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A “pausa democrática” de Ayres Britto é, na verdade, a blitz plutocrática do Brasil

Foto: Andre Dusek/ Estadão por Tadeu Porto, colunista do Cafezinho Confesso que fui ler, com muita curiosidade e interesse, a chamada do Estadão para uma fala do ex-presidente do STF, ministro Ayres Britto, no MIT: que o Brasil vivia uma “pausa democrática”. A priori, só pela análise do título, não busquei desqualificar a fala de Ayres […]

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ADAY225 BSB - 13/03/2015 - AYRES BRITTO / ENTREVISTA (ESPECIAL EMBARGO DOMINICAL) - POLITICA - Ex ministro do STF Carlos Ayres Britto em sua residência , em Brasília. FOTO: ANDRE DUSEK/ESTADAO

Foto: Andre Dusek/ Estadão

por Tadeu Porto, colunista do Cafezinho

Confesso que fui ler, com muita curiosidade e interesse, a chamada do Estadão para uma fala do ex-presidente do STF, ministro Ayres Britto, no MIT: que o Brasil vivia uma “pausa democrática”.

A priori, só pela análise do título, não busquei desqualificar a fala de Ayres por que, de certa maneira, concordo que o país passe por um momento de transição política e nessas horas analogias são bem vindas para tentar descrever melhor esse contexto complexo.

Não canso de afirmar quando tenho a oportunidade, por exemplo, que nossa democracia é como um prédio que foi construído num brejo: não importa o quão a estrutura foi bem pensada, a base que o sustenta simplesmente não é sólida e confiável. Exemplos de falhas do nosso processo estão por todos os lugares, apesar de escutarmos, com muita frequência, que nossa instituições estão em pleno funcionamento (frase que seria arrogante até para a democracia mais antiga do mundo).

É insustentável, histórica e matematicamente, tentar manter um sistema dinâmico e limitado que alimente sistematicamente, de maneira desigual e padronizada, as partes que sustentam o mesmo.

Fica difícil ignorar, por exemplo, o caso nunca esclarecido de PC Farias; os milhares de escândalos que não foram estudados nem resolvidos, como o da SUDAM, Banestado ou Privataria; o fato de termos um quadro representativo hereditário ou milionário que sequer chega perto de retratar como é de fato nossa sociedade; propostas de reformas estruturais que nunca foram pra frente (talvez exceto pela reeleição que, aparentemente, foi comprada).

Existem, ainda, muitos outros exemplos de métodos inequivocamente tão plutocráticos — praticados por todas as esferas e poderes no país, diga-se de passagem — que era de se esperar a inevitável consequência de tamanha injustiça estourar no colo da população, gerando mazelas para ela e, consequentemente, a insatisfação geral.

Pois bem, voltando ao Britto: com a fé cega e o pé atrás de sempre — que procuro usar desde que decorei o álbum Filmes de Guerra e Canções de Amor do Engenheiros do Hawaii — li toda a matéria do Estadão. Decepcionante, e nada surpreendente, descobri que o ex-ministro gastou uma analogia até legal com uma visão pobre e equivocada do nosso momento político.

E ao ler os complementos da “pausa democrática” como “freio de arrumação para ideias, valores e processo da sociedade brasileira” e “quem não estiver com o cinto de segurança da decência, da transparência e do dever de casa cumprido vai se machucar seriamente” minha veia dialética pulsou de maneira que não pude controlar meus dedos de escrever um contraponto.

Em primeiro lugar, pausa democrática está longe de descrever o deslocamento que nosso sistema político faz no tempo: pausar, digamos, se assemelha a se manter imóvel no instante e não existe outra característica que descreva nosso momento do que retrocesso, regresso, retorno, volta, marcha ré, enfim, nosso vocabulário rico nos oferece dezenas de opções… Menos pausa. É difícil não ver um recuo no país com conspirações abertas do vice-presidente e uma das casas do legislativo sendo presidida (e controlando um processo de afastamento de uma chefe de poder) por um réu unânime no STF, e negligenciar esse fato, como fez Britto, é um desserviço para qualquer análise de conjuntura brasileira.

Em segundo lugar, se o país é um carro em movimento, não é um freio simples que vai selecionar, como mágica, quem vai sobreviver ou não da arrumação. Seria maniqueísta demais contar com a lógica binária do “com ou sem” cinto, pensar na modelagem do nosso sistema político.

