Julgamento no TSE é adiado para o “Dia de São Mendes”

(Fonte: Agência Brasil)

A paródia do Fernando Brito, do Tijolaço, é perfeita.

O temido julgamento da chapa Dilma/Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ficou para as calendas, ou seja, para o dia de São Nunca, ou melhor, para o “dia de São Mendes”.

O julgamento voltou à estaca zero.

Eu acho isso excelente, apesar de que seria ótimo ver Michel Temer ser deposto e os golpistas se engalfinharem pelo poder.

Será muito negativo, na minha opinião, que TSE inaugure mais essa jurisprudência antidemocrática, de cassar uma eleição com base num processo inteiramente manipulado, que chegava ao final contaminado por um monte de delações confusas, contraditórias e sem provas.

Eu só peço uma coisa aos deuses da democracia: que haja eleições em 2018 no Brasil, e que os derrotados, sejam nós, sejam eles, respeitem o resultado.

Somente o processo democrático, livre, transparente, sem interferências exageradas ou indevidas da justiça eleitoral, poderá pôr o Brasil novamente no caminho da democracia.

O entendimento das elites de que a impopularidade de Temer lhe dá direito de fazer reformas impopulares é absolutamente autoritário, antidemocrático e mesmo irracional.

Um governo precisa ser eleito pelo povo, ouvir o povo o tempo inteiro, discutir as propostas com o povo.

Um governo pode até tomar decisões impopulares, mas somente após um amplo processo de debate aberto e transparente.

O processo de cassação no TSE sempre foi um escárnio, baseado puramente no decisionismo partidário de Gilmar Mendes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). E agora termina igualmente por uma manipulação costurada pelo mesmo personagem.

Julgamento de resultado eleitoral tem de ser rápido, transparente e justo. A eleição termina, o TSE analisa as contas em alguns dias e aprova. Ponto final! Prorrogar um julgamento eleitoral por todo o tempo de um mandato corresponde a politizar esse julgamento, além de impedir o governante de governar.

O TSE é uma instituição bilionária, que custa caríssimo ao contribuinte. Deve servir para agilizar a democracia, não para lhe criar obstáculos!

Gilmar Mendes passou os últimos dias dando entrevistas dizendo que o TSE levaria em consideração a “estabilidade” política do país. Foi secundado por Fernando Henrique Cardoso, que disse a mesma coisa. São uns palhaços! A estabilidade política brasileira foi deliberadamente atacada desde que Dilma venceu as eleições de 2014. O complô pró-golpe, do qual Gilmar Mendes é um dos líderes, trabalhou diuturnamente para desestabilizar o país, e o resultado está aí, na economia, para todo mundo ver.

A entrevista de Dilma Rousseff à Folha, hoje, acabou de desmoralizar politicamente esse julgamento no TSE. A delação de Marcelo Odebrecht foi a gota d´água de um processo medieval que envolveu tortura, destruição empresarial, excesso de prisões cautelares, publicidade opressiva, vazamentos seletivos, intermináveis leguleios, chicanas, ilegalidades.

A Lava Jato despejou, nas portas do TSE, um monte de delatores já devidamente “preparados” pelo Ministério Público Federal, que fizeram delações incrivelmente oportunas para os objetivos dos mesmos personagens que articularam o impeachment.

A mídia fez um carnaval com as delações. Mendes ainda fez um jogo dúbio, ao criticar o vazamento de delações sigilosas (sobretudo porque elas começaram a atingir alguns tucanos).

As delações continuaram a vazar do mesmo jeito.

Todo mundo parece, de qualquer forma, ter esquecido um detalhe: não bastam delações. É preciso provas. Manchetes de jornal com base em vazamentos seletivos, colhidos às pressas pouco antes do julgamento, jamais podem servir, obviamente, para anular uma das maiores eleições democráticas do planeta, em que mais de 140 milhões de brasileiros escolheram seu governante.

É uma situação cínica. Caso não tivesse havido o impeachment, haveria pressão inaudita para um julgamento a toque de caixa. Mas o impeachment já aconteceu, e o governo Temer está se esforçando duramente, ninguém pode negar, para cumprir as ordens das forças que o puseram lá: desmontar o tímido Estado de bem estar social construído às duras penas desde a década de 30.

Não é preciso, portanto, tirar Temer.

Esse adiamento confirma que a cassação eleitoral via TSE sempre foi o plano B dos golpistas, sem base em nenhuma prova. Um plano B que, com o impeachment, tornou-se motivo de constrangimento.

Outro fator que motivou esse adiamento foi a dificuldade de convencer os ministros do TSE a preservarem Temer.

Não houve tempo de costurar um acordo. Os ministros Herman Benjamin e Luciana Lóssio não acreditaram muito nas promessas vazias, via mídia, de conseguirem vagas no STF e STJ, respectivamente.

As forças do golpe perderam o interesse de levar adiante o processo de cassação.

Além disso, a postergação do processo permitirá a Michel Temer aparelhar o TSE com ministros indicados por ele mesmo, após o que será ainda mais estapafúrdio dar sequência ao julgamento. Em alguns meses, Temer poderá substituir ao menos dois dos sete ministros, e justamente aqueles que resistem à tese da separação das chapas.

Outra função do adiamento é manter o espetáculo em cartaz, vazando delações seletivamente, para desviar a atenção da população dos problemas reais do país. Enquanto o governo destrói direitos trabalhistas e previdenciários, e os ladravazes que ocuparam as estatais terminam de saqueá-las e entregá-las a interesses privados (ganhando gordas comissões, é claro), os holofotes da Globo permanecerão focados no próximo capítulo da novela do TSE.

Os golpistas morrem de medo de qualquer tipo de processo eleitoral, mesmo que sejam eleições indiretas na Câmara dos Deputados. Por uma razão simples: qualquer processo eleitoral precisará dar voz à oposição, mesmo que seja minoria. Os deputados da oposição teriam espaço nos telejornais para denunciarem as negociatas, roubalheiras e ilegalidades articuladas pelo governo usurpador.

Então não pode haver eleições, nem mesmo numa Câmara controlada pelos golpistas.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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