Golpe volta a subir no telhado



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Análise Diária de Conjuntura – 17/12/2015

As últimas horas tem sido tão frenéticas que o analista fica desorientado com frequência.

Sinais contrários confundem a cabeça dos mais astutos consultores, quanto mais de um blogueiro sujo imerso há anos nas lutas políticas.

Mensalão, trensalão, petrolão, eleições, golpes, conspirações judiciais, Lava Jato, impeachment, grandes manifestações à direita e à esquerda, a democracia brasileira experimenta crises políticas consecutivas, intermináveis, que nada mais são do que as dores do parto de sua própria história.

Nunca foi tão difícil, desafiador e polêmico ser um blogueiro político, enfrentando os ventos ásperos, que no momento tem a força de tornados, do reacionarismo, do fascismo, do autoritarismo, das forças, enfim, do capital, que tentam constamente debilitar as forças do trabalho, da democarcia, da justiça social.

Para se afirmar, o espírito democrático precisa demonstrar coragem e firmeza.

É neste momento de profunda crise política, desencanto, frustrações, emergência de novos fanatismos conservadores, que muitas vezes flertam com a intolerência fascista, que devemos enxergar as manifestações desta quarta-feira.

Não foram manifestações monstruosas.

Mas foram grandes, múltiplas, dignas, coloridas.

Foram tão ou mais pacíficas do que as manifestações coxinhas, nas quais são comuns os casos de agressões gratuitas a pessoas que passam usando cores vermelhas, muitas vezes sem que estas sequer estejam usando o vermelho por algum razão partidária.

Em São Paulo, o ato reuniu 55 mil pessoas, segundo o Datafolha. O mesmo instituto estimou a manifestação coxinha do domingo passado (13/dez) em 40 mil pessoas.

Então a coisa ficou assim: 55 mil X 40 mil, a favor do campo progressista.

E isso no momento mais difícil para o campo progressista, por causa da crise econômica, do declínio da aprovação do governo, das violências políticas da oposição.

Imagine se houver um golpe, e a esquerda se ver livre dos constrangimentos inevitáveis de ser governo?

A precariedade histórica do Estado brasileiro, o atraso mental de nossas elites e classes médias, a baixa instrução política do povo, a existência de um monopólio midiático sem paralelos no mundo democrático, tornam o Brasil um país extremamente complexo para governar. Para qualquer partido!

Não sou fã de Dilma como estadista. Mas acho que é honesta e, como tal, possivelmente é a pessoa certa na hora certa. Porque Dilma, sobretudo, não é uma pessoa autoritária, que proíbe ou desincentiva manifestações, ou que trabalha para conter investigações.

Por trás das conspirações judiciais, mas também por trás da implementação, pela primeira vez em nossa história, de um combate sistemático, mesmo que num primeiro momento seja partidarizado e tiranizado pela mídia, à corrupção política, por trás disso tudo há o silêncio doce, feminino, um pouco triste, de Dilma Rousseff.

***

Entretanto, a diferença entre os atos de domingo e os atos da última quarta-feira não é apenas a magnitude.

A diversidade etária, étnica, social, das manifestações antigolpe foi infinitamente maior.

O ato de domingo não tinha negros, só isso já é de arrepiar os cabelos de qualquer democrata, porque o Brasil é um país com maioria de negros.

Como é que uma manifestação supostamente democrática não tem negros?

O ato dos coxinhas não tinha negros e não tinha periferia.

O ato da paulista tinha periferia.

O ato da Cinelândia tinha periferia.

Os atos progressistas foram, desta vez, muito melhor distribuídos do que os atos coxinhas.

No Rio, aconteceu uma coisa engraçada e muito sintomática. No meio do ato dos coxinhas golpistas, surge um bando de skatistas cantando, empunhando seus skates, efusivos.

Os coxinhas – um bando de velhos branquelos e reaças, diga-se a verdade –  ficaram apavorados. Chamaram a polícia. Incentivaram os policiais a partirem para cima dos rapazes, que estavam ali apenas realizando o seu encontro anual. Como de praxe, os policiais partiram pra cima dos jovens, apesar destes tentarem explicar que não eram contra manifestação nenhuma. Nem sabiam do que se tratava. Enquanto isso, velhinhos hidrófobos os acusavam de pertencer ao PCdoB, ao PSOL, ao PT – eles nem sabem a diferença entre os partidos, para eles é tudo “comunista”.

Não por um acaso, a maioria dos jovens skatistas eram negros e da periferia.

No Rio, recentemente, um punhado de policiais metralhou jovens negros da periferia, que dirigiam um carro e comemoravam o novo emprego de um deles.  Ninguém bateu panela. Não houve revolta na classe média.

Os paneleiros não estão preocupados com a violência policial, e sim em expulsar o PT do poder.

Quando lhe perguntamos, calmamente, quem eles pensam em botar no lugar e com que métodos pretendem expulsar um partido eleito democraticamente, eles respondem histericamente, nos chamando de petralhas, comunistas, bolivarianos, com um ódio que lhes fazem parecer personagens dos anos 30 ou 40.

