Haddad X Ciro: O Brasil não é para amadores

O BRASIL NÃO É PARA AMADORES: SOBRE CIRO E HADDAD

Por Tiago Tavares

Tenho grande respeito por toda estratégia de evitar que nosso país caia em um desastre que é uma candidatura cercada de autoritarismo e simpatia por desmonte do Estado enquanto prestador de serviços públicos (pois como financiador de banco e grandes empresas não há qualquer objeção). Assim, todas as campanhas com essa intenção merecem consideração, embora críticas sejam necessárias. O momento é de refletir com calma. Segue a minha percepção da nossa situação como tentativa de colaborar com o debate aqui.

Há muitos pontos nebulosos nessas avaliações, alguns fruto de confusão conceitual, outros de análises apressadas e outros por má-fé no intuito de colher proveito político. Estamos em situação delicada e não há espaço para infantilidades. Cenário: um candidato com traços fascistas e política econômica de redução dos serviços públicos que é o Bolsonaro; uma candidatura com discurso desgastado e em franca decadência que é a Marina; um candidato da Lava Jato que já está saindo de moda que é Alvaro Dias; Alckmin e o desmoronamento tucano pelo discurso de antipolítica que eles mesmos ajudaram a criar; Boulos mais ao espectro da esquerda e Amoedo com um liberalismo moralista; Algumas outras candidaturas ainda menores com nomes razoavelmente sérios (João Goulart Filho e Vera Lúcia) e outros nem tanto, como Eymael e Cabo Daciolo, embora rendam bastante diversão.

Afunilando a questão: por vários motivos que não cabe elencar temos Bolsonaro na frente, em segundo Ciro Gomes e em quarto Haddad, com potencial para alcançar Ciro pela homologação de seu nome como candidato. Bolsonaro, Ciro e Haddad, eis a questão!

Seria Haddad uma opção viável para deter o candidato caricato, um misto de militarismo conservador com ideias de reduzir o Estado (na parte que interessa ao povo, cabe colocar)? Haddad tem a seu favor uma base social, como sindicatos e movimentos sociais. Quanto isso representa da população? Menos de 1%. Lula, o maior líder brasileiro tem muitos votos, mas tais votos não se transformaram em mobilização massiva diante de sua prisão, como ocorreu com Hugo Chavez em 2002. Lula tem muitos votos, mas não tem (nem ninguém no Brasil) uma base social organizada com a proporção necesária para evitar, por exemplo, um golpe parlamentar. Com relação aos votos, vamos lembrar que Haddad é acadêmico e paulista e Lula nordestino e operário, perfis bem diferentes. Se o brasileiro votasse com a cabeça da classe média universitária não elegia simultaneamente Dilma e figuras como Eduardo Cunha, ou seja, Haddad não é Lula. Isso não quer dizer, como já apontei, que não haverá transferência, mas ela não é total nem automática.

Mas o que mais interessa é: sendo possível a ida de Haddad ao segundo turno e considerando como tudo indica que Bolsonaro estará nele, ela é viável? Seria o melhor nome contra Bolsonaro que Ciro Gomes? Parece claro que não pelos motivos abaixo: 

1-O MP já entrou com ações contra Haddad, mostranto que o antipetismo ainda tem balas na agulha e poderão e deverão ser usadas no segundo turno (como a delação de Palloci);
2-Haddad não ganhou em São Paulo mesmo no cargo, o que o torna alvo fácil do adversário, pois deverá perder muito tempo explicando a situação (mesmo sendo verdade);
3-Ciro foi eleito e reeleito e tem grande aprovação em seu Estado;
4-Os partidos do chamado “centrão”, mesmo que pra valorizar o passe, dialogaram com Ciro e podem apoiá-lo no segundo turno, coisa praticamente impossível com Haddad;
5-Dilma, com mais partidos que Haddad teve seu governo sabotado. Com Haddad outro golpe seria praticamente um caminho natural;
6-A grande mídia tem maior temor contra Haddad, que está com o debate do controle social da imprensa (tem seu lado positivo, mas a hora é de evitar o pior, pragmatismo que o PT sempre defendeu quando o favorecia);
7-As pesquisas indicam que a rejeição de Haddad é bem maior que a de Ciro em todas as pesquisas;
8-Os votos de Marina migram para Ciro e não pra Haddad, basta ver seu tom de mágoa com relação ao PT (se tem ou não razão é outro ponto);
9-A própria Marina tende a apoiar Ciro, mas talvez fique neutra com Haddad;
10-A transferência dos votos de Alckmin é bem maior pra Ciro que pra Haddad, pois o tucanato é antipetista;
11-Ciro também pode usar a imagem de ter colaborado no governo Lula, pois ocupou um ministério e coordenou a maior obra física da era PT, a transposição do Rio São Francisco;
12-Uma candidatura que consiste em dizer que o candidato não é ele mesmo, mas outra pessoa, está fadada ao fracasso. Haddad não está associando sua imagem à de Lula, mas querendo se confundir com ele numa perigosa estratégia de marketing. Isso agravado pelo fato de a outra pessoa está presa e considerada culpada por uma parcela da população (mais uma vez trato aqui como um fato político, sem julgamento de mérito, literalmente).

Os problemas não acabam por aí. Um eventual governo Haddad teria muito mais possibilidade de desestabilização que um de Ciro Gomes, mesmo que Haddad tenha mais base social. A base social do PT não impediu o golpe de Dilma, não impediu a condenação de Lula, mas magicamente, agora, tudo mudou. Ciro tem, mesmo conflitando, mais abertura na política, empresariado e grande mídia que Haddad e essa é a jogada possível.

É uma irresponsabilidade mergulhar em clubismo nessas circunstâncias, em defesas apaixonadas e esquecer a realidade batendo na porta: voto não é base social; Dilma com muito mais apoio foi sabotada; grande parte do povo brasileiro enxerga quem cumpre pena como culpado, etc. A hora é de evitar o pior via eleitoral, o que não impede mobilizações de outra ordem, isso é uma falsa dicotomia. Sejamos estratégicos e vamos de 12!

Tiago Tavares é trabalhador da UFRN como historiador, doutorando em ciências sociais pela mesma Universidade.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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