BALA DE PRATA CONTRA PAES É “VÍDEO”… SEM VÍDEO

Publicado originalmente no Rio Política.

A cobertura política no Brasil fica mais surreal a cada dia que passa. Em especial, a da Veja. Depois do grampo sem áudio, da entrevista sem entrevistado, agora temos o vídeo… sem vídeo.

Só podia ser na Veja. Faltando pouco mais de uma semana para as eleições, a revista aparece com uma “bala de prata” contra Eduardo Paes.  O título da matéria de Lauro Jardim não poderia ser mais apelativo: “O mensalão de Paes”. Na capa, a foto de Paes deprimido e a chamada: “PMDB do Rio negocia apoio do PTN por R$ 1 milhão”.

Fomos conferir. São duas partes, uma com a denúncia e o “vídeo”. Outra com uma entrevista com Jorge Sanfins Esch, o homem cuja voz aparece mencionando a ajuda financeira do PMDB do Rio a seu partido.

Francamente, a Veja já aplicou balas de prata melhores. Esta é lixo puro.

Vamos analisar o caso:

  1. Não é um vídeo. É um áudio com uma foto estática. Ouve-se uma voz ao fundo mencionando supostas ofertas do PMDB. Não é uma reunião, porém, entre alguém do PMDB e PTN. É o áudio de uma conversa informal de alguns sujeitos do PTN, onde nem nome de Paes nem de ninguém é mencionado.
  2. Numa reunião informal, pode-se falar de tudo: que a Al Qaeda, Chávez e Farcs ajudam a campanha do adversário. Isso não vale nada. O que se pede, nesses casos, é: imagens de vídeo (vídeos verdadeiros, não foto estática do perfil de uma pessoa) mostrando políticos enfiando dinheiro em cuecas e meias, como foi o caso do mensalão do DEM em Brasília; a presença, em voz ou imagem, de uma figura do partido que oferece recursos, abordando oralmente a questão, de maneira suficientemente direta; ou documentos, como extratos bancários, etc. Um áudio com apenas o meu adversário (e neste áudio, os interlocutores xingam Paes: um diz que gostaria de dar “um tiro na cara” dele) falando mal de mim, não vale nada em termos políticos ou jurídicos.
  3. Confiram como é ridículo: “vídeo a que VEJA teve acesso com imagens do presidente estadual do PTN, Jorge Sanfins Esch”. As “imagens” de Esch é na verdade uma foto estática dele, obviamente montada, sobre um arquivo de áudio. A Veja falseia a realidade, com vistas a produzir um factóide, sabe-se lá com que razões (chantagem?), contra o atual prefeito.  Sabe que, nas redes sociais, as pessoas sequer lêem as matérias, apenas espalham as fofocas.
  4. Logo no início, o vídeo estampa a data de 15 de março de 2008. Ou seja, é um vídeo antigo pra cacildes. Se fala em eleição, é referente à 2008. A matéria nem menciona esse fato, que enfraquece totalmente a denúncia, por torná-la uma peça requentada, antiga.
  5. O presidente estadual do PTN, Jorge Sanfins Esch, sequer esconde que o motivo de sua insatisfação: ter perdido um processo trabalhista contra a prefeitura para receber R$ 800 mil. Ou seja, é um desesperado, manipulado ou pela Veja ou por adversários de Paes, como César Maia ou Garotinho.
  6. Paes tem 65% dos votos válidos, segundo o Datafolha. Um dos seus adversários é Rodrigo Maia, que está humilhado nesta campanha, em função de seu posicionamento absolutamente medíocre nas pesquisas de intenção de voto: 3%. César Maia e Garotinho são os padrinhos da candidatura de Maia. Razões para desespero e pessoas dispostas a qualquer coisa não faltam…
  7. Na segunda matéria, fala-se em “ajuda oficial” de um partido a outro, e a própria revista observa que isso não é ilegal. Ela deveria acrescentar que não apenas não é ilegal, como é praticamente obrigatório. Quando duas legendas se coligam, há troca de ajudas, financeiras ou de material de campanha. Isso é da democracia. A asserção da revista, de que o “problema, para o eleitor, é saber que a união entre PMDB e PTN é, acima de tudo, uma questão de dinheiro”, apenas chove no molhado. Há legendas de aluguel sim, no Brasil, e isso é um problema a ser combatido. Mas tanto legendas de aluguel quanto legendas “autênticas”, por assim dizer, recebem auxílios, oficiais, legais, dos partidos com os quais se coligam. Criminalizar isso e, pior, converter num escândalo às vésperas do pleito, constitui um exemplo clássico de “baixaria” eleitoral.

Observe a data no início do vídeo.

O que é lamentável é ver o famigerado “jornalismo fiteiro”, como se refere Alberto Dines, entrando na campanha eleitoral do Rio via Lauro Jardim, da Veja, na mesma coluna onde Cachoeira plantava o que queria. O caso irá inflamar o udenismo carioca. Poderá tirar votos de Paes na zona sul, cujo udenismo está à flor da pele por causa da cobertura do julgamento do mensalão.

 

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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