângulo:

Gabrielli entende que relatório foi omisso, mas responsabilidades permanecem

De fato, Gabrielli diz que o relatório foi omisso, mas acentua que isso não tem relevância, porque a compra seria aprovada pelo conselho mesmo que as duas cláusulas (Marlim e Put Option) estivessem explicitadas no resumo.

(PS: Nassif mudou o título para “Para Gabrielli, omissões sobre Pasadena não eram relevantes para a análise da compra”, provavelmente após ler este blog sujo).

Eu destaco dois trechos da entrevista de Gabrielli:

1) Logo no começo, ele dá uma chamada na própria presidente da república. Dilma é a presidente, e Gabrielli é seu fiel apoiador, mas por isso mesmo, por entender que tem o dever de salvar Dilma inclusive de si mesma, ele afirma que “Dilma não pode fugir da responsabilidade dela, que era presidente do conselho”.

Concordo plenamente e já repeti isso várias vezes. Como não sou político, ou obrigação de ser diplomático, sinto-me livre para repetir mais uma vez o que eu venho dizendo aqui: Dilma deu um tremendo tiro no pé quando tentou fugir pela tangente. E foi boba. Pasadena está dando lucro, então Dilma poderia ter jantado tranquilamente a oposição e protagonizar um enfrentamento de alto nível com a mídia. Preferiu cortar cabeças, enfraquecendo seu próprio time, como fazia no início de seu governo. E mostrou arrependimento por uma decisão absolutamente correta, que foi a compra da refinaria de Pasadena. E ficou por isso mesmo. Dilma não trouxe dados novos, não discutiu estratégias. Aquela executiva tão inteligente, agressiva e afiada, características que tanto impressionaram Lula e fizeram com que ele a escolhesse como sua sucessora, tornou-se de repente uma pessoa insegura, desinformada, lacônica e… arrependida.

O que aconteceu com Dilma? Seguramente, a falta de uma base de comunicação mais inteligente e a centralização excessiva devem estar entre as causas que estão provocando esse estarrecedor “apagão político” do governo federal e da presidente da república. Parece que o governo está acéfalo! Não se comunica, não reage, não participa do debate político! E quando o faz, é de maneira estarrecedoramente tosca, quase grosseira, como falar que há gente querendo “destruir a Petrobrás”. Ora, vamos discutir com dados, fatos e estratégias!

2) Gabrielli explica que a compra foi um bom negócio em 2006, deixou de ser entre 2008 e 2011 e voltou a ser desde então. Agora sabemos que a refinaria deu lucro de quase US$ 60 milhões no primeiro bimestre, informação esta da própria Graça Foster que, todavia, a Petrobrás, por uma desses mistérios de fátima, não explora em seu maldito blog!

Ora, agora a questão mudou de figura. Se Pasadena voltou a ser um bom negócio, e está dando lucro, a Petrobrás tem obrigação moral, política e comercial de desenvolver (e divulgar!) estratégias inteligentes para uma refinaria tão bem situada. O objetivo não pode ser apenas o lucro fácil, porque senão era melhor a Petrobrás apenas investir na bolsa de valores ou abrir uma rede de lanchonetes nos Estados Unidos. A objetivo da estatal deve ser aumentar o grau de segurança energética do Brasil e ampliar os conhecimentos tecnológicos e comerciais da Petrobrás no setor de refinaria. Se Graça Foster não vê assim, então ela não merece ser presidente da empresa.

*

Trechos de entrevista de Sérgio Gabrielli a Ricardo Galhardo, do Estadão, em Salvador:

O senhor se considera responsável pelo relatório entregue ao conselho administrativo da Petrobrás antes da compra da refinaria de Pasadena?
Eu sou responsável. Eu era o presidente da empresa. Não posso fugir da minha responsabilidade, do mesmo jeito que a presidente Dilma não pode fugir da responsabilidade dela, que era presidente do conselho. Nós somos responsáveis pelas nossas decisões. Mas é legítimo que ela tenha dúvidas.

