Greves e manifestações tomam conta da… França

Minha mulher está na França, para um trabalho. Ela me conta que, no país cuja principal fonte de renda é o turismo, e que recebe a maior quantidade de turistas do mundo, estão acontecendo, neste momento, greves de motoristas de táxi, de rodoviários, de controladores de vôo, etc.

Fosse aqui no Brasil, a imprensa ajudaria a propagar a ideia de caos. Na França, é um processo inerente à uma democracia onde seus trabalhadores estão sempre em luta por melhores condições de vida. Eles estão acostumados.

Ontem, passando pela Cinelândia, eu vi um monte de gente carregando cartazes em frente à Câmara de Vereadores. Pelo que entendi, era uma manifestação de engenheiros que tentam aprovar uma lei que beneficie a categoria. Uma das placas era um recado para o prefeito Eduardo Paes, dizendo que eles, engenheiros, tinham a solução para reduzir o atraso nas obras públicas.

Eu me senti em Nova York, cidade que já visitei uma vez, mas que conheço sobretudo através de filmes. Lembro de um, por exemplo, no qual a personagem volta à Nova York após um tempo fora; parada no táxi, observando uma manifestação política lá fora, ela fala sozinha: ah, como eu amo Nova York! Acho que foi Sex in the City, e a personagem era a voluptuosa e insaciável Samantha.

Claro que não quero ver greves se espalhando Brasil a fora, sobretudo em áreas essenciais do serviço público. Mas acho que a aparente instabilidade do regime democrático, com sua liberdade de greves e manifestações, aponta um futuro muito mais seguro, estável, feliz, do que a pasmaceira das ditaduras.

O problema é que o brasileiro tem uma visão do primeiro mundo exclusivamente turística. Ele viaja a Nova York, Miami ou Paris e conhece lugares bonitos, limpos e seguros, e não tem ideia de que aqueles mesmos lugares já foram sujos, miseráveis e violentos. Foi preciso muita luta, muita manifestação, muita greve, muita política, para mudar a situação.

Os cidadãos do mundo desenvolvido não melhoraram de vida reclamando em facebook. Não somente foram às ruas, como escreveram livros e fizeram filmes denunciando a mídia (uma tradição nos EUA) e a concentração de renda (uma tradição na Europa).

Tenho certeza que nós, brasileiros, iremos chegar lá, porque estamos trilhando o caminho certo. Os percalços políticos que enfrentamos perfazem a nossa experiência. Nossas angústias, nossas derrotas, nossos erros, tudo isso contará em nosso favor, porque são experiências que nos permitirão avançar mais fortemente em seguida.

Link de matéria no Le Monde sobre manifestações na França.

 

 

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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