Juiz autoriza tortura psicológica como “meio para restringir” ocupações em escolas

(Foto: Reprodução/Facebook)

Comentário de Liane Cirne Lins, professora da Faculdade de Direito de Recife e do PPGDH/Mestrado em Direitos Humanos na Universidade Federal de Recife (UFPE), em seu Facebook:

“Juiz Alex Costa de Oliveira determina uso de TORTURA contra estudantes que estão ocupando escola em Brasília.

Escrevi minha tese de doutorado sobre tutela inibitória dos direitos fundamentais sociais e sempre fui uma entusiasta das formas de convencimento do réu, no processo civil. Mas isto porque vivíamos numa democracia e havia limites evidentes para tais técnicas de convencimento: a legalidade era um limite MÍNIMO, pois a proporcionalidade, a razoabilidade, a dignidade humana eram critérios que deveriam ser igualmente sopesados.

Agora, no estado de suspensão das nossas prerrogativas democráticas em que estamos vivendo, um juiz determina uso de TORTURA contra crianças e adolescentes, impedindo acesso de serviços essenciais aos prédios ocupados, impedindo o acesso dos pais dos estudantes ao local, IMPEDINDO ENTRADA DE ALIMENTOS, DETERMINANDO USO DE INSTRUMENTOS SONOROS ININTERRUPTOS PARA IMPEDIR-LHES O SONO.

Isto, senhoras e senhores, não é um fascista qualquer que sai gritando absurdos reacionários em frente à escola ocupada.

Isto é um JUIZ DE DIREITO. E que não está escrevendo impropérios no seu Facebook, mas entregando prestação jurisdicional no caso concreto, com violação não apenas de inúmeras normas do Estatuto da Criança e do Adolescente, mas com violação de diversos tratados internacionais de direitos humanos e de direitos da infância.

Quando o Estado tomou de nós nosso poder de autotutela, o fez mediante a garantia de que prestaria a jurisdição através de um juiz natural e imparcial e tendo o direito como seu objeto.

O judiciário brasileiro está ROMPENDO COM O CONTRATO SOCIAL DA JURISDIÇÃO ao nos expor a esta sorte de vergonha.

Que a decisão seja anulada, por teratológica (que viola preceitos fundamentais do direito) e o juiz responsabilizado, nas formas cabíveis.

Processo n. 2016.01.3.011286-6.”

Abaixo reportagem da Rede Brasil Atual.

***

Justiça do DF determina uso de técnicas de tortura contra estudantes em ocupações

Entre as ações, estão cortes do fornecimento de água, luz e gás das escolas, uso de ruídos para impedir o período de sono e restrição ao acesso de familiares, amigos e alimentos

na Rede Brasil Atual

O juiz Alex Costa de Oliveira, da Vara da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), determinou o uso de técnicas de tortura para “restrição à habitabilidade” das escolas, com objetivo de convencer os estudantes a desocupar os locais. Entre as técnicas estão cortes do fornecimento de água, luz e gás das unidades de ensino; restrição ao acesso de familiares e amigos, inclusive que estejam levando alimentos aos estudantes; e até uso de “instrumentos sonoros contínuos, direcionados ao local da ocupação, para impedir o período de sono” dos adolescentes. A decisão é do último domingo (30).

O juiz ainda ressalta que tais medidas ficam mantidas, “independentemente da presença de menores no local”. “Autorizo expressamente que a Polícia Militar (PM) utilize meio de restrição à habitabilidade do imóvel, tal como, suspenda o corte do fornecimento de água; energia e gás (…) restrinja o acesso de terceiro, em especial parentes e conhecidos dos ocupantes (sic)”, determinou Oliveira.

O magistrado pede ainda a identificação de todos os ocupantes e que a PM observe uma eventual prática de corrupção de menores no local. A determinação para reintegração de posse das escolas é imediata, demandando apenas que a polícia efetive o reconhecimento dos locais, conheça o número de ocupantes e disponibilize efetivo para a ação.

Para o advogado Renan Quinalha, que auxiliou os trabalhos da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo, a decisão é absurda e legitima técnicas de tortura contra estudantes nas escolas ocupadas. “É uma reedição de técnicas de tortura. São considerados meios mais amenos, por assim dizer, por que não tem violência direta, mas isso agride física e mentalmente os estudantes. Visa criar o caos entre os jovens. Não é para convencer. É autoritário e violento”, afirmou.

Na madrugada de hoje (1º), um grupo invadiu ilegalmente o Centro de Ensino Médio Ave Branca (Cemab), em Taguatinga, cidade-satélite de Brasília e lançou bombas caseiras e coquetéis molotov para expulsar os alunos que ocupavam o local. Pela manhã oficiais de justiça, acompanhados por soldados da Polícia Militar do Distrito Federal, cumpriram mandado de desocupação da escola. Os alunos saíram pacificamente do local.

O Distrito Federal tem outras sete escolas ocupadas nas cidades-satélites de Samambaia, Planaltina, Recanto das Emas, Taguatinga e em Brasília, no Plano Piloto. Também estão ocupados cinco institutos técnicos federais, localizados nas cidades-satélites de São Sebastião, Planaltina, Riacho Fundo, Estrutural e Samambaia. Na noite de ontem, estudantes da Universidade de Brasília (UnB) decidiram ocupar a reitoria.

Em todo o país, mais de mil escolas foram ocupadas em protesto contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 (que se tornou PEC 55 na tramitação atual, no Senado), que vai causar cortes de verbas nas áreas sociais, da saúde e da educação, e contra a Medida Provisória 746, que propõe a reforma do ensino médio sem discussão com especialistas, profissionais e estudantes.

Veja abaixo um trecho da decisão:

Redação:
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