Menu

Der Spiegel: o afastamento de Dilma Rousseff é uma injustiça histórica

Foto: Reprodução/ Der Spiegel O Afastamento de Dilma Rousseff: Uma injustiça histórica por Jens Glüsing, no Der Spiegel | Tradução: Pablo Holmes, professor de Direito da UNB. especial para O Cafezinho A palavra “Golpe” tem um grande peso na América Latina. Ela é associada com imagens de generais cruéis usando óculos de sol, de tanques nas […]

sem comentários
Apoie o Cafezinho
Siga-nos no Siga-nos no Google News

Foto: Reprodução/ Der Spiegel

O Afastamento de Dilma Rousseff: Uma injustiça histórica

por Jens Glüsing, no Der Spiegel | Tradução: Pablo Holmes, professor de Direito da UNB. especial para O Cafezinho

A palavra “Golpe” tem um grande peso na América Latina. Ela é associada com imagens de generais cruéis usando óculos de sol, de tanques nas ruas, pessoas torturadas e desaparecidas. Soa portanto estranho chamar de golpe o afastamento da Presidente Dilma Roussef no Brasil. Mas como se deve chamar um processo pelo qual uma chefe de Estado eleita é deposta com base em razões legais questionáveis?

Os homens que impuseram a mudança de poder em Brasília não são sanguinários como Pinochet. Eles são senhores (e algumas poucas senhoras) em ternos. Muitos são grandes proprietários de terra e empresários, a maioria milionários contra quem há diversas investigações criminais por corrupção, lavagem de dinheiro ou organização criminosa. Alguns têm até mesmo condenações, embora tenham garantido para si privilégios e a própria liberdade. Enquanto isso, esses mesmos senadores julgaram uma presidente que, segundo seus próprios opositores, é honesta e sem máculas.

O Senado brasileiro representa uma classe política mais antiga que a própria democracia. Ela consiste de dinastias que governam seus próprios Estados há décadas como seus reinos privados. A maioria dos senadores representam um sistema que a ex-guerrilheira Roussef nunca aceitou realmente – e que ela em seu ínitmo mais profundo provavelmente despreza.

Ela não é uma política; ela não domina os truques

Roussef se adaptou ao sistema, pois de outra forma ela não poderia ter governado. Ela se negou a apoiar o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, hoje denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro, quando este a ameaçou. E agora o sistema se vingou. Não é preciso ser um apoiador de Dilma Rousseff ou de seu antecessor, Lula, ou mesmo de seu partido, o PT, para perceber: contra essa mulher foi cometida uma injustiça histórica.

O Impeachment é um processo político legítimo, dizem os críticos de Dilma Roussef. Ela é punida por suas políticas, que conduziram o país à crise econômica mais profunda em décadas.

Mas o impeachment não foi criado para isso pelos pais da constituição. Ele consiste em uma cláusula que protege a nação de que criminosos ocupem o posto mais alto do Estado. Por isso, a constituição prevê que o condenado também perca seus direitos políticos por oito anos. A classe política brasileira cometeu um abuso dessa cláusula, para se livrar da presidente de que não gostava.

Os remorsos dos opositores de Roussef

Como alguns senadores também tinham dúvidas de que o processo seria conforme a constituição, eles resolveram manter os direitos políticos de Dilma em uma segunda votação, permitindo-a exercer funções públicas. Assim, eles separaram o dispositivo da constituição e inventaram algo como um “impeachment soft” – difícil não perceber que o fizeram claramente por remorsos.

Brasil tem um regime de governo presidencial; não se pode remover o governo e convocar novas eleições se o presidente perde a maioria, como no parlamentarismo. A única forma legítima de mudança de poder são as eleições a cada quatro anos. Mas os opositores de Roussef não queriam esperar tanto. Eles tomaram como pretexto a manipulação de gastos orçamentários que eram comuns também em governos anteriores ao dela para construir um caso contra a presidente.

Três dos sete pontos da acusação já haviam caído quando o processo chegou ao fim, essa semana. Também o Ministério Público constatou que as acusações contra Roussef não consistiam em uso criminoso do cargo. As acusações foram arquivadas na esfera penal, por não ter cometido nenhum delito. Mas isso não contou de nada. O impeachment se tornou um acerto de contas político: correto formalmente, mas com base legal extremamente frágil.

Roussef esteve perante os senadores durante onze horas na última segunda feira para responder perguntas até o esgotamento. Ela não era obrigada a fazê-lo, mas o fez ainda assim. Afirmou ter uma natureza lutadora. Ela esclareceu até as últimas minúcias como funciona o processo decisório sobre as contas, como várias instituições participam, quem tem direito de opinar. Quem assistiu ao depoimento pôde aprender como o governo funciona no seu mais profundo interior, e como essa mulher permaneceu fiel à constituição. O estado brasileiro não é uma espelunca em que o presidente pode dispor dos recursos como queira. Mas isso não importava mais a ninguém. O processo foi uma farsa, o resultado já havia sido acertado previamente.