Se somos mesmo um carro, estamos passando, na verdade, por um blitz da plutocracia, feita pelos policiais mais corruptos da corporação. Os criminosos, se escondendo nas fardas constitucionais e legais dos seus empregos, mandam encostar o carro, atrás do local da blitz, e deixam passar as pessoas dispostas a pagar um café ou dar aquela “molhada de mão”. Se não quiser jogar o jogo da propina, ótimo: as consequências são  uma multa no valor do carro e algumas coronhadas de legítima defesa (deles), obviamente, dentro das atribuições normativas de cada um.

Se nas nossas análises – bases para as tomadas de decisões do futuro – não pensarmos com muita seriedade nos abusos de poderes dos nossos agentes corremos sérios riscos de achar normal um estado de exceção travestido de democracia, ou um golpe fantasiado de processo legal.

E para essa observação, precedida de um diagnóstico, o ministro Ayres Britto consegue mais atrapalhar nossa política do que ajudar, com afirmações tão inverossímeis como essa.

Tadeu Porto é Diretor do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF)

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Comentários

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Maria Aparecida Lacerda Jubé

24/04/2016 - 20h09

E pensar que foi LULA que colocou um traste desse no STF, aliás as escolhas de LULA e DILMA para o STF, foram as piores escolhas de todos os tempos, parece que escolhiam a dedo o pior dos piores, só não foi pior do que a escolha de Gilmar Mendes, mas esse foi colocado lá por FHC para fazer exatamente o que faz.

Roberto

24/04/2016 - 13h43

Não foi esse que por R$56.000 motivos deu parecer favorável ao aeroporto “cheiroso´´ do aécim?

Joanilson

24/04/2016 - 13h20

Pois é ,como acreditar em uma justiça que tem lado e partido. O procurador janot outro também que tem lado e partido falou outro dia aí que pau que dá em Chico da em Francisco. Até nisso éle tem lado pau só bate no Chico porque é nome dado os primatas , agora nos Francisco é muito difícil porque é nome de PAPA e sempre que aparece os santinhos tipo Aécio, agripino,Geraldo o picolé de xuxu,cunhas,enfim e todos os 367 picaretas da câmara todos não vem ao caso o supremo também está no mesmo patamar só tem olho para os Chicos

Reinaldo Mechica Miguel

24/04/2016 - 12h39

PAUSA DEMOCRÁTICA PICAS. SEM QUALQUER VÊNIA VAI TOMAR NO CÚ. É GOLPE…

    Roberto

    24/04/2016 - 13h42

    Hahaha boa!

Fábio Brito

24/04/2016 - 13h20

O ASSUSTADOR DIA SEGUINTE!!!

Quando 367 é maior que 54 milhões!!!

Exclusivo no REBELDE SILENTE!!!

https://rebeldesilente.wordpress.com/2016/04/24/pcc-na-direcao-e-o-comando-vermelho-no-coracao-triste-brasil/

Alexandre Moreira

24/04/2016 - 11h49

Temos 367 picaretas no congresso, temos que fazer o balanço dos acovardados no judiciário.

Brilhante Tadeu Porto.

Paulo Preto

24/04/2016 - 11h15

Excelente texto

MANU #?SosCoupInBrazil

24/04/2016 - 10h58

Ideia mais porca, é querer arrumar o sistema político com cuspe

Ricardo Oliveira

24/04/2016 - 10h55

Ah! O “famoso” Ayres Britto, aquele da Companhia Brasileira de Meios de Pagamento…”se tem Brasileira no nome é porque é estatal”…incrível, inacreditável…

Valcir Barsanulfo

24/04/2016 - 10h15

Esse ex-ministreco já sujou os fundos das calças outras vezes. Traduzindo sempre em Maria vai com as outras, tem uma personalidade fraca.

Luiz Mattos

24/04/2016 - 10h07

SE O MUNDO TODO SABE QUE É UM GOLPE DE ESTADO O QUE NOS IMPEDE DE MARCHARMOS RUMO A BRASÍLIA E RECOLOCAR AS COISAS EM SEU DEVIDO ESTADO?
O MUNDO É NOSSO AVALISTA!
VAMOS RECONSTRUIR O BRASIL!!!!!!

    Carlos Corrêa

    24/04/2016 - 10h46

    Concordo com você. Acho que nesses 516 anos de Brasil, nunca o povo brasileiro esteve (está) tão legitimado a querer tomar o poder para si.

      MANU #?SosCoupInBrazil

      24/04/2016 - 11h00

      Infelizmente poucos querem tomar o poder não para o bem de todos, alguns querem tomar o poder para sua minoria.


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