Jean Wyllys detona “colunista” do Globo

Não sei a que colunista o deputado se refere, mas imagino que seja um sujeito da Veja que acha que descobriu um grande conceito, ao inventar a expressão “esquerda caviar”. O nome dele é Rodrigo Constantino.

Com seu discurso baseado numa inveja confusa contra uma esquerda imaginária, supostamente bem de vida, o tal colunista conseguiu reunir em torno de si um triste séquito de ressentidos, frustrados e fracassados. Boa parte deles, homofóbicos, racistas, com uma visão política de mundo que, fingindo-se liberal, é apenas fascista.

Pois é, deputado, é esse tipo de gente que Globo e Veja tem contratado para escrever colunas de opinião.

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Desonestidade intelectual

O movimento gay não é de esquerda nem de direita, nem os direitos humanos, nem os homossexuais. Há gays e lésbicas (e heterossexuais) de todas as ideologias, religiões, cores

Por JEAN WYLLYS, deputado federal (PSOL-RJ), no Globo
7/03/14 – 0h00

Em espaço no GLOBO, um colunista que diz que o caviar é de esquerda afirmou que o movimento gay não fala da lei homofóbica de Uganda. Lembremos: ela impõe pena de prisão perpétua para quem “introduzir o pênis no ânus ou na boca de outra pessoa do mesmo sexo” e também condena os heterossexuais que tiverem um conhecido gay e não o denunciarem. Segundo ele, isso ocorre porque o movimento gay é de esquerda e a esquerda não critica os africanos (?!).

O bizarro raciocínio é que “condenar os africanos pela homofobia não ajuda na narrativa de minorias vítimas do ‘imperialista’ branco do Ocidente”, já que a homofobia seria um traço cultural desses povos (?!); e criticá-la iria contra o multiculturalismo, que ele associa à esquerda e opõe ao liberalismo e, portanto, aos gays.

O colunista diz ainda que não me pronunciei sobre a lei de Uganda e acrescenta que as feministas não denunciam a opressão contra as mulheres nos países islâmicos, já que os multiculturalistas “defendem atrocidades em culturas diferentes para negar a superioridade ocidental”, e que, para nós (gays, multiculturalistas, esquerdistas, tudo junto e misturado), toda narrativa deve servir para “pintar o homem branco judeu ou cristão como o maior vilão”.

São tantos equívocos juntos que dá preguiça responder, mas vamos lá:

1 – O movimento gay não é de esquerda nem de direita, nem os direitos humanos, nem os homossexuais. Há gays e lésbicas (e heterossexuais) de todas as ideologias, religiões, cores e preferências musicais; e existem, no mundo inteiro, movimentos LGBT com as mais diversas identidades políticas;

2 – Desde que o projeto de lei do deputado ugandense David Bahati começou a ser tramitado, em 2009, organizações LGBT do mundo inteiro vêm realizando uma campanha internacional para denunciá-lo, e, desde que a lei foi promulgada pelo presidente Museveni, essa campanha se intensificou. Por exemplo, a organização All Out já recolheu mais de 300 mil assinaturas contra a lei;

3 – Claro que já me pronunciei sobre o assunto! Como me pronunciei também no caso da lei homofóbica russa, aliás;

4 – A lei de Uganda, como outras dos 38 países da África que criminalizam a homossexualidade, não provém de nenhum traço cultural africano, mas da herança colonial (a primeira norma antigay de Uganda copiava o artigo 377 do Código Penal da Índia, introduzido pelo Império Britânico: foram os britânicos que levaram as leis “antissodomia” às colônias) e, mais recentemente, da ação das igrejas evangélicas fundamentalistas dos EUA, que investem milhões de dólares para espalhar a homofobia na África e financiar as campanhas dos políticos homofóbicos (assistam ao documentário “God loves Uganda!”). E até onde sabemos, o império britânico e as igrejas evangélicas americanas fazem parte do Ocidente.

5 – Claro que muitos ativistas gays e feministas, eu inclusive, denunciamos a opressão contra mulheres e homossexuais nos regimes islâmicos! Isso não tem nada a ver com esquerda e direita! Será que o colunista pensa que a ditadura iraniana é socialista?;

6 – Já que o colunista diz que nós (gays, multiculturalistas e esquerdistas) somos contra o “homem branco judeu” (?!), recomendo-lhe ler minha última coluna na revista “Carta Capital”, onde falo do antissemitismo e da homofobia do chavismo — porque o preconceito também não é de esquerda nem de direita.

Mas a desonestidade intelectual virou tática desse colunista.

Jean Wyllys

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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