Réquiem para um mandato ditatorial

Por Lia Bianchini, repórter especial do Cafezinho

“Eu, formalmente, estou rompido com o governo. Politicamente estou rompido”. Essa frase, dita no dia 17 de julho, selava o início do declínio político de Eduardo Cunha como presidente da Câmara dos Deputados.

O rompimento com o governo aconteceu, de modo propício, um dia após o peemedebista ter seu nome envolvido na Operação Lava Jato. No dia 16 de julho, o ex-consultor da Toyo Setal Júlio Camargo disse, em depoimento à Justiça Federal do Paraná, que Cunha havia lhe pedido propina de US$ 5 milhões para que um contrato de navios-sonda fosse viabilizado.

Apesar de Cunha encarnar a figura de um ditador cercado por subordinados prontos a seguir suas ordens, a decisão de romper com o governo não teve apoio do PMDB e de boa parte de seus aliados. O deputado começava a entrar, assim, em uma zona de isolamento político.

Poucos dias depois, outro acontecimento vem a público, encurralando ainda mais o presidente da Câmara: Beatriz Catta Pretta, advogada de Júlio Camargo e de outros envolvidos na Lava Jato, concede uma entrevista exclusiva ao Jornal Nacional, dizendo que deixou os casos que defendia na Operação por sentir-se ameaçada e intimidada por integrantes da CPI da Petrobrás. A advogada informou também que fechou seu escritório e decidiu abandonar a carreira, devido a ameaças.

Assim, em pouco mais de duas semanas, o ditador Eduardo Cunha viu seu suposto poder começar a ruir. Se, antes, o peemedebista vangloriava-se de possuir inúmeros aliados, agora ele mais parece uma criança mal educada que foi colocada de castigo, em um cantinho isolado. Até mesmo a mídia hegemônica que, até então, vinha blindando Cunha, deixou de poupá-lo das notícias incriminatórias.

Eduardo Cunha, ao assumir a presidência da Câmara vencendo um candidato do governo ao posto, teve a certeza de que detinha todo o Poder Legislativo em suas mãos e imaginou estar acima de quaisquer articulações políticas. Foi útil ao setor que representa: a direita conservadora. Autorizou as CPIs da Petrobrás, do BNDES e dos Fundos de Pensão. Ajudou a desgastar a imagem do governo.

Porém, como bem disse Luis Nassif, em artigo que explica as articulações políticas escondidas nas declarações de Catta Preta e no isolamento político de Cunha: nem o mais irresponsável oposicionista gostaria de correr o risco de ter Cunha como seu representante máximo.

Se, por um lado, Cunha foi fundamental para a oposição golpista que clama pelo impeachment, por outro, a ideia de que o deputado está na linha de sucessão à presidência não anima nem um pouco a esse mesmo conglomerado de pessoas.

O momento político brasileiro é complexo e delicado. Enquanto o mandato de Cunha como presidente da Câmara parece caminhar para o enterro, é preciso ter olhos atentos a todos os atores envolvidos nessa trama. Na política, assim como em um jogo de xadrez, nem mesmo um peão é derrubado sem estratégia.

Lia Bianchini:
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