O Brasil tem eleições, e os resultados devem ser respeitados. Se a esquerda já pediu o impeachment no passado, errou. Não podemos jamais entregar o poder popular ao judiciário, porque estaríamos entregando a nossa liberdade a uma nova espécie de ditadura, e das piores, a ditadura dos juízes.

O golpe voltou a subir no telhado.

Um impeachment, para se materializar, precisa de consenso nacional.

As ruas demonstraram que este consenso não existe.[/s2If]

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Não houve ninguém para defender Collor.

As manifestação contra o impeachment de Dilma reuniu centenas de milhares de pessoas.

Não é lógico derrubar uma presidenta que tem apoio de todas as faculdades de direito, da maioria dos juristas, da maioria dos estudantes, professores, artistas, de quase todos os sindicatos e movimentos sociais.

Simplesmente não tem sentido político jogar no lixo um governo e um partido que fazem a ponte entre o grande capital e os movimentos sociais. Não respeitar essa ponte, esse diálogo, é apostar no caos, na guerra civil, na violência política.

O governo não é uma maravilha, o país está em crise econômica, mas, pelo amor de Deus, rasgar a democracia não vai ajudar nada.

Não vai ajudar substituir Dilma por algum derrotado nas urnas, sobretudo por um fracassado golpista e mau caráter como Aécio Neves, ou qualquer outro tucano.

O PSDB torrou centenas de bilhões de dólares na bacia das almas do mercado financeiro internacional e não construiu uma ponte, uma hidrelétrica, uma linha de transmissão, uma refinaria, uma universidade. Em São Paulo, qualquer cacique do PMDB ou do PP, que até hoje tem a pecha de corruptos, fez muito mais que qualquer tucano.

No mais básico dos básicos eles investiram: na infra-estrutura da água.

Tucanos não fazem obras, não investem em infra-estrutura. Patrocinam seus esquemas eleitorais vendendo patrimônio público e ganhando comissão em cima da sonegação fiscal.

Vide o caso Banestado, onde nasceu Alberto Yousseff, Sergio Moro, a delação premiada e quase todas as conspirações judiciais.

Deram delação premiada a Yousseff e o transformaram de um doleiro médio local no maior doleiro da América Latina, patrocinando esquemas com todos os partidos.

As acusações de “bolivarianismo” são invertidas. Os tucanos são os mais “bolivarianos” de todos. Suas lideranças tratam a liberdade de imprensa como uma piada de mau gosto, na medida em que praticam uma violentíssima política de interferência nas empresas de mídia, ligando para editores para pedir a cabeça de jornalistas, repórteres, fotógrados ou colunistas que considerem críticos demais.

E jamais houve iniciativa parlamentar mais “bolivariana” e mais submissa ao Executivo do que a votação da emenda da reeleição. Aquilo sim era um mensalão, com prova, testemunhas, provas, ato de ofício, além do absurdo político em si, que é um governo aprovar uma lei estendendo seu próprio mandato, sem a delicadeza democrática, como fizeram os verdadeiros bolivarianos, de fazer um plebiscito popular.

Um dia a história vai mostrar ao mundo que os bolivarianos autênticos eram e são, apesar de seus defeitos (como tem todos os regimes) os verdairos democratas, e os tucanos do continente é que sempre foram os golpistas, os autoritários, os patrocinadores de ditaduras.

O governo venceu todas nas últimas semanas.  Legalizou as pedaladas fiscais (para felicidade geral do país, porque se fosse crime iria servir para derrubar todo prefeito e todo governador) de 2015.

Outra dura derrota do golpismo: Leonardo Piccianian reassumiu hoje a liderça do PMDB na Câmara extremamente fortalecido. A turma do Cunha ainda tentou uma rasteira, derrubando a primeira tentativa de Picciani de protocolar o apoio da maioria dos deputados de seu partido, o que serviu apenas para dar um ar especialmente mau caráter e golpista à corrente pró-impeachment do PMDB.

A esquerda responsável não guarda rancor. Os Picciani apoiaram Aécio em 2014, são de direita, são fisiológicos. Mas são contra o golpe e, no momento, isso é o que importa. Não dá para governar somente com a esquerda, então nos aliemos com a direita não golpista, que respeita o resultado das urnas e que também não estão dispostos a entrar no jogo terrorista e antinacional do quanto pior melhor.

O Brasil precisa crescer, precisa se recuperar economicamente e precisa de um mínimo de estabilidade política.

Renam Calheiros, presidente do Senado, deu o recado: o PMDB também tem culpa pela atual crise de governabilidade, porque indicou ministros ruins para Dilma. Pensou apenas em distribuir empregos para caciques do partido, e não em subsidiar o governo com quadros de boa qualidade técnica.

Quanto à crise ética, seria mais do que ridículo o PMDB se arvorar agora em paladino da ética contra o PT. O PMDB sempre chafurdou na lama da corrupção, assim como todos os partidos, então todos devem participar desse debate sem salto alto, sem udenismo, sem hipocrisia, mas sem ceder aos gritos fascistas patrocinados pela mídia, de fim dos partidos, ou, o que é mais fascista ainda, do fim de alguns partidos selecionados.

