Entrevista exclusiva! Theo Rodrigues, pré-candidato a vereador no Rio de Janeiro

O Cafezinho entrevistou, na última terça-feira à noite, um amigo querido, companheiro de Barão de Itararé e mesas de bar: o cientista político Theo Rodrigues, que os leitores do Cafezinho conhecem por suas colunas neste espaço.

Theo Rodrigues é um combativo militante, há muitos anos, pela causa da democratização da mídia.

Este ano, Theo irá experimentar a luta política numa etapa mais avançada: será a grande aposta do PCdoB carioca nas eleições legislativas deste ano. E não apenas do PCdoB, mas de boa parte de uma esquerda que entendeu a importância vital de uma comunicação mais democrática para todas as frentes da luta social.

É o candidato do Cafezinho para vereador. Curta a página dele no Facebook!

Independente da candidatura do Theo, porém, ele é um atento observador da conjuntura política nacional. Vale a pena conferir sua entrevista:

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Entrevista exclusiva para o Cafezinho: Theo Rodrigues, cientista político, pré-candidato a vereador pelo PCdoB no Rio de Janeiro.

Por Lia Bianchini, especial para o Cafezinho.

Instabilidade é a palavra que cerca o cenário político brasileiro. Pouco tempo após a concretização de um golpe de Estado e em ano de eleições municipais, as políticas regionais estão mais entrelaçadas do que nunca à política nacional e cada decisão tem sido minuciosamente calculada.

Diante desse cenário, O Cafezinho conversou com o mestre em ciência política Théo Rodrigues, que falou sobre as perspectivas do Brasil pós golpe, a esquerda carioca e o impacto que o momento político atual causará no entendimento da população sobre política.

O Cafezinho: Quais foram os erros do governo Dilma que favoreceram o impeachment?
TR: É difícil nesse momento falar de erros, porque a gente tem que tentar defender esse governo. Mas me parece o seguinte: o governo fez bastante coisa do ponto de vista da redistribuição, conseguiu fazer políticas públicas que reduziram a miséria, aumentaram o salário mínimo, criaram empregos, conseguiu ter essa capacidade redistributiva forte, ao contrário da história dos governos do Brasil, de 2003 pra cá isso melhorou bastante. Mas teve uma dificuldade no que diz respeito à potencialização de mecanismos de disputa de hegemonia. O que eu quero dizer com isso: disputa de consciência da classe trabalhadora. Infelizmente, o governo deixou nas mãos dos grandes meios de comunicação a formação ideológica do país, da consciência das pessoas. Então, embora haja uma mudança do ponto de vista da redistribuição, uma grande parcela da população não se reconhece dentro do projeto desse governo, porque não houve essa disputa ideológica, de formação de consciência. Parece-me que o principal erro do governo foi ter mantido, através da verba de publicidade, o monopólio dos meios de comunicação ao invés de ter utilizado a distribuição desses recursos financeiros pra fazer uma ação mais pedagógica, uma ação política de transformação de consciências.

O Cafezinho: Muito se fala sobre a chamada revolução pelo consumo, promovida pelos governos petistas. Você concorda com essa visão, então?
TR: É, o que eu estou chamando de avanços do ponto de vista da redistribuição econômica, que foram importantes na história do país, é o que alguns chamam de desenvolver o consumo. Dar possibilidade de a população mais pobre ter acesso a serviços antes exclusivos à classe alta. Isso que uma parte da literatura tem chamado de desenvolvimento do consumismo. Eu chamei de redistribuição econômica.

O Cafezinho: Depois da votação da Câmara, no dia 17, grande parte da população se posicionou de forma contrária à postura dos deputados. Como você analisaria essa visão crítica do eleitorado? É a mesma durante o período de eleições?
TR: Como os meios de comunicação sempre fazem um filtro da realidade, quando se faz uma transmissão ao vivo, como foi aquela do impeachment, as pessoas olham e falam “poxa, mas são essas as pessoas que estão me representando?”. O sujeito estava nas ruas contra a corrupção e, de repente, viu aqueles discursos, como, por exemplo, uma deputada que falou contra a corrupção e no dia seguinte o marido foi preso por corrupção. Então a população percebe esse tipo de coisa. Parece que ao menos uma coisa de positiva teve naquele cenário bizarro todo, que foi essa: mostrar às claras à população quem são os dois campos que estão em disputa. E me parece que a quantidade de mobilizações sociais, grandes atividades de rua, atividades permanentes (como o OcupaMinc) são sinais de que a população, em cima desse processo todo, está se politizando. Por outro lado, a parcela que apoiou o golpe, apoiou o impeachment, se calou depois daquele dia, nunca mais voltou às ruas. Acho que isso é sintomático do que tenha ocorrido naquele dia.

