A revolução será feminina

Por Pedro Breier, colunista político do Cafezinho

Para fechar este ano em que regredimos algumas décadas no tempo ao presenciar, boquiabertos, mais um golpe de Estado no Brasil, a Veja nos brinda com esta capa surreal.

Temos um governo golpista; com vários dos seus ministros envolvidos em graves escândalos – o que provocou a queda de nada menos do que seis em poucos meses; que, ao contrário do prometido, não dá nenhum indício de que vá reverter a crise econômica e o aumento do desemprego; que pretende o desmonte da parca rede de proteção social criada nos governos petistas; que já começou a dilapidar o patrimônio público, principalmente através da venda barata do pré-sal; e com os índices de popularidade roçando o chão.

A “grande cartada” deste governo tacanho para melhorar a sua imagem é, segundo a Veja, uma “agenda de aparições nacionais” da “jovem e bela primeira-dama”.

A chance disso dar certo é a mesma de que Gilmar Mendes respeite o código de ética da magistratura em 2017, e a própria reportagem da Veja confirma isso:

“Pelo perfil que o presidencialismo tem, mesmo uma primeira­-dama que tenha muito preparo e que seja muito querida não atinge mais que 5% da visibilidade do presidente. É uma posição muito mais decorativa do que qualquer coisa”, diz o cientista político Rubens Figueiredo.

A Veja insiste na abordagem da primeira dama à lá século XIX, colocando a mulher na posição de um enfeite para agradar a todos com sua beleza.

Usarmos até hoje a expressão “primeira dama”, aliás, é positivamente ridículo.

Mas vamos utilizar mais uma capa grotesca e anacrônica da Veja para fazer algumas previsões bastante otimistas para um futuro não tão distante.

O feminismo, a ideia ao mesmo tempo singela e poderosa de que mulheres e homens devem ter direitos iguais, encontrou na internet um campo fértil para sua propagação.

Através da internet as ideias feministas vêm atingindo cada vez mais adolescentes e jovens, o que acaba por desaguar em ações concretas. Por exemplo, o notável protagonismo feminino no movimento de ocupação das escolas contra os ataques do governo Temer à educação (duas reportagens sobre isso aqui e aqui).

Pois bem.

A tendência é que cada vez mais mulheres filiem-se ao movimento feminista. Afinal, quem apoia, em sã consciência, que seu gênero seja tratado injustamente em relação a outro?

Claro que há forças poderosas que tentam impedir a propagação das ideias feministas (o que produz o estranho fenômeno de mulheres não feministas e até antifeministas), especialmente uma mídia concentrada e reacionária e uma educação conservadora.

Uma mídia plural e democrática, que apresente à toda a população as ideias da igualdade, além de uma educação libertadora são, portanto, instrumentos essenciais para a luta contra o machismo.

Mas outro instrumento pode ser a própria evolução natural.

Explico: se a tendência é cada vez mais mulheres aderirem ao feminismo, a tendência inversamente proporcional é de que cada vez menos machistas conseguirão gerar descendentes, porque uma feminista rejeitará qualquer espécie de relacionamento com um, digamos, fã do Bolsonaro, em quase 100% dos casos.

Nos aplicativos de paquera é grande a quantidade de mulheres que avisa logo de cara, em sua autodescrição, que caso o indivíduo seja apoiador do Bolsonaro melhor nem começar a conversa.

Como a busca pela perpetuação da espécie é a obsessão dos nossos genes, a terceira tendência, consequência das duas tendências anteriores, é que muitos machistas revejam suas posições e larguem gradualmente suas ideias retrógradas, para não acabarem restringindo demais as suas opções de paquera e potenciais mães de seus filhos.

E assim, por meio das pressões evolutivas da seleção natural, podemos ter o número de apoiadores de Bolsonaro e demais machistas diminuindo ano após ano, geração após geração, o que nos empurrará um pouco mais para perto do mundo sonhado por quem se indigna com a injustiça: igualitário, solidário, livre.

It’s evolution, baby.

Pedro Breier: Pedro Breier nasceu no Rio Grande do Sul e hoje vive em São Paulo. É formado em direito e escreve sobre política n'O Cafezinho desde 2016.
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