24 de janeiro, dia do julgamento de Lula no TRF4, é a data do AVC da Marisa

Por Rogerio Dultra dos Santos

Dependendo do ângulo que se olhe, a sede do TRF4 parece uma grande boca dentada de concreto, ferro e vidro a engolir quem passe pelas suas escadarias. Os cinéfilos diriam que lembra a máscara lúgubre de Darth Vader.

Pois bem. O simbolismo arquitetônico do prédio da Justiça Federal no Rio Grande do Sul encontrou finalmente correspondência nos atos de sua burocracia.

É tão grotesco, tão perverso o significado deste fato, desta sentença condenatória previamente anunciada e “comemorada” que, para a compreensão de sua gravidade, talvez bastasse o título. Condena-se Lula no dia em que sua companheira sucumbe à pressão emocional da perseguição judicial sofrida.

É o festejo do exercício do poder nu, ridículo e sem hipocrisia. O arbítrio dominando as normas jurídicas de forma despudorada.

O que aconteceu? O judiciário perdeu a noção de limite. Acha que não precisa nem da aparência de imparcialidade. Passa finalmente o recibo de que foi e continua a ser o fiador do golpe. Pelo menos é este o claríssimo recado do TRF4.

É um ato de puro justiçamento, que deveria envergonhar os verdadeiros magistrados no país, porque eles existem. Mas a utilização do judiciário para eliminar os inimigos políticos do regime se sobrepôs a qualquer regra.

Platão falava deste fenômeno, o problema trazido pela necessidade da legitimidade: acreditava que a melhor forma de governo é a monarquia sem leis. Mas como não dá para convencer ninguém de que o monarca é tão superior que não deva ter seus atos de alguma forma vigiados – nem que seja pela obediência à sua própria lei –, é preciso colocar leis na monarquia, mesmo que seja para “inglês ver”.

Platão se preocupava em dominar a dissolução da ordem. O povo era levado em consideração em seu cálculo, em sua estratégia de organização da vida política. O judiciário, representado no Brasil hoje pelo TRF4, não se importa em levar o povo em consideração. Ao fazer isto, explicita de uma vez por todas o conflito de classe no Brasil.

Tem um elemento nesse ato do TRF4 que é a manifestação concreta do ódio. Não basta aniquilar o inimigo. É preciso a humilhação, o gozo com a multiplicação do sofrimento.

O luto sofrido por Lula deve, nesse sentido, ser revivido. A afirmação do algoz de que ele foi realmente responsável pelo arbítrio, a assunção do arbítrio, esta deve ser engolida a seco pelas suas vítimas.

É, de certa forma, o prazer do sádico, do impotente, daquele que sabe que perdeu na história, mas que ainda pode causar a devastação. Não é capaz de ganhar o jogo pelas regras, mas, dono da bola, viola as regras, mela o jogo e leva a bola pra casa, com o sorriso perverso de quem sabe que legou apenas frustração, dano e desespero.

Este ato autoriza e realimenta, de forma irresponsável, o conflito aberto no país. A aparência de legalidade, cada vez mais frágil a cada decisão da Lava-Jato, alcança seu fim. O processo contra Lula é e sempre foi político. E é assim que ele vai transitar em julgado.

Os recursos à decisão do TRF4, que será condenatória – provavelmente com sentença de reclusão aumentada de 9 anos (os nove dedos de Lula) para 13 (do PT) ou qualquer outro número que simbolize a mediocridade grotesca deste judiciário –, serão o desdobramento previsível desta pantomima bárbara.

Se esta condenação se consumar no STF como prevista – e como já vaticina o Ministro Gilmar Mendes –, o Brasil se assume mergulhado na ditadura. A chance da democracia vingar em 2018 pode começar a ser abortada no dia 24 de janeiro. E talvez seja este o ano mais curto da história do Brasil.

 

Rogerio Dultra: Professor do Departamento de Direito Público da Universidade Federal Fluminense (UFF), do Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Justiça Administrativa (PPGJA-UFF), pesquisador Vinculado ao INCT/INEAC da UFF e Avaliador ad hoc da CAPES na Área do Direito.
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