A inesquecível lição peruana aos lavajateiros do Brasil

O ex-presidente do Peru, Ollanta Humala, e sua esposa, Nadine Heredia, foram beneficiados com habeas corpus concedido pelo Tribunal Constitucional do Peru. E colocados em liberdade.

A decisão despertou ódio dos lavajateiros peruanos, todos ligados à direita, aos aparelhos de repressão e aos grandes meios de comunicação do país.

O presidente da corte, Ernesto Blume Fortini, reagiu com um artigo que é uma nova Declaração dos Direitos do Homem, escrito para nossa época!

A decisão da corte que resultou na liberdade do casal é uma lição histórica contra o espírito lavajateiro que hoje predomina no Brasil.

Fortini critica duramente a “justiça midiática”, e os artifícios de pós-verdade que tentam transformar indícios em provas. E assevera que a luta contra a corrupção precisa se dar em paralelo com o fortalecimento dos direitos constitucionais, em especial o direito sagrado à liberdade.

Que o texto inspire o STF e o STJ, para que dêem liberdade a Lula!

Trecho:

Os magistrados do Tribunal Constitucional não sao elegidos para serem populares. Fomos elegidos para fazer Justica Constitucional. É nosso dever atuad em defesa dos principios constitucionais e das garantias fundamentais.

Outro trecho:

  1. A liberdade é inerente à pessoa humana especialmente a liberdade pessoal. Afinal, tirar a liberdade a uma pessoa é a última medida que se deve adotar, sempre que existam fatos comprovados.
  2. Nenhum juiz pode deixar de avaliar e valorar as provas de inocência do acusado. Não fazê-lo é violar o direito à prova, o direito de defesa, o direito à tutela processual efetiva e o direito a um devido processo.
  3. Temos que fortalecer as instituições do Estado na luta contra a corrupção. A melhor forma de fazê-lo é atuar dentro da Constituição e dos devidos procedimentos. Não fazê-lo debilita a luta contra a corrupção.
  4. O Tribunal Constitucional não seguirá o caminho fácil: lavar as mãos, seguir a raiva compreensível de um setor de peruanos ou, no afã de ser popular, abster-se de cumprir seu dever de velar pela constitucionalidade e pela defesa dos direitos fundamentais.

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É interessante ainda a posição do secretário-geral da OEA, Luis Almagro, que divulgou a decisão da justiça peruana com um comentário emblemático sobre a “contribuição para todos os países do hemisfério”.

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Agradecemos ao internauta Sérgio Jerez que nos enviou a tradução do espanhol.

Na página do Tribunal Constitucional do Peru

DECLARAÇÃO DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do PERU – DOMINGO, 29 DE ABRIL DE 2018

O sistema anticorrupção se fortalece quando é respeitada a Constituição e os direitos fundamentais.

1. A luta contra a corrupção será mais efetiva, rápida, bem sucedida e irreversível quando se constitucionaliza.

2. Seguindo a ordem constitucional e o respeito aos direitos fundamentais, a luta contra a corrupção será vitoriosa e sem retrocessos.

3. A justiça mediática, ou seja, a justiça das Redes Sociais que ocultam rostos e identidades, não é justiça; é um linchamento de grupos e pessoas anônimas que ocultam suas verdadeiras intenções.

4. A prisão preventiva é uma medida excepcional. Não se pode fazer uso abusivo dela.

5. Tirar a liberdade de uma pessoa é uma medida necessária e indispensável quando há evidências comprovadas de perigo de fuga ou obstaculização da justiça.

6. O respeito à Constituição e aos Direitos Fundamentais que ela protege nos converte em um país no qual impera o Estado de Direito. Ou seja, a vida política e social de um país civilizado.

7. A justiça das multidões não é justiça. Recordemos que a multidão apoiou e aplaudiu quando se libertou Barrabás e se condenou Jesus à morte. A paixão não ajuda à justiça; ao contrário, se converte em um obstáculo.

