Novo blogueiro na praça! Wanderley Guilherme dos Santos


 

Amigos e amigas, volto a atualizar o blog apenas no final de semana. Tenho que entregar umas 20 páginas para uma editora e terei, portanto, de pedir um pouco de paciência a vocês.

Se houver um golpe até lá, eu volto às trincheiras, é claro.

Mas deixo hoje uma dica e um comentário.

A dica é o novo blog de Wanderley Guilherme dos Santos, incorporado dentro da agência Insight, que edita a revista Inteligência, da qual Wanderley foi editor por muitos anos.

http://insightnet.com.br/segundaopiniao/

O primeiro post do blog tem um título bem sugestivo: “Calote ideológico”,

É uma pancada elegante e merecida num governo que vem metendo os pés pelas mãos. Não agrada nem à direita, nem à esquerda, e perdeu sua identidade.

Uso o texto de Wanderley como gancho para o meu comentário de hoje.

Uma das primeiras notícias com que me deparei nesta quase fria manhã de quarta-feira foi essa:

APÓS FALA DE LULA, PMDB RETIRA APOIO AO AJUSTE

O anúncio foi feito por Leonardo Picciani, líder do PMDB na Câmara.

Quem é do Rio conhece a figura: Leonardo Picciani, filho do Jorge Picciani, que no ano passado foi o líder do movimento, aqui no estado, de apoio à Aécio Neves.

Leonardo deu um xeque político no governo. Não xeque-mate, mas um xeque inteligente, difícil de ser contornado.

Afinal, o governo, desde o início da nova gestão, perdeu qualquer controle sobre a imagem política de si mesmo. Dilma tentou empurrar o “ajuste fiscal” goela abaixo da comunidade política (parlamentar e social) sem qualquer preocupação com a gestão das expectativas. Não negociou nem mesmo com o seu próprio partido.

Desde a vitória eleitoral, o governo renunciou à qualquer emissão de símbolos de mudança, ou agenda progressista, que permitisse a construção política de uma base social mínima de apoio à sua gestão.

A sua base social se reuniu, às pressas, atabalhoadamente, aos toques do terror político imposto pela oposição, uma oposição que foi às ruas brandindo bandeiras de um filme B: intervenção militar, impeachment, redução da maioridade penal, lei de terceirização.

A derrota na aprovação da PL 4330 (que aumenta a terceirização), na Câmara Federal, foi uma vitória de cabeça para baixo do campo progressista, porque serviu para unir a base social de Dilma, PT, esquerda em geral.

Mas Dilma demorou tanto a se posicionar (a falta de timing do governo é impressionante) sobre o tema, que não valeu de muita coisa.

Até o presidente do Senado, Renan Calheiros, aproveitou o estranho silêncio presidencial para se posicionar à esquerda da Câmara, alertando para os perigos de um projeto que desorganizasse o mercado de trabalho; depois de protestar contra a omissão de Dilma no debate, engavetou a PL 4330.

Daí Lula aparece na propaganda de ontem (05/mai) tentando faturar em cima desse processo de união política das esquerdas.

Ótimo.

Só que a direita aprendeu a jogar também.

E o PMDB reagiu, como já informado, retirando o apoio às medidas de ajuste fiscal do governo, logo agora que o PT havia se convencido, a muito custo, a também apoiá-las.

Ou seja, o PT ficou sozinho com a brocha na mão, apoiando um ajuste fiscal conservador, enquanto o PMDB – claro que de maneira hipócrita, mas hipocrisia, em política, às vezes é uma virtude – vai posar de defensor dos direitos trabalhistas, que estariam sendo “flexibilizados” com algumas mudanças presentes na Medida Provisória 665.

Mais uma vez, o governo peca pela falta de política e comunicação. Mudanças no seguro desemprego, se visam conter distorções, não poderiam ser vendidas, naturalmente, como “ajuste fiscal”.