O erro da oposição é o seu terrorismo quase messiânico, o seu espírito Estado Islâmico, que evidentemente assusta qualquer espírito esclarecido: vamos exterminar a esquerda, acabar com o PT. Ora, a direita brasileira, se quiser voltar ao poder e governar com um mínimo de estabilidade, precisará, evidentemente, negociar politicamente com a esquerda, aprender a conviver com a esquerda, respeitar a esquerda, assim como a esquerda, para governar, negociou com a direita, conviveu com a direita e respeitou a direita.

Ninguém é mais inteligente por ser de esquerda ou direita. As variáveis que nos levam a ser mais inteligentes, ou astutos, ou rápidos, ou profundos, ou poéticos, ou racionais, são tantas, tão complexas, que somente os verdadeiramente imbecis procuram associar ideologia e inteligência.

Além do mais, a inteligência não está associada à moral.

Um indivíduo pode ser o cara mais inteligente do planeta e ao mesmo tempo ter a personalidade mais decrépita, mais indigna, mais desprezível.

E vice-versa. Há casos de gente burra como porta, mas tão dignas, disciplinadas e esforçadas que se tornam às vezes pessoas importantes, queridas e até mesmo – merecidamente – ricas.

A votação no STF já não importa de maneira decisiva, porque, para o governo, o mais importante, é ganhar a batalha política.

Para a democracia e para o bem da estabilidade econômica, seria uma maravilha que o STF cortasse de uma vez a cabeça da serpente golpista, mas se não se sentir seguro para fazê-lo agora, por causa da pressão midiática, poderá fazê-lo posterioramente, caso a Câmara insista na tentativa de promover um impeachment sem especificar um crime de responsabilidade.

A batalha das ruas foi vencida pelo governo, mas este não pode repetir o erro cometido após a vitória em 2014. Não pode esquecer as ruas e abraçar os mercados, a mídia e a direita.

O governo tem de recuperar o seu prestígio entre seu próprio eleitorado. É a maneira mais lógica, mais coerente, e mais rápida, de melhorar os seus níveis de aprovação.

E melhorar o nível de aprovação é essencial para a estabilidade política e, com isso, para a recuperação econômica.

Esperemos que a crise tenha servido para Dilma aprender a respeitar a comunicação e a política.

No Congresso, a comissão do orçamento aliou-se à corrente progressista das ruas contra o aprofundamente do ajuste fiscal, e aprovou um orçamento mais humanista para 2016, sem cortar Bolsa Família e aumentando os recursos para investimento.

Cunha está mais destruído politicamente do que nunca. Seus peripécias reacionárias estão sendo todas derrubadas no Senado. Seu terrorismo anti-governo tornou-se uma caricatura golpista, com péssima imagem na sociedade, inclusive no gran monde da mídia, do colunismo.

Todas as instituições importantes se posiciaram contra o impeachment. Até a conservadora OAB não parou de divulgar textos dúbios, cheios de críticas conservadoras tentando disfarçar sua posição contra o golpe – razão pela qual a extrema direita das redes sociais não pára de chamar a OAB e seu presidente de “petistas”.

O golpismo ficou pendurado no apoio solitário da Fiesp.

Entretanto, mesmo o apoio da Fiesp ao impeachment foi uma espécie de golpe espertalhão de seu presidente Paulo Skaf, que fez uma pesquisa oportunista entre os diretores da entidade e jogou a entidade num processo suicida de politização.

Empresários golpistas, isso nunca deu certo. É prejuízo na certa para os empresários, para o país e para o povo.

Os empresários brasileiros deveriam se organizar, isso sim, para democratizar a mídia brasileira, porque o Brasil dificilmente conseguirá se desenvolver se o debate político permanecer atrasado, e este atraso não será superado se a mídia não se sofisticar, e não haverá sofisticação sem diversificação.

E não haverá diversificação sem democratização.

O Pato de Troia não engana mais ninguém. Todo mundo sabe que ele é um disfarce golpista para meia dúzia de sonegadores, liderados por um oportunista de olho nos eleitores antipetistas de seu estado.

O contínuo caos da política brasileira tem causado muita dificuldade a meu otimismo, mas o IBGE divulgou hoje que o desemprego caiu em novembro deste ano, para 7,5%. Estava 7,9% no mês anterior.

Não é nenhuma maravilha, porque ainda está bem mais alto do que o ano anterior, e a queda é natural nesta época do ano.

Mas foi uma queda, e, na atual conjuntura, basta segurarmos a peteca mais uns seis meses para asfixiarmos mortalmente o golpismo. Depois disso, mesmos os mais catastrofistas prevêem que o país deve se recuperar.

A espada de Dâmocles do TSE – o golpe hondurenho, via violência judicial – ainda pende sobre a cabeça do Executivo, mas as manifestações desta quarta-feira, somadas às vitórias do governo no Congresso, também dificultam que a direita enverede por este caminho.
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Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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