O projeto do governo para amordaçar o servidor público

(Foto: Romero Jucá e Aloysio Nunes, principais lideranças do governo Temer no Senado | Foto: Pedro França / Agência Senado / Divulgação)

O blog Poder 360 publicou, há pouco, a íntegra do projeto de lei do governo federal para impor novas regras em greves do serviço público. Eu publico o documento ao final desse post.

Algumas delas, diz o blog, “tem alto potencial para provocar conflitos com sindicatos”, e dá alguns exemplos.

  • Desconto dos dias parados –exceto se a paralisação for motivada por atraso nos pagamentos;
  • Possibilidade de grevistas perderem cargos ou funções comissionadas;
  • Só servidores públicos efetivos poderão fazer greve –seria vedado a servidores em estágio probatório, por exemplo;
  • Ampliação dos contingentes que devem permanecer trabalhando em caso de greve;
  • Responsabilização administrativa, cível e criminal para quem coagir colega a participar de greve;
  • Contratação de empresas terceirizadas para evitar a interrupção dos trabalhos.”

Eu não sou totalmente contra a criação de limitações ao direito de greve no serviço público, mas acho que medidas como essa deveriam ser discutidas democraticamente com sindicatos e com a sociedade, e que deveriam vir acompanhadas de compromissos, estabelecidos em lei, sobre o cumprimento de acordos entre governo, servidores e sindicatos, transparência orçamental, plano de carreiras e, sobretudo, criação de mais espaços de diálogo entre governos, servidores e sindicatos.

As iniciativas do governo estão vindo todas com muito autoritarismo. Esse projeto do governo, por exemplo, mais parece uma tentativa de amordaçar o servidor público do que um esforço real para ordenar e regulamentar o direito de greve.

Veja a lei do ensino médio. Após o maior protesto da história, de estudantes e professores, contra o projeto de lei, o senado simplesmente ignorou tudo e a aprovou, sem o mínimo respeito aos que serão mais atingidos por ela. A imprensa corporativa, como sempre, ficou ao lado do governo. A imprensa chapa-branca brinca de fazer denúncia, de “apoiar a Lava Jato”, mas está invariavelmente ao lado das reformas autoritárias propostas pelo governo.

De qualquer forma, os servidores que apoiaram o golpe ainda vão se arrepender muito.

Eu descobri um estudo recente da FGV sobre o perfil do servidor público, e é incrível a valorização salarial do servidor após a chegada do PT ao poder. Olhem esse gráfico, da FGV, com a evolução do salário médio anual de todos os servidores públicos do país.

Além disso, a era petista assistiu a uma recomposição extraordinária do Estado, que estava sem médicos, enfermeiros, professores, policiais, engenheiros. O volume de contratações, em todos os níveis, assistiu a um enorme crescimento. E aí eu noto um problema no estudo da FGV. Como não faz comparações com outros países, o leitor do estudo poderá achar que houve um “exagero” nas contratações. Não houve. O número de servidores por mil habitantes no Brasil ainda é baixo se comparado com outras nações emergentes e mais baixo ainda se comparado com países desenvolvidos.

Observe ainda que é uma falácia a acusação de que os governos petistas “incharam” o Estado. A esfera federal foi a que menos contratou gente. Na verdade, a quantidade de servidores federais por mil habitantes se manteve estável por toda a era petista. O crescimento maior veio das prefeituras, as principais beneficiadas pela melhora da economia causada, segundo inúmeros estudos, pelos programas sociais e pelo aumento de salário mínimo. O apoio das prefeituras, e mais ainda, dos servidores municipais, ao golpe, portanto, foi um tremendo suicídio político e econômico cujo preço, altíssimo, já começaram a pagar.

Por fim, vale olhar esse outro estudo da FGV, sobre a remuneração média dos servidores nas diferentes esferas. Observe que há um desequilíbrio absurdo nos níveis salariais, com profunda desvantagem para os servidores do Executivo (enfermeiros, professores, médicos, engenheiros). Ou seja, essa lei para coibir o direito à greve vai prejudicar fundamentalmente esses setores mal remunerados do funcionalismo.

As castas, como já ganham os mais altos salários do mundo, não serão afetadas por nenhum proibição do direito de greve.  Uma das bandeiras democráticas mais importantes a ser defendida pela sociedade é reequilibrar os níveis salariais do serviço público, e isso exigirá, necessariamente, cortar mordomias e salários do judiciário, e elevar o rendimento de professores, policiais militares e enfermeiros.

 

Abaixo, o projeto de lei, de autoria do senador tucano Aloysio Nunes, para limitar o direito de greve do funcionário público.

 

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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