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Novas molduras, velhas imagens

Por Eduardo Barbabela, João Feres Júnior e Marcia Rangel Candido, no Manchetômetro Nos últimos dias uma polêmica explodiu nas redes sociais e nas páginas do jornal Folha de São Paulo. Em sua edição do dia 17 de julho de 2016 o periódico paulista estampou em sua manchete os resultados de uma pesquisa realizada pelo instituto […]

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Por Eduardo Barbabela, João Feres Júnior e Marcia Rangel Candido, no Manchetômetro

Nos últimos dias uma polêmica explodiu nas redes sociais e nas páginas do jornal Folha de São Paulo. Em sua edição do dia 17 de julho de 2016 o periódico paulista estampou em sua manchete os resultados de uma pesquisa realizada pelo instituto Datafolha que apresentava o crescimento do otimismo na sociedade quanto ao futuro do quadro econômico. Entretanto, o trabalho de investigação de jornalistas da blogosfera revelou que o jornal havia manipulado dos dados, escondendo o crescimento da insatisfação da sociedade quanto à possível manutenção do governo Temer. Posteriormente o jornal admitiria parcialmente o erro. Mas será que isso basta? Ou melhor, será que essa proteção ao governo Temer foi um episódio pontual ou haveria uma tendência da cobertura do jornal paulista de agir de tal forma?

Desde a abertura do processo de impeachment em maio, a Folha de São Paulo fez clara sua posição editorial acerca da conjuntura brasileira: o impeachment não era a escolha ideal, porém era processo constitucional que, caso consumado, deveria ser respeitado. O tom e o discurso adotados pelo periódico com o advento da nova administração foi então se revestindo de otimismo, particularmente com relação ao futuro da economia brasileira.

Se voltarmos para 6 de março de 2016[1], quando Dilma ainda ocupava a Presidência da República, o editorial sobre economia adotava tom de grande pessimismo com o futuro do país. O panorama apresentado era de terra arrasada: falta de liderança política, falta de confiança do mercado, PIB em potencial queda de 3,8% no ano. O jornal afirmava não haver nenhuma solução para a crise econômica que se fazia presente caso a crise política se mantivesse. O Brasil apresentado pela Folha caminhava para o fundo do poço.

Entretanto, a partir de maio tudo ficou diferente. A transformação ocorreu principalmente a partir da nomeação de Henrique Meirelles, apresentado como a esperança de um novo futuro. O primeiro editorial do dia 2 de junho é um exemplo do novo tratamento[2]. No texto, o jornal comentava o resultado trimestral do PIB, que era queda de 0,3% no primeiro trimestre. Apesar de negativo, o editorial considerou este resultado bom pois mostrava recuperação da economia em relação aos índices de 2015, criando esperança de melhoras futuras, desde que a crise política fosse contornada. Segundo essa interpretação, agora poderíamos sonhar com o retorno do crescimento do PIB em 2017, algo que alguns meses antes era impensável.

Estes são exemplos do tratamento distinto dado pelos editores da Folha a Temer e Dilma no tema da economia. Mas será que esse comportamento se repetiu na posição geral da editoria do jornal em relação a esses governos? O que os dados do Manchetômetro nos dizem sobre os editoriais da Folha de São Paulo?

Gráfico 1 – Percentual das valências em textos em que o governo federal é citado nos Editoriais da Folha em 2016

Gráfico

Fonte: Manchetômetro/LEMEP

Como podemos ver claramente, a discrepância no tratamento dispensado aos dois governos pelos editoriais da Folha de S. Paulo não se restringe ao tema da economia. Durante o ano de 2016, o padrão do tratamento de Dilma nos editoriais foi de 8 textos negativos para cada dez publicados. Já Temer é visto de modo bem mais equilibrado, com 1/3 de textos negativos, 1/5 de favoráveis e a maior parte neutros. Ou seja, a proporção de negativos que ela recebia era mais que o dobro da que ele recebe. Ademais, é notável a presença de vários editoriais favoráveis ao governo do presidente interino, privilégio que foi negado à Dilma.

Resta-nos saber se essa posição editorial do jornal se reflete também na valência da cobertura como um todo, que inclui reportagens e demais texto de opinião. O advento do Governo Temer serve para testar novamente a tese de que a mídia comporta-se como defensora do interesse público e, portanto, é sempre crítica ao poder instituído — conhecida também como tese do “cão de guarda”.

O Manchetômetro já fez isso comparando a cobertura de 1998, quando Fernando Henrique Cardoso concorreu à reeleição, com a eleição de 2014, que tinha Dilma em situação similar. O resultado foi a evidente falsificação da tese. Apesar de ser governo, FHC foi tratado de maneira extremamente favorável pelos jornais Folha, Estado e O Globo, ao passo que seus adversários receberam cobertura predominantemente negativa. Some-se a isso o fato de que os índices da economia ao final de seu primeiro governo eram péssimos, fato que revela a motivação política clara dos jornais ao dispensar este tratamento favorável. Será que a grande mídia vai assumir uma postura de cão de guarda ou continuará a funcionar como suporte da direita política em nosso país?
Julgando pelos resultados desse breve estudo e pela atuação pregressa dessas empresas, podemos esperar o pior.

[1] “Está no preço”. Folha de São Paulo, 06 de março de 2016.

[2] “Questão de Perspectiva”. Folha de São Paulo, 02 de junho de 2016.

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