Cafeína #6: A resposta política para a reforma da previdência

15/03/2017- São Paulo- SP, Brasil- Manifestantes protestam contra reforma da Previdência em passeata na Avenida Paulista Foto: Rovena Rosa / Agência Brasil

Por Tadeu Porto*, colunista do Cafezinho

Estamos numa fase de debate sobre a previdência social, por isso vira e mexe vamos ver números e mais números.

Equações que fecham para “A+B”, porém são incompatíveis com “C+D”. Ou então, rombos insuperáveis, déficits monstruosos ou ciclos anticíclicos (tem de tudo mesmo). Na hora das explicações, aparecem algarismos de quaisquer dígitos para analisar, quantitativamente, como o brasileiro ou a brasileira vive, morre, trabalha e até respira.

Alguém vai falar da taxa de natalidade, outrem vai responder com a taxa de sobrevida. Fulano vai argumentar que a interpretação da previdência constitucional é superavitária, Ciclano vai contrapor que na análise legislativa é deficitária.

E nois tá como? O que fazemos com esses números? Sinceramente, hoje, muito pouco. Quase nada, eu diria.

Não que devemos desqualificar estudos e documentos de altíssima qualidade como o Previdência: Reformar Para Excluir? do Dieese, Anfip e Plataforma Política Social. Vejo pessoas, com muita razão, usarem e abusarem dessas análises, como foi, por exemplo, essa semana no programa Cafeína #6, onde eu mesmo tive o prazer de discutir a contra reforma da previdência com meus amigos de Cafezinho Wellington Calasans e Leonardo Stoppa.

Entretanto, no programa de ontem, um fato além dos números saltou os olhos: a luta contra a reforma da previdência é, apenas, um galho de uma árvore podre inteira de desigualdade que precisamos derrubar – sem deixar as raízes – para melhorar o nosso país.

Portanto, o debate sobre aposentadorias, pensões, seguridade e afins é muito mais amplo do que cifras que possam representar, ou não, a sustentabilidade de um sistema. O discurso deve estar ancorado em se queremos, efetivamente, corrigir a dívida histórica que temos com os mais pobres desse país que, duas décadas atrás não tinham sequer a possibilidade de alimentar sua família três vezes ao dia (não, isso não era no século XIX, nesse mundo onde o “capitalismo deu certo” há carro autônomo e fome ao mesmo tempo, apesar muitas pessoas as pessoas não acreditarem).

Assim, a dialética do discurso não deve se construir em questões do tipo “vamos ter dinheiro para todo mundo no final de contas?” e sim “de onde vamos arrumar uma vida digna para toda sociedade?”.

Pensar em igualdade entre um homem que trabalha, solteiro e sem filhos, e uma mulher sob o mesmo perfil (como falou o relator da reforma deputado Arthur Maia) seria até plausível se vivêssemos em uma realidade que permitiu a ambos trilhar o mesmo caminho para chegar a essa posição, o que está longe de ser a realidade. Sem pensar em políticas que possam efetivamente igualar as oportunidades entre toda população – e, nesse exemplo, acabar com a estrutura machista que oprime a mulher e a obriga, culturalmente, a reproduzir ações que a prejudica – não existe a menor possibilidade de se um país minimamente justo.

Ou então argumentar que os 49 anos de contribuição não atingem a maioria da população pois mais de 60% dos aposentados e aposentadas recebem um salário mínimo, carrega uma lógica cruel (claro, natural no neoliberalismo) de que o futuro permanecerá com o retrato do presente, ou seja, essa parcela da população continuará sendo explorada para manter os privilégios de uma elite que não se cansa de esbanjar sua essência vira-lata.

E não é coincidência, portanto, que Lula e seu depoimento tenham aparecido no nosso programa, mesmo não se correlacionando diretamente com o tema principal, pois foi uma aula incrível de como levar a disputa para o campo político e ganhá-la, como bem frisou o Welligton Calasans.

Leo Stoppa, por exemplo, destacou como o eterno presidente, com suas palavras, desmascarou um judiciário que não entende nada de política (e povo). Atitudes como a do eterno presidente, que levam a disputa para um campo bem mais amplo, são essenciais para resistirmos aos ataques do governo golpista, inclusive a previdência.

Assim, é necessário prevalecer o entendimento de que a necessidade de uma estrutura social, inclusiva e justa é o primeiro passo para mudarmos o sistema como um todo e não ficar apenas apagando incêndio. Num campo mais democrático – derrubando o Golpe, por exemplo – trataremos melhor as discussões sobre déficit, horas, idade, ultra, mega, quilo, baixa calorias ou kilowatts.

E assim, a par das dificuldades que iremos enfrentar nessa empreitada, sobretudo política, saberemos que a medida de lutar é lutar sem medidas.
*Tadeu Porto é diretor do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense. Sigam-o no Facebook! ;)

Tadeu Porto: Petroleiro e Secretário adjunto de Comunicação da CUT Brasil
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