O Cafezinho: O governo Temer tem pouco tempo em exercício e já vem sofrendo grande pressão social, como você bem apontou. Como você acha que isso se reflete na situação da Dilma Rousseff agora? Você diria que há chances reais de que ela volte à presidência?
TR: É difícil ter bola de cristal pra saber o que vai acontecer lá em outubro ou novembro. Agora, acho que os movimentos sociais e a sociedade civil devem pressionar até o último minuto os senadores pra que alguns deles, pelo menos quatro, mudem de voto. Se quatro voltarem atrás na forma como votaram, pode ser que Dilma volte. Agora mesmo que ela volte, é uma situação complicada, porque a correlação de forças vai continuar a mesma no congresso. Nada impede, por exemplo, que o presidente da Câmara chame de novo um processo de impeachment no dia seguinte à sua volta. A forma como ela vai voltar é o mais importante. Se ela vai perceber que não dá pra governar com esse congresso que aí está e que vai ter que governar de alguma outra forma, com as ruas, enfim. Talvez até chamar o plebiscito seja uma das boas possibilidades. Chamar a população pra decidir o que vai ser do futuro da nação. Mas isso só saberemos depois da votação no Senado.

O Cafezinho: Imaginando que Dilma não volte, como você analisa que seriam os próximos dois anos de governo Temer?
TR: Bom, acho que vai ser a continuidade do que aí está: um ministeriado de homens brancos, ricos, velhos, corruptos. Um recorde de demissão de ministros…
O capital entrou no governo, você vê, por exemplo, um Ministério das Comunicações onde a Oi e a Net têm seus representantes, e assim em diversas áreas. Reforma trabalhista, acabando com os direitos dos trabalhadores, fim do aumento do salário mínimo, privatização de muitas áreas. Enfim, por um lado, uma volta à década de 1990, do ponto de vista econômico, aquelas políticas amplas de privatização e sucateamento do Estado. Mas por outro lado, e aí é pior que a década de 90, vai ter um grande retrocesso do ponto de vista moral, político, de valores, basta ver o poder que esse campo conservador tem dentro do governo, em especial os setores ligados a algumas igrejas.

O Cafezinho: Do ponto de vista dos movimentos sociais, você acha que podemos voltar à época das fortes repressões?
TR: A repressão já começou. A CPI da UNE já foi aprovada e vai ser instalada. Esse é só o primeiro passo e dá margem à criminalização de outros movimentos sociais. CPI da CUT, do MST, do MTST e por aí vai.

O Cafezinho: Falando agora do cenário carioca, recentemente houve uma reunião entre Jandira Feghali, Marcelo Freixo e Alessandro Molon, que definiu a união da esquerda nas eleições municipais para o segundo turno. Na sua concepção, essa foi uma postura acertada ou seria melhor ter união já no primeiro turno?
TR: Claro que do ponto de vista ideal seria bom que houvesse apenas dois campos na sociedade: direita e esquerda. Mas a realidade é muito mais complexa do que isso. As três candidaturas me parecem legítimas, são construções próprias e diferentes umas das outras. Um campo reconhece os avanços que houve no Brasil desde 2003 até hoje. Outro não reconhece tais avanços. Já um campo como o da Rede tem um outro tipo de política, outro eleitorado, completamente diferente do que é o de Jandira e Freixo. Então são construções bastante próprias.

Penso que a reunião foi positiva, porque é a primeira vez que a gente vê já no primeiro turno os candidatos da esquerda (que sempre tem vários) dispostos a um diálogo. Acho importante isso de garantir que eles se apoiem no segundo turno e que comecem a construção de um projeto de cidade onde as três forças políticas da esquerda possam participar. Um programa para a cidade precisa necessariamente ouvir o que os movimentos sociais têm a dizer. O que os estudantes secundaristas que estão ocupando as escolas estão reivindicando para a educação? O que os moradores das áreas onde houve remoções, como a Vila Autódromo, tem a dizer sobre habitação? O que os artistas que ocupam hoje o Palácio Capanema tem a dizer sobre cultura? E por ai vai…

Às vezes a gente tem pressa, porque é o trabalhador que está sofrendo com a prefeitura autoritária, mas a História não dá “cavalo de pau” dessa forma. Então é preciso paciência pra construir. Esse foi o primeiro passo em direção à unidade. Acho que, a partir do segundo turno e mirando 2018, essa unidade pode se consolidar de uma forma mais completa.

