Os melhores trechos do discurso épico de Lula – com comentários

(Lula nos braços do povo após o discurso épico. Foto: Francisco Proner Ramos)

Por Pedro Breier

É tarefa difícil achar um adjetivo para o último discurso de Lula antes de sua prisão.

Histórico? Antológico? Monumental?

Todos parecem pequenos diante do poder discursivo de um dos maiores gênios políticos da história da humanidade.

Tratá-lo como o discurso mais épico da história brasileira é, talvez, o que faça mais justiça ao momento lendário que aconteceu hoje no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, berço político de Lula.

Separei alguns dos melhores trechos do discurso de Lula (em negrito) para fazer alguns comentários:

Eu sonhei que era possível um metalúrgico sem diploma universitário cuidar mais da educação do que os diplomados e concursados que governaram esse país. (…) Eu tenho orgulho, profundo orgulho, de ter sido o único presidente da República sem ter um diploma universitário. Mas sou o presidente da República que mais fez universidade na história desse país, para mostrar pra essa gente que não confunda inteligência com quantidade de anos na escolaridade. 

Aqui temos dois dos grande motivos da perseguição monstruosa que a direita brasileira empreende contra Lula. O primeiro é o ódio de classe. Lula é um retirante nordestino e líder operário que, justamente por sê-lo, comunica-se diretamente com o povão usando linguagem e referências populares. Somente o fato de ter chegado à presidência da República já o tornou alvo automático da fúria das estruturas de poder conservadoras. A ironia de ser, sem ter diploma universitário, o presidente que mais construiu universidades na história do país é o outro motivo. O projeto de manutenção do Brasil como um país absurdamente desigual não pode prescindir de uma população com baixo nível de escolaridade.

Esse crime eu cometi. (…) Se for por esses crime de colocar pobre na universidade, negro na universidade, pobre comer carne, pobre comprar carro, pobre viajar de avião, pobre fazer sua pequena agricultura, ser microempreendedor, ter sua casa própria; se esse é o crime que eu cometi, eu quero dizer:  eu vou continuar sendo criminoso nesse país porque vou fazer muito mais. 

É impressionante o talento comunicativo de Lula. Desnuda os verdadeiros motivos para essa caçada judicial de forma quase poética. Sensacional.

Eu tenho mais de 70 horas de Jornal Nacional me triturando. Eu tenho mais de 70 capas de revistas me atacando. Eu tenho mais de milhares de páginas de jornais e matérias me atacando. Eu tenho mais a Record me atacando. Eu tenho mais a Bandeirantes me atacando. Eu tenho mais as rádios do interior, as rádios de outros estados. E o que eles não se dão conta é que quanto mais eles me atacam, mais cresce a minha relação com o povo brasileiro. (…) Eles não sabem que o problema desse país não chama-se Lula. O problema desse país chama-se vocês, a consciência do povo.

Lula, apesar de ser o alvo de uma das campanhas de desmoralização mais pesadas da história da humanidade, simplesmente lidera todas as pesquisas eleitorais para 2018. A mídia hegemônica e seus sócios no golpismo parecem, de fato, não saber que toda essa violência contra o ex-presidente o torna cada vez mais mítico. Não devem saber também que uma figura mítica injustiçada dessa maneira é um símbolo poderoso demais, que fatalmente incendiará a consciência de milhões de brasileiros.

Outro sonho de consumo deles é a fotografia do Lula preso. Ah, eu fico imaginando a tesão da Veja colocando a capa minha preso. Eu fico imaginando a tesão da Globo colocando uma fotografia minha preso. Eles vão ter orgasmos múltiplos. 

(…)

Podem ficar certos: esse pescoço aqui não baixa. A minha mãe já fez o pescoço curto pra ele não baixar. E não vai baixar. Porque vou de cabeça erguida e vou sair de peito estufado de lá, porque vou provar a minha inocência.

Dois momentos em que Lula mostra sua veia humorística clássica. O homem é uma rocha: 72 anos, prestes a se tornar um preso político, e ainda tem presença de espírito para fazer piada. Desculpem-me o termo, mas não há outro que caiba aqui: o cabra é foda.

Eu vou enfrentá-los aceitando cumprir o mandado. Eu quero saber quantos dias eles vão pensar que tão me prendendo. E quanto mais dias eles me deixarem lá, mais Lulas vai nascer nesse país e mais gente vai querer brigar nesse país. Porque a democracia não tem limite, não tem hora pra gente brigar. Eu to fazendo uma coisa muito consciente. Eu falei pros companheiros: se dependesse da minha vontade, eu não iria. Mas eu vou. Eu vou porque eles vão dizer a partir de amanhã que o Lula tá foragido, que o Lula tá escondido. Não. Eu não to escondido. Eu vou lá na barba deles pra eles saberem que eu não tenho medo, pra eles saberem que eu não vou correr e pra eles saberem que eu vou provar a minha inocência.

A estratégia escolhida por Lula de entregar-se à PF – rejeitando a ideia de asilar-se em alguma embaixada ou em outro país – parece-me correta. O confinamento absurdo da maior liderança popular da história do Brasil será uma lembrança diária do que a elite brasileira é capaz para impor seu projeto de poder. A prisão de Lula depõe contra o seu próprio projeto de conciliação de classes e a sua permanência na prisão será como um alerta permanente: não pode haver acordo ou trégua no embate político com a direita brasileira.

Encerro por aqui os comentários, porque não há o que comentar sobre os últimos três trechos que separei. Apenas apreciemos o poder das palavras do maior gênio político da história do Brasil:

Não adianta tentar evitar que eu ande por esse país, porque tem milhões e milhões de Lula, de Boulos, de Manuela, de Dilma Rousseff pra andar por mim. Não adianta tentar acabar com as minhas ideias. Elas já estão pairando no ar e não tem como prende-las. Não adianta tentar parar o meu sonho, porque quando eu parar de sonhar eu sonharei pela cabeça de vocês e pelo sono de vocês. Não adianta achar que tudo vai parar o dia que o Lula tiver um infarte. É bobagem. Porque o meu coração baterá pelo coração de vocês, e são milhões de corações. Não adianta eles acharem que vão fazer que um dia eu pare. Eu não pararei porque eu não sou mais um ser humano. Eu sou uma ideia. Uma ideia misturada com a ideia de vocês.

(…)

Eu vou cumprir o mandado (de prisão). E vocês vão ter que se transformar, cada um de vocês, vocês não vão mais chamar Chiquinha, Joãozinho, Zezinho, Albertinho. Todos vocês daqui pra frente vão virar Lula e vão andar por esse país fazendo o que tem que fazer. E é todo dia. Eles tem que saber que a morte de um combatente não para a revolução.

(…)

Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas jamais conseguirão deter a chegada da primavera. E a nossa luta é em busca da primavera.

 

 

Pedro Breier: Pedro Breier nasceu no Rio Grande do Sul e hoje vive em São Paulo. É formado em direito e escreve sobre política n'O Cafezinho desde 2016.
Related Post

Privacidade e cookies: Este site utiliza cookies. Ao continuar a usar este site, você concorda com seu uso.