Em um dos dias mais conturbados do Congresso Nacional nos últimos anos, líderes da oposição contornaram o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e buscaram apoio direto de Arthur Lira (PP-AL), ex-presidente da Casa, para negociar a normalização das atividades legislativas. O movimento ocorreu em meio à ocupação do plenário por parlamentares bolsonaristas, que paralisou os trabalhos por tempo indeterminado.
Segundo informações publicadas pela jornalista Andréia Sadi, do portal g1, ao menos cinco líderes de partidos oposicionistas participaram de uma reunião na sala de Arthur Lira com o objetivo de encontrar uma solução política para a crise. O gesto evidenciou a fragilidade de Motta na condução da Câmara e consolidou Lira como principal interlocutor político do grupo que domina a oposição.
Durante o encontro, foi costurado um acordo que prevê, entre outros pontos, a inclusão da chamada “proposta das prerrogativas” na pauta de votações já na próxima semana. O texto, ainda em fase de ajustes, busca restringir a possibilidade de investigações contra parlamentares, exigindo autorização prévia do Congresso Nacional. A proposta é defendida por setores da base bolsonarista que reivindicam maior proteção legal para os membros do Legislativo.
Outro ponto do acordo prevê alterações nas regras do foro privilegiado, atualmente sob competência do Supremo Tribunal Federal (STF). Pela proposta discutida, essa competência seria transferida a instâncias inferiores do Judiciário. A medida vem sendo debatida há anos por setores críticos ao papel desempenhado pelo STF, especialmente em processos envolvendo políticos.
Embora a proposta de anistia aos envolvidos nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro continue sendo defendida por deputados ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro, o tema foi deixado de fora do acordo neste primeiro momento. No entanto, líderes da oposição indicaram que a pressão pela votação do projeto seguirá como prioridade na agenda política do grupo.
O entendimento entre os parlamentares só foi possível após a mediação de Lira. Fontes ouvidas pela coluna de Andréia Sadi relataram que Hugo Motta só conseguiu retomar o controle do plenário após o aval do ex-presidente da Câmara. A negociação coordenada por Lira reverteu parcialmente o impasse e permitiu o reinício dos trabalhos legislativos.
Um deputado bolsonarista, sob condição de anonimato, resumiu o clima entre os oposicionistas com uma metáfora: “O café de Motta é frio e o de Lira sempre foi quente”, em alusão à diferença de capacidade de articulação entre os dois parlamentares. A frase circulou entre aliados e foi vista como um indicativo do retorno informal de Lira à liderança política da Casa, mesmo sem ocupar a presidência.
O episódio revela o esvaziamento da autoridade de Hugo Motta, que assumiu a presidência da Câmara após o fim do mandato de Lira. Desde então, tem enfrentado resistências internas e dificuldades em formar maioria para avançar com pautas sensíveis. A crise mais recente expôs de forma pública essas dificuldades, ao mesmo tempo em que reabilitou a influência de Lira no comando de bastidores da Casa.
Fontes próximas ao atual presidente da Câmara afirmam que ele está ciente da pressão e busca preservar os canais de diálogo com todos os blocos parlamentares. No entanto, a expectativa agora se volta para o cumprimento dos compromissos firmados durante a negociação conduzida por Lira. A fidelidade a esses acordos poderá determinar a estabilidade dos próximos dias no Legislativo.
A movimentação ocorre em um momento de tensão crescente entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, especialmente após decisões envolvendo parlamentares aliados de Jair Bolsonaro. O avanço de propostas que buscam limitar a atuação do STF está sendo monitorado por ministros da Corte e deve ser tema de novas disputas entre os Poderes.
Apesar do recuo momentâneo da pauta da anistia, integrantes da oposição indicam que a mobilização nas ruas e nos corredores do Congresso continuará. A pressão sobre o presidente da Câmara e os líderes partidários será mantida, com foco na votação de matérias que ampliem as prerrogativas dos parlamentares e limitem o alcance de investigações judiciais.
Enquanto isso, o retorno de Arthur Lira ao centro das articulações políticas gera especulações sobre seu futuro político. Embora fora da presidência da Câmara, ele permanece como um dos principais operadores do centrão e tem influência decisiva sobre grande parte da pauta legislativa.
A crise escancarou o desequilíbrio de forças no Legislativo e colocou em xeque a capacidade de liderança de Hugo Motta, abrindo espaço para a reconfiguração do comando político da Câmara em plena vigência da nova legislatura.


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