10 medidas contra corrupção: o cerco aos Direitos Humanos

Advogado escreve sobre autoritarismo e faz críticas às 10 medidas contra corrupção, projeto de lei que altera o código penal e tem causado revolta em juristas e professores.

No Justificando

Entre o autoritarismo e a farsa: o dilema da votação das 10 medidas contra a corrupção

Por Brenno Tardelli

Uma das maiores alterações nas leis penais brasileiras, as 10 medidas contra a corrupção estão sob iminente votação na Câmara dos Deputados, mas, curiosamente, desagrada os mais variados setores da sociedade. Professores universitários, ativistas de direitos humanos e advogados estão preocupados com o imenso aprofundamento do autoritarismo e encarceramento decorrentes das medidas. Já procuradores da república, juízes e grupos pelo combate à corrupção estão frustrados com o desvirtuamento das propostas originais para inclusão de medidas, no mínimo, questionáveis como a anistia do caixa 2.

No último domingo (27) o Presidente da República Michel Temer, atendendo aos anseios do segundo grupo, anunciou em rede nacional que não haveria qualquer possibilidade da aprovação da anistia ao caixa 2 por parlamentares, medida que, na verdade, compreende uma série de condutas além dessa prática, levando especialistas a afirmar que, na prática, anistiaria práticas de corrupção e demais crimes semelhantes. O anúncio foi feito em coletiva que também contou com as presenças do Presidente do Senado Renan Calheiros e do Presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia.

Todo o debate sobre o caixa 2 gira em torno do projeto substitutivo proposto pelo Deputado relator Onyx Lorenzoni, que também alterou algumas medidas propostas pelo MPF, mas que foram muito criticadas, como o esvaziamento do Habeas Corpus e a admissão das provas ilícitas. Esse projeto será votado em primeiro lugar e, caso aprovado, substitui o original. Se for rejeitado, vota-se o original.

Desagrado de juristas ligados ao combate à corrupção

O jurista ligado ao combate à corrupção, Luiz Flávio Gomes, utilizou suas redes sociais para fazer um protesto contra a votação das dez medidas e inclusão da anistia ao caixa 2. Para ele, o anúncio pelos representantes do Executivo e Legislativo não significam vitória para o movimento – “Não podemos confiar neles. Claro que nós temos que continuar mobilizados, porque lá dentro do Plenário da Câmara e do Senado, esses deputados e senadores são capazes de tudo”.

“Todo dinheiro oriundo de crime estaria anistiado. Lavagem de dinheiro, o antigo caixa 2, evasão de divisas, corrupção passiva e ativa. A mídia não atinou para o texto, que trata de anistia absoluta, total. 99% dos crimes relacionados à Lava Jato são atingidos” – alertou o jurista sobre o pacote.

O Procurador da República Deltan Dallagnol também reclamou do conteúdo do projeto das 10 medidas que está sendo votado na Câmara. Na sua conta no Facebook, o procurador que também é garoto propaganda do projeto originalmente proposto, afirmou que “o substitutivo promove, a meu ver, um retrocesso na luta contra a corrupção. Há mais retrocessos do que avanços. Torna mais difícil lutar contra a corrupção, enfraquecendo as Instituições que têm corajosamente enfrentado esse grave problema brasileiro. Ele vira as costas para a esperança da sociedade depositada na melhoria das leis e dos sistemas”.

Deltan se queixou das baixas penas para a corrupção, de medidas que visam responsabilizar juízes e procuradores na forma semelhante de um processo de impeachment, e da redação do crime de caixa 2. Além dele, uma série de juristas também se queixaram, como integrantes da Associação de Juízes Federais (AJUFE) e da Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR). Entre as críticas, percebe-se a insatisfação e revolta no que viraram as medidas originais: uma farsa.

O Autoritarismo das medidas

De outro lado, pontos que são pouco ou nada discutidos do projeto substitutivo das 10 medidas arrepiam juristas ligados aos direitos humanos, os quais defendem que, ainda que a anistia do caixa dois seja deixada de lado, a aprovação do pacote seria uma catástrofe no processo penal brasileiro e pode sem dúvidas ser um catalisador no nível de encarceramento no país, que já é um dos mais altos do mundo.

Uma das maiores preocupações é a importação do plea bargain, o instituto norte-americano em que a acusação negocia a pena com o acusado em troca da confissão. Essa medida foi responsável por condenar um número incalculável de inocentes e tornou a nação a mais encarceradora do mundo. “Lá a maioria dos estudiosos percebeu que não deu certo, aqui querem importar essa fórmula ineficaz e perversa”, avaliou o Juiz de Direito Rubens Casara.

Para o Advogado Criminalista Antônio Pedro Melchior, a aprovação do plea bargain seria “o fim do Processo Penal como exercício da jurisdição, porque a gente sabe como essas negociações entre acusado e MP funcionam” – argumenta.  

Já a Advogada Criminalista Maíra Machado se assusta com a criação de comissões para apuração de corrupção fora do espectro dos órgãos de acusação brasileiros, como uma reedição do setor da ditadura militar responsável por macartismo e perseguição de funcionários dentro do serviço público – mais uma proposta absurda em nome da guerra anti corrupção. Essa proposta, ao que parece, Reintroduz o Serviço Nacional de Informações – SNI, mas de modo melhor estruturado”.

Especialistas frisam que o projeto original já havia sérios riscos à Constituição e à população mais fragilizada, mas, embora esse substitutivo tenha corrigido alguns erros grosseiros, seus recortes tornaram a proposta tão danosa quanto as que saíram do forno do Ministério Público Federal. Neste lado, pelo cenário político apresentado, juristas vêem-se diante do autoritarismo.

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