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Entre a esbórnia e a barbárie: amigos no golpe, judiciário e legislativo não falam mais a mesma língua

Por Luis Felipe Miguel, em seu Facebook Ao contrário do que prega o senso comum (alimentado dia sim, dia também pela mídia), não acredito que aquilo de que o Brasil mais precisa, hoje, é de uma cruzada contra a corrupção. A corrupção é um problema sério, mas há outros problemas ainda mais sérios. O foco […]

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Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa ordinária. Mesa: senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM); presidente do Senado Federal, senador Renan Calheiros (PMDB-AL); senador Jorge Viana (PT-AC) Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Por Luis Felipe Miguel, em seu Facebook

Ao contrário do que prega o senso comum (alimentado dia sim, dia também pela mídia), não acredito que aquilo de que o Brasil mais precisa, hoje, é de uma cruzada contra a corrupção. A corrupção é um problema sério, mas há outros problemas ainda mais sérios. O foco na corrupção sempre contribui para rebaixar a compreensão da política, apagando os conflitos de interesses entre grupos sociais e substituindo-o pela luta entre bons e maus. Também contribui para legitimar medidas autoritárias, que acabam, naturalmente, atingindo muito mais do que apenas os “corruptos”, reais ou pretendidos.

Não custa lembrar: o combate à corrupção era um tema central no autodiscurso dos golpistas de 1964.

Dito isto, sou obrigado a concordar com Renan Calheiros quando ele diz que as tais “dez medidas” propostas pelos procuradores só teriam lugar num regime fascista. Restrição ao habeas corpus, cassação de registro de partidos, admissibilidade de provas obtidas por quaisquer meios, vantagens pecuniárias a alcaguetes, emboscadas a funcionários públicos, transformação de delitos em “crimes hediondos”, extensão ao infinito do instituto da prisão preventiva… Não são medidas que possam se adequar a uma sociedade democrática. E é pior ainda quando sabemos que polícia, ministério público e judiciário estão orientados a agir seletivamente, contra alguns grupos e partidos e não contra outros.

Imagino que a oposição de Renan às “dez medidas” se dê por razões diferentes das minhas. O que é o lado interessante da situação hoje: há uma fissura na coalizão golpista. Um embate entre o grupo que ocupa as posições centrais de poder (chamado aqui de PMDB, por economia de palavras) e o grupo que fornece a pretensa legitimação moral e popular para o golpe (a Lava Jato). No meio do caminho, o PSDB, que pela prudência deveria buscar conter a sanha anticorrupção (uma vez que é um dos partidos mais corruptos do Brasil), mas que tem contado com a leniência da Lava Jato e vê uma oportunidade de ficar com os espaços de poder que hoje estão com o PMDB. O risco é que, afastado o PMDB, pelo menos uma parte da Lava Jato decida levar às últimas consequências seu messianismo e passe a atingir também o tucanato.

O horizonte da Lava Jato é um Estado policial, com características que apontam para o fascismo. O projeto do PMDB é continuar com a esbórnia. Eu diria que, entre o fascismo e a esbórnia, prefiro ficar com a esbórnia, mas isso é só uma frase de efeito. Acho que o principal é que a gente entenda que não precisamos tomar lado nessa briga. Que não devemos aceitar esse enquadramento da disputa política. Nosso lado é outro, é o lado da rua, contra as medidas antipovo que estão sendo levadas adiante com o apoio de todos eles: PMDB, PSDB, Ministério Público, Judiciário. Esse corte divisório é muito mais central que o que se refere ao pacote anticorrupção.

*Luis Felipe Miguel é Professor de Ciência Política na UnB

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