Espiando o poder – A imprensa morde, assopra, e o golpe avança

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Espiando o poder: análise diária da grande imprensa

Foto: Peter Leones/Futura Press

Por Luis Edmundo Araujo, colunista do Cafezinho

Sumido das páginas dos jornais de ontem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ganha espaço privilegiado hoje nas capas do Estado e da Folha de São Paulo. O Estadão abre a maior foto de sua primeira página ao falar, enfim, sobre os rumores da possível prisão do ex-presidente. Sob o titulo “Lula preso? Quem disse?”, como quem paga pra ver, mostra apoiadores do ex-presidente em frente ao prédio onde ele mora. A Folha faz mais e dá voz a Lula, que assina artigo com chamada na capa em que o ex-presidente diz que “acusadores sabem que não roubei nem tentei barrar Justiça”. Já o Globo não cita Lula, e vem com a foto do também ex-presidente Fernando Henrique Cardoso entre Míriam Leitão e Merval Pereira. “FH defende reforma”, diz o título da chamada da capa onde o ex-presidente aparece falando no microfone, bem abaixo do logotipo do jornal, ensinando o que fazer para salvar este país de fraudadores, segundo a manchete. “Perícia em 2% dos benefícios recupera R$ 139 milhões”, afirma o Globo no título, e no subtítulo avisa que “pente-fino encontrou pessoas saudáveis que estavam trabalhando e recebiam do INSS”. A manchete do Estadão é uma denúncia contra a família do atual ministro do Esporte, Leonardo Picciani (PMDB-RJ); a da Folha grita que “juiz inocenta 14 acusados de acidente no metrô de SP”, e no jogo do morde e assopra, do ponto e contraponto, a tropa do golpe segue seu avanço, analisando alternativas.

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Sob a pergunta “E agora Brasil?”, título do evento que o jornal promove, “com apoio da Confederação Nacional do Comércio (CNC)”, o Globo abre quatro páginas para que FHC defenda a reforma política entre os rapapés da mídia amiga, que podem ser medidos pela abertura de uma das matérias. “O clima no auditório na Maison de France durante o terceiro encontro ‘E agora Brasil?’ foi tomado pela esperança quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ao lembrar da implementação do Plano Real, sentenciou: “meus assessores diziam que era impossível fazer qualquer coisa. Mas, (a situação) só muda quando está tudo ruim. É possível mudar na crise, desde que haja liderança”, diz o texto.

Na página ao lado, acima da foto em plano aberto do ex-presidente a falar entre Míriam e Merval diante da plateia atenta, embevecida, os “tucanos enfrentam desafio de construir unidade”, em busca da tal liderança que guiará a todos. Por enquanto, porém, é tempo de união. “Seria puro oportunismo atacar o governo”, afirma FHC no título da matéria que abre com o “clima de esperança”, na segunda página dedicada ao evento. O ex-presidente mostra que PMDB e PSDB devem mesmo ficar unidos agora, e elogia o presidente não eleito nem votado, Michel Temer, pedindo desculpas pela expressão popular.

Temer é “macaco velho”, “sabe mexer com o Congresso” e deve “se jogar” para fazer a reforma, diz FHC, que dentro da citada reforma defende, também, a “volta das doações de empresas, mas com limites de valores e controles rigorosos impostos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).” O financiamento privado das eleições, como se sabe, foi a via pela qual transitaram 99,9% dos casos de corrupção investigados pela Lava Jato, e a defesa da volta dele, feita por FHC, combina com a chamada do Estadão a dizer que “Câmara quer volta da doação empresarial por meio de fundo” eleitoral.

Fala-se em reforma política, o Globo ressalta em título que a “democracia vive crise de representação”, mas tanto a grande mídia como a classe política mantêm em seus projetos para o futuro a volta do financiamento privado, a maior ferramenta de controle do processo eleitoral pelos donos do capital. E se também dá seu pitaco na reforma política, escalando Hélio Schwartsman, na coluna “Segundo turno instantâneo”, para sugerir o fim dos “altos custos” do segundo turno, a Folha combate em outra frente pela volta das doações empresariais.

“Comitê do PSDB em Porto Alegre sofre dois ataques a tiros”, diz a chamada de capa a retomar a tese já abordada pelo jornal, em editorial, de que a redução dos recursos aumenta a violência das campanhas eleitorais. Pede-se a reforma política, clama-se por mudanças para salvar a democracia mas sem mexer na regra principal, que ajudou a formar o atual Congresso Nacional, até pouco tempo atrás regido por Eduardo Cunha, que aliás está solto ainda, assim como Lula, nome, aliás, que provocou declarações contraditórias de FHC.