Porém, a oposição se fez a si mesma um desserviço com a deposição de Roussef. Ela banalizou o processo de afastamento presidencial. Dois dos presidentes eleitos do Brasil desde o fim da ditadura militar, no meio dos anos 1980, foram afastados do cargo. Apenas Fernando Henrique Cardoso e Lula terminaram os seus mandatos. Se, no futuro, um presidente impopular for perseguido por meio de um processo de impeachment, será novamente permitido abreviar a sua vida útil no cargo. A profunda crise de confiança no sistema político não foi encerrada com o afastamento de Roussef. Bem ao contrário.

E agora? Logo Temer?

Tempos tormentosos se aproximam do Brasil. E exatamente o homem que terá que conduzir o país durante a crise pode ser a sua próxima vítima: Michel Temer, que agora foi empossado oficialmente como o novo presidente do Brasil, quer impor ao país uma virada conservadora para a qual ele não foi legitimado pelas urnas.

Temer é tão impopular como Roussef. Se ele insistir em seu plano, ele vai dividir ainda mais o país. Se ele se aproximar do PT ou de Lula, por outro lado, ele deverá esperar que o mercado seus aliados conservadores podem querer derrubá-lo – muitos analistas econômicos já duvidam que ele conseguirá levar a frente no congresso as reformas necessárias necessárias. Se Temer não conseguir colocar a inflação sob controle e reimpulsionar a economia, o Brasil poderia estar novamente diante de uma década perdida, assim como a década de 1980.

A história da América Latina ensina que golpes só são bem sucedidos, se eles têm o apoio de amplos setores da sociedade civil. O Brasil não é uma exceção. Roussef era uma presidente fraca, sua popularidade chegou a menos de 10% ao final do governo. Com uma política econômica errante e seus modos muitas vezes autoritários, ela contribuiu para a sua própria queda.

Ela não é a única culpada pela crise econômica. O Brasil sofre sobretudo por conta da queda dos preços de matérias primas e o enfraquecimento da demanda chinesa. Mas Rousseff escondeu o verdadeiro tamanho da crise durante as eleições, reagindo tarde demais. Assim, ela perdeu o apoio da classe média, sem o qual o Brasil não pode ser governado.

O Brasil na Crise

Essa classe média quis impedir a todo custo que o Partido dos Trabalhadores do ex-presidente Lula se mantivesse no poder. Ela temia que o Brasil terminasse como a Venezuela – uma suposição absurda. O escândalo de corrupção em torno da Petrobrás selou o medo da elite brasileira de uma ditadura de esquerda populista. Eles ignoraram, assim, que foram nos governos Lula e Dilma que a polícia e o ministério público tiveram assegurados os meios para agir contra os mais poderosos.

Se esse elan se manterá ao redor do governo Temer é questionável. Lideranças dos partidos atingidos por escândalos de corrupção já esboçam no congresso uma anistia para os políticos envolvidos. Desse acordo sairia beneficiado sobretudo o Governo Temer – há investigações por corrupção também contra o presidente e muitos dos mais influentes políticos do governo.

Historiadores vão ainda julgar o que aconteceu durante os últimos dias no Brasil. Dilma Rousseff certamente não entrarará para história como uma grande presidente. Mas como uma mulher honesta e correta, que quis fazer o melhor pelo seu país e foi injustamente cassada do seu mandato por uma classe política em grande parte corruptos e incapazes de conduzir reformas.

A Rússia segue a tendência mundial mais avançada. Agências internacionais e economistas renomados convergem no diagnóstico que reconhece na orientação neoliberal uma das principais causas da devastação iniciada em 2008.

Um relatório da Organização das Nações Unidas sobre a situação econômica global e as perspectivas para 2016 identificou um declínio de 54% na taxa média de crescimento nos países desenvolvidos nos últimos sete anos. O total de desempregados aumentou para 44 milhões, com um acréscimo de 12 milhões de indivíduos desde 2007.

“Mais preocupante ainda, as taxas de crescimento tornaram-se também mais voláteis. Isso é surpreendente porque, com as contas de capital totalmente abertas, eles deveriam ter se beneficiado do fluxo livre de capital e do compartilhamento internacional do risco e, assim, experimentado pequena volatilidade macroeconômica”, destacam os economistas Joseph Stiglitz e Hamid Rashid, em artigo recente.