O Cafezinho: Mesmo tão fragmentada, a esquerda tem força pra chegar ao segundo turno?
TR: A esquerda está dividida, mas a direita também está, com Osório, Pedro Paulo, Bolsonaro, Crivella, são muitos candidatos. Há uma novidade ainda: é a primeira vez que o campo fascista vai estar organizado em torno de uma candidatura, que é a do Bolsonaro. Então a direita também está fragmentada. Resta saber se a esquerda vai saber se aproveitar disso pra crescer. Eu acho que é possível chegar ao segundo turno, sim. Parece-me que a candidatura de Molon colada à figura de Marina Silva pode tirar um eleitorado que talvez pudesse votar na direita, diminuindo um pouco o espaço deles. O Lula tem dito que vai ser a primeira vez que ele terá apenas um candidato no Rio de Janeiro, que é a Jandira, e isso pode aumentar a quantidade de votos da esquerda. Ao meu ver, parece haver uma musculatura maior na esquerda, inclusive a candidatura da Jandira vai ser a segunda com maior tempo de televisão, e tem uma fragmentação grande no campo da direita. Então, acho que está em aberto, mas é possível, sim, que a esquerda chegue no segundo turno.

O Cafezinho: No meio dessa fragmentação da direita que você citou, o PMDB insiste em uma figura desgastada como o Pedro Paulo para ser candidato. A máquina do PMDB dá sinais de que pode parar?
TR: É, a candidatura do Pedro Paulo é a candidatura da máquina municipal. Seu principal adversário é o Marcelo Crivella, que é a máquina Universal, a igreja. Essas são as duas máquinas que vão buscar votos. A partir de agora a prefeitura vai inaugurar muitas coisas e a cara de Pedro Paulo é que vai aparecer nesses eventos. Então esse vai ser o voto dele. Agora, não dá pra considerar que todo mundo que votava no Eduardo Paes vá votar no Pedro Paulo, porque, como eu disse, uma parcela desses eleitores agora vai votar no Bolsonaro ou no Osório.

O Cafezinho: Falando sobre alianças políticas, nas eleições passadas, PCdoB e PT coligaram-se ao PMDB. Esse campo da esquerda será cobrado e prejudicado por essa aliança agora ou foi uma aliança acertada e não há o que temer?
TR: O fato de o PMDB do Rio sair do governo federal foi justamente o estopim do impeachment, não foi pouca coisa o fato de parlamentares do PMDB do Rio irem votar a favor do impeachment naquele dia. Acho que isso é a maior comprovação de que foi acertado apoiar Eduardo Paes em 2008. Talvez o campo da esquerda pudesse ter feito uma autocrítica no sentido de que apoiar o PMDB em 2008 não significasse necessariamente participar desse governo, era possível ter apresentado mais críticas necessárias a essa prefeitura. Mas que foi acertado, foi, porque se Gabeira tivesse sido eleito, com apoio de Cesar Maia, de José Serra naquele momento, talvez a correlação de forças frente ao golpe fosse outra, porque a prefeitura do Rio de Janeiro é muito importante nesse cenário nacional. Então, talvez esse impeachment até pudesse ter vindo mais cedo. Claro, foi acertado apoiar do ponto de vista da governabilidade nacional, agora, é necessária essa autocrítica pra mostrar que deveriam ter sido apontados os erros da gestão de Eduardo Paes.

O Cafezinho: De que maneira o cenário político nacional irá interferir nas eleições municipais do Rio de Janeiro neste ano?
TR: Acho que, mais do que nunca, vai ficar nítida essa polarização nacional. Embora haja uma fragmentação de candidaturas na eleição do Rio, existem dois campos em disputa: um campo que foi contra o golpe e outro campo favorável ao golpe. Esses são os dois grandes campos que vão disputar essa eleição. Ao meu ver, são os candidatos mais fortes desses dois campos que vão conseguir polarizar a eleição. Acho que vai ficar claro para os eleitores que é exatamente isso que está em jogo.

O Cafezinho: Essa instabilidade política pela qual o Brasil vem passando pode favorecer a esquerda ou tem dado mais holofote à direita, principalmente à direita fascista?
TR: A direita está mais forte do que nunca, não à toa está no poder, no governo federal, o que não é pouca coisa. Por outro lado, existe essa esquerda que sempre existiu, essa parcela da sociedade que sempre esteve lá, mas que agora está mais organizada do que antes, está indo às ruas. Existe uma direita forte, mas existe também uma esquerda que quer responder a esse golpe. Pode ser que a esquerda volte mais forte para superar esse avanço momentâneo que a direita deu com Michel Temer ocupando a presidência. Parece-me que existe hoje uma grande contradição não entre direita e esquerda na sociedade, mas uma contradição interna do próprio bloco conservador que está no poder. Uma disputa entre o PMDB, que quer se livrar da Lava-Jato, e aquelas outras forças políticas, como o PSDB, que estão interessadas em assumir elas próprias a direção do governo federal. Então, essa contradição interna do bloco conservador pode gerar uma fissura onde a esquerda possa ocupar espaço.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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