A população, em especial a base eleitoral da própria Dilma, permanece atônita, porque a presidente não conversa. No máximo, ela faz discursos mornos, do alto de um púlpito, carregados de tanta linguagem protocolar, de tanto “quero agradecer a presença de fulano e beltrano”, que não tem qualquer efeito político.

Não há um programa, sequer nas “redes sociais”, em que a presidenta, seus ministros, junto a especialistas, intelectuais, discutam abertamente os problemas econômicos e políticos e as respostas necessárias para resolvê-los.

A presidenta desprezou o capital simbólico que lhe foi outorgado pela vitória eleitoral, e parece ter renunciado à luta política. Em entrevista aos blogueiros, fugiu do tema sobre a democratização da mídia como se tivesse com medo de falar. Ora, não é Dilma que vinha repetindo bordões sobre preferir o barulho da democracia ao silêncio da ditadura?

Pois então, é preciso estudar o tema da comunicação e falar, problematizar, comparar com outros países, trazer números sobre a concentração dos recursos publicitários públicos e privados em mãos de poucas famílias. É evidente que o problema da comunicação se reflete, de maneira urgente, na política. O debate sobre democracia na mídia não pode ser enterrado vivo; seus gritos desesperados continuam sendo ouvidos aqui em cima. Trata-se de uma questão política que, evidentemente, não se resolve apenas através de nova lei no congresso: o próprio falar sobre o tema, a disposição presidencial para estudá-lo e abordá-lo numa entrevista, já constituiria uma vitória política importante, e desviaria os ódios da mídia e setores reacionários do parlamento para este tema, abrindo espaços para o governo atuar em outras frentes.

Mesmo se pensássemos na questão apenas do ponto-de-vista legislativo, há derrotas do governo na câmara que seriam facilmente convertidas em vitórias políticas na sociedade.

Se o governo não demonstrar um mínimo de disposição, e mesmo prazer, em jogar o jogo político, então tudo está perdido. Agindo como vem agindo, sempre no susto, tentando num dia apagar os incêndios que ele mesmo cria na véspera, não caminharemos para superar uma crise política que é de interesse da imprensa e da oposição manter acesa durante o maior tempo possível.

O governo precisa polarizar, nem que seja usando ironia. Precisa firmar identidade política, até porque, independente de sua vontade, ele já tem essa identidade – só que ele não a usa, por covardia e inapetência. O próprio debate ideológico propriamente dito precisa ser levado adiante, visando esclarecer a população o que seja uma identidade à esquerda, de cunho democrático. Nem isso é feito, deixando que viceje o discurso do ódio, que atribui – surrealisticamente – ao governo Dilma pendores para se tornar uma ditadura comunista. Alguém tem de explicar: a presidente tem formação de esquerda, num governo de coalizão; grandes governos democráticos de coalizão, muito bem sucedidos, também foram liderados pela esquerda.

Enfim, o governo precisa descer do pau de arara político em que a mídia o aprisionou, fazendo sofrer todo o seu campo. Precisa arrombar as portas dessa masmorra semiótica, dentro da qual é torturado pelo batuque de panelas histéricas, gritos por impeachment e xingamentos irracionais; e ganhar o mundo, falar aos seus, contar seus dilemas, mobilizar seu eleitorado, animar seus apoiadores.

A base social de Dilma necessita, desesperadamente, de algum tipo de vitória política. Até o momento, o máximo que consegue é comemorar derrotas menos traumáticas, como o fato do 12 de abril ser menor que o 15 de março, ou panelaço de 05 de maio ser menor que o anterior.

Até hoje recebo emails de Obama, em vésperas de votações no Congresso americano, pedindo mobilização para essa ou aquela causa. Dilma não usa email, não usa whatsapp, não usa blog ou twitter, renunciou à TV, ao rádio, aos jornais. O facebook é usado apenas para fazer propaganda do governo, não para fazer o debate. Ou seja, o governo não fala e não ouve.

Como espera ganhar qualquer votação no Congresso? Como espera seguir adiante? Como espera deter os ataques golpistas que, diante do silêncio do governo, avançam em todas as frentes?

(Crédito da foto na capa).

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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