“Não gosto de ver ninguém na cadeia, muito menos o Lula. Se vai eu não sei, tomara que não”, disse o ex-presidente, no mesmo evento em que afirmou, como se alertasse: “Sem Lula, o PT é um partido médio. Com Lula, é um perigo nacional”. E Lula responde na Folha, no artigo “Por que querem me condenar”, cuja chamada na capa vem ao lado dos tiros no comitê do PSDB. “Nossa gente não esquecerá dos milhões de jovens pobres e negros que tiveram acesso ao ensino superior. Vai resistir aos retrocessos porque o Brasil quer mais, e não menos direitos”, afirma o ex-presidente petista, ao se defender mais uma vez da campanha jurídico-midiática para alijá-lo da disputa eleitoral de 2018.

Lula cita “a leviandade, a desproporção e a falta de base legal das denúncias” contra ele, assim como a “sofreguidão com que são processadas em juízo”, o que contrasta com a manchete da Folha sobre mais uma sentença da Justiça a livrar tucanos de condenações por crimes que, no caso, até morte causaram. “Para Justiça, desabamento que matou 7 pessoas era imprevisível”, informa o subtítulo da manchete sobre a decisão da juíza Aparecida Angélica Correia, da 1a Vara Criminal de São Paulo.

O acidente ocorreu em janeiro de 2007, quando um desabamento num canteiro das obras da Estação Pinheiros do metrô de São Paulo “abriu uma cratera que engoliu caminhões, maquinário e quem passava por uma das ruas no entorno”, segundo a matéria da Folha. Era o começo da gestão de José Serra como governador e cinco funcionários do metrô paulista foram acusados, junto com nove do consórcio formado para a obra, liderado pela Odebrecht e que incluía também OAS, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez. Para a juíza, ninguém teve culpa. “Ora, os acusados não tinham como prever o acidente”, afirmou a magistrada, na sentença.

Com mais uma decisão dessas, não é difícil prever qual será a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação a mais uma das inúmeras denúncias contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG). “STF autoriza investigar Aécio, acusado de atuar na CPI dos Correios em favor dos tucanos”, diz o Globo na capa, como contraponto em quatro linhas apenas, no canto, bem embaixo de outra chamada maior, como quem tripudia, de novo, de José Dirceu.

Sob o ‘chapéu’ avisando que, “apenas no mensalão”, o “STF extingue pena de Dirceu”, que continua devidamente preso, como sempre sem provas, em função da Lava Jato. A notícia é o assunto único da coluna de hoje de Merval Pereira, que na primeira página, entre Aécio e o ex-ministro-chefe da Casa Civil diz, magnânimo, que a “Lei penal é leniente, mas seria absurdo não beneficiar Dirceu”. Lá dentro, na coluna intitulada “Facilidades penais”, Merval usa a situação de Dirceu para pedir mais rigor da Justiça, mais tempo de prisão aos condenados. “É um absurdo que a legislação penal brasileira seja tão leniente a ponto de permitir que um preso receba o indulto após cumprir ¼ da pena”.

E na chamada logo acima do perdão inócuo a Dirceu, o Globo destaca que o Poder Judiciário está “mais caro e lento”. Estudo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostra que o Judiciário custou R$ 79,2 bilhões em 2015, 4,7% a mais que no ano anterior. Despesas com os servidores, magistrados incluídos, respondem por 89% desse total. Além disso, “de cada 100 processos, apenas 28 foram concluídos”. A Justiça é cara, lenta, mas é preciso prender mais e mais rápido, só não se sabe ainda sobre uma prisão específica, no caso, a que mais importa.

O Estadão diz na manchete que “empresa de ministro é acusada de vender vacas superfaturadas”. Uma ex-funcionária da Engenharia Carioca, empreiteira investigada na Lava Jato, disse em delação ter comprado “vacas superfaturadas” da Agrobilara Comércio e Participações Ltda. A empresa é da família do ministro do Esporte, Leonardo Picciani, filho do presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Jorge Picciani, e a denúncia já foi minimizada por Temer. De Tóquio, o presidente avisou que, assim como as denúncias contra Moreira Franco, Romero Jucá e Geddel Vieira, trata-se apenas de “simples alegação”.

Na primeira página do Estadão, a manchete vem bem acima da foto de Peter Leone, da Futura Press. O boato “Lula preso amanhã”, divulgado nas redes sociais neste domingo por um blogueiro “simpatizante do PT”, mobilizou apoiadores do ex-presidente como o ex-deputado Professor Luizinho, diz o texto-legenda. E no jogo de morde e assopra da mídia, de espera, estudo e estratégia, a Folha deu a Lula a oportunidade de concluir seu artigo com o temor de todos nós: “Tenho a consciência tranquila e o reconhecimento do povo. Confio que cedo ou tarde a Justiça e a verdade prevalecerão, nem que seja nos livros de história. O que me preocupa, e a todos os democratas, são as contínuas violações ao Estado de Direito. É a sombra do estado de exceção que vem se erguendo sobre o País”.

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Luis Edmundo: Luis Edmundo Araujo é jornalista e mora no Rio de Janeiro desde que nasceu, em 1972. Foi repórter do jornal O Fluminense, do Jornal do Brasil e das finadas revistas Incrível e Istoé Gente. No Jornal do Commercio, foi editor por 11 anos, até o fim do jornal, em maio de 2016.
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