O relatório é falho e omisso como disse a presidente Dilma?
Acho que não (foi falho). Ele foi omisso. Sem dúvida nenhuma foi omisso porque as duas cláusulas mencionadas (Put Option, que obrigou a Petrobrás a comprar a outra metade da refinaria, e Marlim, que compensaria a então sócia Astra por possíveis prejuízos) não constavam da apresentação feita aos conselheiros.

O conselho teve acesso à totalidade dos documentos antes de aprovar a compra da refinaria?
Não teve acesso a essas cláusulas. Mas isso não é relevante, a meu ver, para a decisão do conselho. O que é relevante é se o projeto é aderente tecnologicamente e estrategicamente ao que você faz e ter dado rentabilidade com os pressupostos daquele momento. Essas três condições fariam a decisão do negócio.

Se o Conselho de Administração da estatal soubesse dessas cláusulas no primeiro momento teria aprovado a compra da refinaria?
Eu acho que teria aprovado porque o objetivo naquele primeiro momento era a possibilidade de ter um negócio nos Estados Unidos em uma refinaria que tinha preços adequados ao mercado. E poderia ser uma entrada forte nossa nos Estados Unidos, o mercado que mais crescia no mundo na época. Continuo achando que foi um bom negócio para a conjuntura de 2006, um mau negócio para a conjuntura de 2008 a 2011 e voltou a ser bom em 2013 e 2014.

O que mudou na Petrobrás de Lula para Dilma?
Não acho que houve mudança. É bom lembrar que saí em fevereiro de 2012 e o acordo de Pasadena é de junho de 2012. Enquanto estive lá, a partir de 2008, só fiz disputar judicialmente com a Astra. Não fiz nenhum acordo com a Astra.

Então a mudança foi de Gabrielli para Graça Foster?
Eu não disse isso. A gestão da presidente Graça deu continuidade aos planos estratégicos desenvolvidos pela diretoria anterior. Não vejo ruptura entre mim e Graça. É uma presidência de continuidade.

Pelo menos em um ponto importante vocês divergem. Graça diz que a compra de Pasadena foi um negócio ruim e o senhor diz que foi bom.
Nós não divergimos. Graça disse de forma explícita que hoje ela não faria o negócio mas que na época foi um bom negócio. Portanto nós não temos divergência. Na época eu faria a mesma coisa. O negócio depois ficou ruim e hoje está melhor outra vez.

Existe uma tentativa de responsabilizar a sua gestão por um negócio que não deu o resultado esperado?
Cheguei na Petrobrás e a empresa valia US$ 15 bilhões. Comigo a Petrobrás foi a US$ 350 bilhões e quando eu saí ela estava valendo US$ 180 bilhões. Essa é a realidade no mercado. A empresa vinha num processo de esvaziamento, de quebra da unidade operacional, sendo fatiada. Havia várias iniciativas para vender as refinarias em pedaços. Saímos da situação de uma empresa acuada na área de gás e energia para nos transformarmos no principal ator produzindo hoje um volume superior talvez à energia de Itaipu. Isso não se fez nos últimos dois anos.

(…)

Qual sua opinião sobre a declaração da presidente Dilma de que estariam tentando atingir a Petrobrás?
A oposição faz uma campanha irresponsável contra a Petrobrás. A Petrobrás é um patrimônio nacional extremamente bem gerido, com uma competência instalada extraordinária. O ataque só pode ser entendido por interesses eleitoreiros combinados com alguns interesses muito mais complicados.

Quais?
Interesses na área financeira de redução dos valores da Petrobrás para poder viabilizar operações no mercado de ações e ameaçar o papel histórico da empresa de desenvolver o pré-sal brasileiro. Quando nós mudamos o marco regulatório do pré-sal em 2010 com a introdução da partilha de produção que altera as formas de apropriar o futuro e com isso vai viabilizar mais recursos para a educação brasileira, isso teve uma oposição muito grande. É quem hoje está atacando a Petrobrás. Quem hoje ataca a Petrobrás também ataca o modelo da partilha e o conceito de que a companhia deve ser a operadora do pré-sal.

(…)

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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