As mentiras da Época sobre a influência de Lula no BNDES

(Na foto, Obama e Raul Castro. Os EUA, espertos, querem fazer negócios com Cuba. O Brasil também. A Globo, no entanto, braço do interesse norte-americano, quer prejudicar o Brasil)

Há duas semanas, a Época divulgou, com grande estardalhaço, um novo furo jornalístico, baseado em “bilhetes secretos” de funcionários do Itamaraty sobre a visita do ex-presidente Lula à Cuba, ao final de maio de 2011. A revista certamente pensou que venderia a informação como um novo vazamento do Wikileaks.

Os bilhetes diplomáticos, no entanto, tinham segredos tais como “Lula disse que Dilma é amiga de Cuba”.

A reportagem prova que a Época tornou-se uma espécie de pasquim editado pela ala infanto-juventil do Tea Party.

Depois que a Casa Branca decidiu levantar o embargo comercial e político à Cuba, reabrindo até mesmo a sua embaixada em Havana, o Porto de Mariel ganhou, obviamente, um valor estratégico muito maior, porque Cuba, a Odebrecht e, por extensão, o Brasil, que financiou a obra, terão um porto moderno posicionado a 200 km dos Estados Unidos.

O Cafezinho conversou longamente com executivos do BNDES. As acusações da Época são infames. Em primeiro lugar, tenta-se surfar numa confusão besta sobre os financiamentos do BNDES à exportação de serviços. O BNDES apenas financia serviços produzidos no Brasil. O Porto de Mariel contrata, por exemplo, um monte de serviços cubanos, brasileiros e estrangeiros. Há empresas chinesas operando em Mariel. O BNDES só financia, porém, os serviços provenientes do Brasil, com contratação de mão-de-obra brasileira.

A inadimplência do BNDES para esse tipo de operação é próxima de zero. Ou seja, mesmo que não fosse geopoliticamente estratégico, seria simplesmente um bom negócio. E não retira recursos dos financiamentos destinados à infra-estrutura brasileira.

Os financiamentos do BNDES para o porto de Mariel somaram, ao longo dos anos de 2008 a 2013, US$ 682 milhões, que serão devidamente pagos, dando lucros ao banco, gerando impostos e empregos no Brasil. Quanto esse montante corresponde aos financiamentos totais do BNDES durante os anos de 2008 a 2013? 0,01%?

Os executivos do BNDES contatados pelo Cafezinho explicaram porque a Época manipula acintosamente a informação.

Os financiamentos do BNDES à obra do porto de Mariel, conforme admite a reportagem, foram concedidos em cinco parcelas, chamadas tecnicamente de “tranches” (pedaços, em inglês).

Lula visitou Cuba em 31 de maio de 2011. Nesta data, os três primeiros “tranches” já tinham sido aprovados pelo BNDES.

Segue uma tabelinha dos tranches:

Tranche 1 – US$ 43,4 milhões – aprovado em 09/12/2008
Tranche 2 – US$ 108,7 milhões – aprovado em 14/09/2010
Tranche 3 – US$ 150 milhões – aprovado em 03/05/2011

[Viagem de Lula à Cuba, em 31/05/2011]

Tranche 4 – US$ 150 milhões – aprovado em 05/07/2012
Tranche 5 – US$ 229,9 milhões – aprovado em 31/05/2013

Ou seja, os financiamentos já estavam encaminhados. Já existia um fluxo. Lula não tinha que fazer lobby nenhum.

Essas aprovações pelo BNDES não se dão num botequim, entre goles de cachaça, na presença de políticos. Não é a tôa que o BNDES é o banco brasileiro, quiçá do mundo, com menor índice de inadimplência. Os financiamentos são aprovados através de um sistema rigoroso, envolvendo órgãos do banco independentes entre si, tocados por servidores concursados.

Para “acelerar” clandestinamente um processo de liberação de financiamento, uma empresa ou lobista teria que subornar mais de 50 pessoas dentro do banco.

As acusações da Época são, portanto, levianas e má-intencionadas. Os financiamentos para a Odebrecht no Porto de Mariel são um bom negócio em todos os sentidos: bancário, comercial, político, geopolítico, econômico e social.

A matéria é repleta de armadilhas retóricas para enganar os leitores. Num determinado trecho, a revista fala que “Lula é investigado pelos procuradores pela suspeita de ter praticado o crime de tráfico de influência internacional (Artigos 332 e 337 do Código Penal)”.

Eles mentem na maior cara de pau. O artigo 332 do Código Penal fala em “tráfico de influência” exercido por “funcionário público no exercício de sua função”.

Lula, quando viajou a Cuba, não era funcionário público, tampouco funcionário no exercício de sua função. E o Código Penal fala apenas em tráfico de influência, e não em tráfico de influência internacional.

O artigo 337 do Código Penal, por sua vez, refere-se à subtrair ou inutilizar documentos públicos… O que tem isso a ver com a viagem de Lula à Cuba?

Eles escrevem qualquer coisa, porque sabem quem 99% dos leitores não vão conferir.

A matéria ainda enfia, do nada, a história do navio que foi apreendido no Panamá, levando sucatas velhas cubanas, do tempo da União Soviética, que seriam consertadas na Coréia do Norte.

Trecho da matéria: “Meses depois da visita de Pimentel, um navio atracou ilegalmente no Porto de Mariel, ainda em obras. Embarcaram-se ali, sob os olhos dos funcionários da Odebrecht, armas como tanques e caças, destinados à Coreia do Norte, escondidos sob uma carga de açúcar. O navio foi descoberto no Panamá. O Conselho de Segurança da ONU classificou o ato como um dos piores atentados à lei internacional dos últimos anos.

Que exagero estúpido!

Analistas consultados pela BBC disseram que, com base nas fotos divulgadas, as peças eram partes de um radar desenvolvido pelos soviéticos nos anos 50.

E falar que as peças foram embarcadas “sob os olhos dos funcionários da Odebrecht” é simplesmente má ficção!

A Época – que pertence à Globo, sempre é bom lembrar – exercita a sua covardia típica, ao pintar a pacífica e inofensiva Cuba, que não tem capacidade militar para ferir ninguém, e nunca atacou outro país, como um país perigoso, apenas para jogar lenha numa guerra fria obsoleta.

Na verdade, a Globo, como de praxe, se posiciona contra o Brasil, contra o governo brasileiro e contra as empresas brasileiras, e a favor das empresas norte-americanas, loucas para fazer negócios com Cuba, ilha posicionada estrategicamente às portas do principal mercado do mundo.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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