Lula é presidente

omício de Lula na Zona Sul de São Paulo. 24 de setembro. Foto: Ricardo Stuckert.

Depois de uma intensa quarta-feira que entrará para a história e para as discussões das faculdades de ciências políticas, o governo Lula conseguiu, dentro do possível, a estrutura ministerial idealizada no início do ano.

Com uma conjuntura política que mudou drasticamente num intervalo de duas horas, Arthur Lira (PP-AL), que foi colocado quase como um primeiro-ministro, se viu acossado por decisões desfavoráveis no Supremo Tribunal Federal.

Depois de levar uma porta na cara do presidente da República, Lira percebeu que o seu trem havia descarrilado. Não por menos, correu para dizer que, caso a Medida Provisória Ministerial caducasse ou não fosse aprovada, não seria culpa do Congresso. Ele sabia que, caso a MP não fosse aprovada, isso também traria problemas para ele, por isso disse que não seria culpa do Congresso.

Até as 19 horas da noite da quarta-feira (31), deputados da base e da oposição davam quase como certo o naufrágio da MP, só que por volta das 21 horas, o jogo virou. O que mudou? A política é feita de gestos.

Lula acertou em não receber Lira no Planalto, o deputado queria colocar de vez o governo de joelhos, mas não conseguiu.

Veja também: A oposição é o centrão

O presidente da República pode até não ter conversado com o presidente da Câmara, porém, Lula conversou com os líderes do Congresso, do Senado e liberou emendas sem intermédio de Lira.

A mensagem foi clara: não abandonamos a presidência como Jair Bolsonaro e ainda temos a chave do cofre, não deixamos ela com você. A política é feita de gestos e sinais e este foi bem claro: o governo não aceitará intimidação. De certa maneira, Lula impôs limites.

Começaria ali um verdadeiro calvário de humilhações para Lira que, primeiro, viu o Ministro Dias Toffoli colocar para votação um caso que o torna réu por corrupção passiva, depois viu uma ação sua contra seu inimigo, o senador Renan Calheiros, ser suspensa também pelo STF.

Por fim, Lula, que aguardava o momento ideal para indicar o nome do advogado Cristiano Zanin para o Supremo, decidiu que amanhã isso será feito. Ou seja, um recado claro. Se o momento não fosse favorável, por qual motivo Lula indicaria Zanin amanhã depois de um dia conturbado como a quarta-feira? Isso logo após as decisões no STF?

Porém, a verdade precisa ser dita! O governo federal precisou mobilizar um efetivo colossal de recursos e pessoal para desfazer o imbróglio na Câmara. E tudo isso para conseguir aprovar a configuração ministerial, agora corriqueira e banal em outros mandatos.

A vitória do governo acende um verdadeiro farol de alerta sobre quais devem ser seus próximos passos. Afinal de contas, sempre que o governo precisar aprovar alguma matéria, será esse Deus nos acuda? O governo tem munição para outras escaramuças do tipo? E Lula na articulação? Até o momento, embora seja uma promessa do Planalto, não há nada concreto sobre isso.

E, por mais que o governo fosse vítima de uma chantagem das mais hediondas, por muitas semanas agiu mais como incendiário do que como bombeiro neste incêndio.

A base do próprio PT enfrenta crises de desconfiança e decidiu partir para a defesa incondicional do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que acreditam ser vítima de sabotagens internas de gente do Planalto. Ou seja, há uma quinta-coluna dentro do governo?

Além disso, durante uma reunião da bancada petista nesta quarta-feira (31), deputados reconheceram que as estratégias de 20 anos atrás não vão funcionar e que as dinâmicas no Congresso foram drasticamente pervertidas com a entrada do extremismo de direita.

O governo ainda tem uma longa caminhada, mas pelo menos hoje Lira aprendeu uma importante lição:

Lula não é Bolsonaro. Lula é presidente.

Cleber Lourenço: Defensor intransigente da política, do Estado Democrático de Direito e Constituição. | Colunista n'O Cafézinho com passagens pelo Congresso em Foco, Brasil de Fato e Revista Fórum | Nas redes: @ocolunista_
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