As certezas de todos nós: parte I – a onisciência da direita

Foto: Vaso grego – o semideus Hércules lutando contra o monstro Hidra

Este é o primeiro de três textos em que pretendo discutir a conjuntura atual e a situação que nos encontramos face às eleições de 2018.

Começo este artigo, de maneira, quem sabe, pretensiosa, com a frase de Sócrates que, nos próximos dias, minha filha terá que desmiuçar para a matéria ‘teoria do conhecimento’: “só sei que nada sei”.

Mas talvez nestes mundos de manipulações e atuações cibernéticas, a dúvida seja o que está nos faltando – a todos.

A Onisciência da Direita

A direita é tão convicta de suas ideias que não se importa de quebrar as regras do jogo, quando elas não a interessam, para impor o seu ponto de vista.

E se tivesse mais humildade e menos certeza não se encontraria neste impasse e na necessidade de implodir o Brasil, como anda fazendo.

Sim, porque foi a convicção de que o povo brasileiro é bobo e burro que a levou a achar que ganhariam a disputa de narrativas.

Foi isso que fez com que ela surfasse na onda da corrupção, atiçando a população contra o PT, tentando fazê-la acreditar que a corrupção tinha partido.

Foi a certeza do convencimento que a levou à desesperada “solução pelo o impeachment”, acreditando que a deposição de Dilma seria suficiente para ‘estancar a sangria’, virar o jogo, e que se Dilma fosse deposta e Lula tachado de corrupto e criminoso o povo correria para os braços da direita.

Foi a certeza e arrogância da direita, que uma vez dado o Golpe, não importando o motivo, ela se pôs a destruir o arcabouço social fragilmente consolidado nos 12 anos de PT no governo e ainda foi além, destruindo também a Constituição de 1988 e o que vinha desde Vargas.

Foi certeza e arrogância que a fez, e a faz, acreditar piamente em suas ideologias (menos Estado, mais mercado; que a economia é uma ciência exata; que a globalização afeta a todos igualmente, etc.).

E tão convencidos estão seus adeptos por suas ideologias que precisam implementá-las na marra, num momento de ‘suspensão democrática’ (uma oportundade única, alguns clamam!), enquanto parte considerável dos brasileiros se encontram (ainda?) em estado de ‘suspensão de descrença’, desejando acreditar que ‘o PT é o partido mais corrupto’; o governos petistas ‘destruidores do Brasil’; e que ‘o impeachment ocorreu dentro da lei’, entre tantas outras ilusões necessárias para viabilizar a tragédia política brasileira.

E como estamos vendo, estas ‘certezas’ não levaram nem ao que eles esperavam e tampouco a alguma solução política ou econômica para os chamados ‘problemas’ do Brasil.

Porque, se a esquerda errou, se não tinha força suficiente para desarmar este jogo, a direita também perdeu: não conseguiu impor suas mentiras e ideologias – nem por força.

O erro estratégico foi tão profundo, que agora se encontram completamente perdidos para as eleições dentro de alguns meses, pondo todos nós em risco de ver Bolsonaro presidente.

E pior, se afundaram tanto que, como Macbeth, a única saída parece ser contiunar pelo caminho nefasto pelo qual se enveredaram.

Reiterando: se o golpe tivesse dado certo, a direita teria alta popularidade e estaria em boas condições para disputar as eleições de outubro – seja esta direita quem for, MDB (que até teve que se distanciar de si mesmo, tentando nos iludir que é o mesmo partido da incipiente democracia brasileira), PSDB, Dem ou a profusão de pequenas siglas fisiológicas e socialmente conservadoras.

Mas, até agora, fora a destruição (ainda parcial) do Brasil, só conseguiram criar o ‘Monstro’ Lula.

Porque Lula está ficando cada vez mais imbatível, parecendo aqueles monstros horríveis de desenho animado japonês ou da mitologia grega, que quanto mais se atira, mais se fere, mais se corta, mais ele volta, inteiro, grande, com várias cabeças ou em inúmeras multiplicações.

A direita está precisando mesmo de um semideus – sem fraquezas no calcanhar – para atingir com a sua espada o exato lugar que fará o Monstro Lula virar pó (e esse parece não ter sido Moro).

Mas apesar da vida não ser tragédia grega, como disse Wanderley dos Santos, infelizmente, Lula não tem mais o direito de ser simplesmente ‘humano’ – livre ou preso, nas eleições ou fora.

Empresto as palavras de Fernando Horta:

Lula caminha para seu destino. Destino, que, como disse Wanderley em tom desesperado, “ninguém sabe qual é”. Ninguém, nem a direita. Nem os fascistas e nem mesmo o judiciário. Lula neste momento cumpre 4 papéis: (1) mantém-se como alvo das ilegalidades e assim escudo de toda a esquerda, (2) causa consternação e dúvida em todas as esferas do golpe, (3) mantém acesa as esperanças de ação política dos mais pobres (evitando a alienação política por desilusão) e (4) aumenta exponencialmente os custos das arbitrariedades”.

Em outras palavras, Lula cumpre um papel que vai muito além do homem político que deveria ter o direito de disputar as eleições simplesmente porque ele representa os anseios de boa parte da população.

No próximo texto, é exatamente disso que eu pretendo tratar – a difícil relação das esquerdas (e suas certezas) com Lula’.

Mariana T Noviello:
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