A sua conclusão dá mais razão ainda aos defensores do controle da conta de capital nos países emergentes. A contração fiscal e o quantative easing, ou compra, pelos bancos centrais, de títulos públicos e consequente abarrotamento do mercado com dinheiro “proporcionaram pouco suporte ao estímulo do consumo das famílias, ao investimento e ao crescimento. Ao contrário, pioraram as coisas”, concluem os especialistas.

O alerta de Stiglitz e Rashid vale para paí­ses desenvolvidos e emergentes, mas não se espera muita receptividade por aqui. 

Quais interesses Pedro Parente defende?

O geólogo Seixas Chagas arrasa as explicações “técnicas” da entrega de 6 bilhões de barris de óleo e gás como se fossem apenas 1,3 bilhão

O presidente da Petrobras, Pedro Parente, disse que vendeu o bloco exploratório BM-S-8 do pré-sal, com o poço de Carcará, à norueguesa Statoil, porque algumas das suas características “não eram interessantes”.

O coordenador do grupo de trabalho da Federação Brasileira de Geólogos para Assuntos de Petróleo, Luciano Seixas Chagas, ex-funcionário da empresa pública e renomado especialista no assunto, demoliu as explicações de Parente na entrevista abaixo:

CartaCapital: Algumas características do campo vendido não seriam “interessantes”, segundo o presidente da Petrobras. Isso é verdadeiro?

Luciano Seixas Chagas: As diretorias técnicas da empresa, principalmente a da área de exploração comandada pela engenheira Solange Guedes, sabem que os números são bem maiores do que o 1,3 bilhão de barris negociado.

Em primeiro lugar, porque nenhum dos três poços atingiu o contato óleo/água, o que denuncia ser área de acumulação muito maior que a delimitada por esses poços. Além disso, o gráfico de pressão plotando o gradiente do petróleo dos três poços, junto ao gradiente da água salina, demonstra que a primeira assertiva é verdadeira, ou seja, a área do reservatório é muito maior que a delimitada pelos poços perfurados.

Os testes de interferência realizados mostram que os reservatórios são comunicados e têm, portanto, continuidade hidráulica, com comunicação pelo espaço entre os poros e fraturas, sendo essas abundantes na área de Carcará.

Acrescente-se ainda que os fluidos oriundos do manto profundo aumentaram, por dissolução, o sistema poroso original. É possível que só na sua estrutura estejam acumulados 6 bilhões de barris recuperáveis de óleo e gás equivalente. Isso somente no bloco BM-S-8.

CC: As características condenadas por Parente são elevadíssima pressão, necessidade de sair do padrão dos demais campos da empresa e desenvolver equipamentos novos e mais caros. Alegou também a grande distância das outras operações e exigência de construção de um novo gasoduto.

LSC: Diante dos imensos volumes recuperáveis nos polos atuais e em Carcará, os dutos agora projetados e em execução já seriam, de todo modo, insuficientes. Portanto, a alegada grande distância entre os projetos é falaciosa.

Os novos dutos obviamente seriam mais caros. Suportariam elevadas pressões, podem ser projetados com maior capacidade de transporte e de interligação dos dois polos principais, além de outros menores.

A tecnologia é dominada pelo mercado, não há necessidade de novas pesquisas, só adaptações. Dizer que serão gerados custos adicionais devido às modificações do sistema de produção, escoamento e infraestrutura é açodamento.

CC: Por quê?

LSC: O que a princípio parece verdade pode ser justamente o contrário. O petróleo de Carcará tem pressão 50% superior aos das redondezas, baixa densidade e alta mobilidade, não tem CO2 e tampouco o H2S corrosivos, o óleo é leve e tem elevada razão de solubilidade.

Isto significa que há muito gás em solução a ser produzido com o óleo. Em razão da grande espessura dos reservatórios, o projeto usaria poços verticais ou inclinados, muito mais baratos que os horizontais.

Se, por um lado, os equipamentos de perfuração e complementação dos poços serão mais caros, por outro, com as suas elevadas vazões e pressões os reservatórios de Carcará produzirão por muito mais tempo, tornando o projeto de implantação ainda mais econômico.

*Reportagem publicada originalmente na edição 916 de CartaCapital, com o título “Marcha à ré acelerada”.

Apoie o Cafezinho
Siga-nos no Siga-nos no Google News

Comentários

Os comentários aqui postados são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião do site O CAFEZINHO. Todos as mensagens são moderadas. Não serão aceitos comentários com ofensas, com links externos ao site, e em letras maiúsculas. Em casos de ofensas pessoais, preconceituosas, ou que incitem o ódio e a violência, denuncie.

Escrever comentário

Escreva seu comentário

Nenhum comentário ainda, seja o primeiro!


Leia mais

Recentes

Recentes