Colunista da Folha volta a chutar o pau da barraca!

O texto de Ricardo Melo, publicado hoje na Folha, é o começo do fim dessa farsa chamada “mensalão”. Primeiro porque ele destrói a ilusão da “unanimidade” em defesa da condenação dos réus da Ação Penal 470, que outros colunistas vinham mantendo junto a leitores desavisados. Não há esta unanimidade. As contestações públicas contra os erros da Ação Penal 470 são cada vez maiores, e provavelmente já é a principal polêmica no seio da comunidade jurídica brasileira. 

Miriam Leitão, por exemplo, em pleno domingão de carnaval, publicou uma xaropada melancólica, com objetivo disfarçado de atiçar mais um pouco a sanha linchatória abraçada pela imprensa, durante esses oito anos de cobertura do escândalo.

A sanha continua, com muita força, sobretudo nas mídias da Globo. Mas na Folha, por exemplo, há tempos que observamos fissuras. Primeiro com Janio de Freitas, que assinou prefácio do livro de Paulo Moreira Leite, onde se contra “uma outra história do mensalão”. E agora com Ricardo Melo, um colunista mais “de esquerda” que a Folha contratou há alguns meses, como contraponto à presença, também recente, de Reinaldo Azevedo, chamado de pitbull reacionário pela própria ombudsman da Folha.

É interessante notar que os argumentos de Melo foram pescados na blogosfera, não na mídia tradicional. Melo fala muito no inquérito 2474, mantido em sigilo por Joaquim Barbosa apesar de conter informações que poderiam ajudar a defesa dos réus.

Ricardo Melo só vê uma solução para a Ação Penal 470: começar tudo de novo.

Para ilustrar como é absurdo esconder provas e investigações, na contramão do direito moderno, que preza a transparência absoluta em relação a provas e documentos que possam inocentar réus de um processo, Melo dá um exemplo bastante simples. Imagine que, no meio de um julgamento de homicídio, uma outra investigação, paralela, descobre que a suposta vítima está vivinha da silva, e passando bem. Se o juiz fosse Joaquim Barbosa, ele manteria essa outra investigação em sigilo, alegando que ela poderia atrapalhar o “bom andamento” do julgamento?

Melo cita o caso Pizzolato justamente como um dos grandes prejudicados pela ocultação do Inquérito 2474, visto que ele continha inúmeras informações que poderiam ajudar em sua defesa, a começar pelas provas de que nunca foi ele, Pizzolato, o responsável por qualquer pagamento da Visanet às agências de Marcos Valério.

O Inquérito 2474 traz informações que permitiriam aos réus, de um lado, e aos próprios ministros do STF, de outro, entender melhor a conjuntura financeira por trás dos empréstimos do Banco Rural e BMG ao PT, e de como funcionava o Fundo de Incentivo Visanet.

A coluna de Melo revela também que o muro de concreto da mídia, sempre alinhada à acusação e à campanha de linchamento, começa a rachar. Talvez alguns estrategistas dos barões tenham percebido que é mais seguro não apostar todas fichas num golpe judiciário que já sofre tantas contestações públicas.

A derrota de Barbosa na votação do crime de quadrilha mostrou que uma nova maioria no STF poderá fazer sim, uma revisão criminal das sentenças do mensalão. Se o processo estiver errado, terá que ser refeito, independente das teorias midiáticas de que “o Brasil ficará decepcionado”. Há tempos que o Brasil real não é mais o Brasil da mídia.

O que vimos, sim, foi uma grande vitória da mídia em manipular as informações relativas ao processo do mensalão.

Fernando Rodrigues, em sua coluna de ontem, disse que o mensalão é uma “batalha perdida” pelo PT, porque a maioria dos brasileiros, incluindo os simpatizantes do PT, segundo Datafolha, apoiam a prisão dos condenados. Ora, isso mostra uma batalha perdida, mas não a guerra. A coluna de seu colega de jornal derruba tese de Rodrigues. Os brasileiros são a favor das condenações porque foram enganados.

Uma revisão criminal das sentenças gerará uma outra campanha, para denunciar a criação da atmosfera de linchamento político, a manipulação das informações, a truculência contra os próprios ministros que demonstravam qualquer hesitação em chancelar as teses defendidas pela mídia.

O Brasil precisará discutir em profundidade o risco à democracia que é termos um cartel midiático fazendo uma campanha violentíssima junto a um STF muito mais poderoso do que manda a prudência democrática.

Afinal, a nossa mídia foi a principal cúmplice, ou talvez mesmo uma das mentoras, da maior farsa política e judiciária da nossa história.

As contestações aos arbítrios da Ação Penal 470 irão desabar como um tsunami sobre a nossa mídia, que será acusada de cúmplice na criação de uma farsa política e judiciária.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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