Uma treta suave com o The Intercept Brasil

Sérgio Moro em Palestra para Veja

A Vaza Jato tem mostrado uma força crescente, pautando o país cada vez mais, por isso, parei para refletir sobre ela um pouco e me ocorreu uma certa discordância.

Aqui vai um resumo, para aqueles e aquelas muitas que vão ficar por aqui no texto (até mesmo eu, quando for ler daqui a alguns anos): respeito e admiro muito o trabalho do The Intercept Brasil e quero apresentar aqui, humildemente, algumas ponderações sobre a dinâmica da Vaza Jato. Basicamente, me preocupa a assimetria com que a disputa da narrativa se dará a medida que a Lava Jato é desnudada, afinal, Veja e Folha, parceiros antigos da operação, sempre foram entusiastas dos resultados de Moro, Dallagnol e cia. 

Para os que continuaram, primeiramente, muito obrigado. O texto é legal e respeitoso, prometo.

Em segundo lugar, penso ser importante aprofundar sobre três premissas: a primeira que a Lava-Jato pauta o país há anos é uma dos grandes atores a política nacional (feat Mônica Bergamo) e a segunda (feat Repórteres Sem Fronteira), que Brasil tem uma das mídias mais concentradas do mundo

A terceira (feat Jânio de Freitas), resultado da análise das outras duas: sem ajuda da mídia tradicional, como a Folha e a Veja, a Lava Jato – tão autoritária e sombria – não conseguiria chegar aonde chegou.

É preciso dizer que a imprensa, incluído o telejornalismo, foi contribuinte decisivo nas ilegalidades encabeçadas por Sergio Moro. Aceitou-as, incensou-o, procurou tornar o menos legíveis e menos audíveis as deformações violadoras da ordem legal e da ética judiciária. Os episódios de transgressão sucederam-se, ora originários de Moro, ora do ambiente de fanatismo imperante entre os procuradores.

Jânio de Freitas, “Delinquência múltipla” (A imprensa e a Justiça aceitaram e incensaram as condutas de Moro e Deltan)

Ou seja, Folha e Veja, ao não permitirem o pluralismo de ideias foram cruciais para o surgimento de Lava Jato autoritária. Justamente esses veículos, agora, vão entregar a população uma visão sobre a Vaza Jato. É complicado, convenhamos.

Pegamos, por exemplo, a matéria da Veja sobre a Vaza Jato, aparentemente a primeira da série. Juntamente com seu furo, a revista escreve:

VEJA não faz parte dessa polarização que tanto empobrece a discussão política no país. Nosso objetivo é justamente buscar o equilíbrio, a razão, elevar o nível do debate

Revista Veja, carta ao Leitor: Sobre princípios e valores

Depois de anos de antijornalismo, inclusive para sustentar a Lava Jato, ver a Veja utilizar os holofotes da própria Vaza Jato para mentir que é isenta é um sapo difícil engolir.

Para ilustrar: em 2013, a revista dos Civita (uma das vozes monocráticas que pautavam o país segundo relatório do Repórteres Sem Fronteiras daquele ano), escolhia um jovem das ruas como “cara” das jornadas de junho. Maycon Freitas, um jovem apolítico que era adepto da frase “Bandido bom é bandido morto” e achava que “Direitos humanos é o caralho”, como bem lembrou o saudoso Paulo Nogueira, do Diário do Centro do Mundo.

A revista Veja, que semeou esse conservadorismo protofascista que sustenta ideologicamente a Lava Jato, agora tem em mãos o dever social de informar o país contra essa mesma operação. Duvidar dela é o mínimo que podemos fazer.

Além disso, pelo o que entendo da nossa realpolitk, nesse momento Folha e Veja estão planejando passo a passo os próximas cenas do cenário nacional. Vão participar diretamente do enfrentamento à crise política e econômica que vivemos, tendo em mão um acervo que pode mudar a história da República.

Gostaria reiterar aqui meu respeito ao trabalho realizado pelo The Intercept Brasil. Apresento essa opinião aqui de boa, sem a intenção de ofender ninguém e com o máximo de respeito às pessoas que estão realizando esse feito histórico.

Até aqui, a minha percepção é de que a verdade profunda por trás da Lava Jato, aquela que fez de Moro um popstar e um alucinado como presidente da República, não será analisada pela mídia tradicional. A confiança no Intercept, apesar de suavizar bem essa treta não é suficiente para suprimir essa dúvida.

No mais, um abraço a todos e todas que ficaram até o final! :)

E para aqueles que têm a mania de pular o texto todo e procurar uma conclusão no final – tipo eu – queria deixar aqui de novo meu respeito ao trabalho do Intercept e dizer a Vaza Jato por si só é um alento, uma suspiro de democracia num país caminhando para o autoritarismo. Entretanto, penso que o problema da Lava Jato tem raízes bem mais profundas e o Brasil merece analisá-las com isenção. Acredito, também, que Veja e Folha não têm prestígio para conduzir uma investigação verdadeiramente democrática, afinal, até outro dia eram devotas incondicionais da operação, a ponto de serem complacentes com as ilegalidades agora provadas. Por fim, externo preocupação com a democratização das informações sobre a Vaza Jato.

Tadeu Porto: Petroleiro e Secretário adjunto de Comunicação da CUT Brasil
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