8. Nós, Juízes Constitucionais, atuamos com razoabilidade, ponderação, proporcionalidade e respeito aos direitos humanos, seguindo os parâmetros estabelecidos pela Constituição Política do Peru, a lei, o Tribunal Constitucional, a Corte Interamericana de Direitos Humanos e os demais tribunais e organismos supranacionais de defesa dos direitos humanos.

9. A sentença proferida no caso Humala fortalece o sistema anticorrupção ao estabelecer que as autoridades encarregadas de investigar, denunciar, processar e sancionar atuem no marco da Constituição e da Lei, para evitar processos que tenham que ser anulados, que se processem inocentes e que os corruptos tenham argumentos para eludir a justiça.

10. Nós, membros do Tribunal Constitucional, somos eleitos pelo Congresso da República por maioria qualificada. Os Magistrados não atuam por cálculo político nem interesse partidário.

11. O Tribunal Constitucional é autônomo, independente e alheio a toda pressão e interesse políticos. Não me distanciarei jamais desse princípio.

12. Toda pessoa humana tem direito a um juízo imparcial no qual se respeitem seus direitos fundamentais. Até o condenado à morte tem direito, antes de que lhe seja aplicada a pena, a atenção médica, a ser visitado por um sacerdote de sua confissão caso o peça e a um último desejo. Todo ser humano tem direito à defesa.

13. Somos um país que luta para avançar a um estágio superior de desenvolvimento que é a sociedade sustentada no Estado Constitucional de Direito.

14. Sejamos racionais, e sem pretender criticar a Procuradoria Geral, é preciso destacar que não se formulou, ainda, uma acusação fiscal. Não há, ainda, um caso. No momento em que a Procuradoria Geral acuse, o Poder Judicial estudará e poderá iniciar o juízo.

15. Se há ameaça de fuga comprovada, o Poder Judicial pode atuar rapidamente em defesa da legalidade e do devido processo.

16. O Tribunal Constitucional não JULGOU e não JULGA casos penais. Isso é atribuição do Poder Judicial, baseando-se na investigação, na acusação fiscal e nas provas de culpa e de inocência oferecida e atuada pelas partes.

17. A sentença retroagiu ao ex-presidente Ollanta Humala e à cidadã Nadine Heredia à situação de comparecência restrita, que tinham antes. Para que sejam investigados e julgados em liberdade restrita.

18. A liberdade é inerente à pessoa humana especialmente a liberdade pessoal. Afinal, tirar a liberdade a uma pessoa é a última medida que se deve adotar, sempre que existam fatos comprovados.

19. Nenhum juiz pode deixar de avaliar e valorar as provas de inocência do acusado. Não fazê-lo é violar o direito à prova, o direito de defesa, o direito à tutela processual efetiva e o direito a um devido processo.

20. Temos que fortalecer as instituições do Estado na luta contra a corrupção. A melhor forma de fazê-lo é atuar dentro da Constituição e dos devidos procedimentos. Não fazê-lo debilita a luta contra a corrupção.

21. O Tribunal Constitucional não seguirá o caminho fácil: lavar as mãos, seguir a raiva compreensível de um setor de peruanos ou, no afã de ser popular, abster-se de cumprir seu dever de velar pela constitucionalidade e pela defesa dos direitos fundamentais.

22. Peço a todos que estudem a Sentença do Tribunal Constitucional. Algumas pessoas não leram a sentença e opinam pelo que ouviram ou expressam um ponto de vista político.

23. Se o Tribunal Constitucional não atua de acordo com a Constituição e com a defesa dos direitos fundamentais, os agravados recorrerão a instâncias internacionais para defender seus direitos. Isso danifica a imagem do Peru e debilita a luta contra a corrupção.

24. Nós, os magistrados, não atuamos buscando votos nem interesses políticos partidários. Nosso interesse é fazer Justiça Constitucional.

25. Corrupto também é o que mente sobre uma sentença que nem sequer leu e muito menos estudou.

26. A experiência internacional dos últimos anos demonstrou que existem milhares de pessoas dedicadas em alguns países, e o Peru não é a exceção, a produzir linchamentos midiáticos e a mentir. É o que se denomina pós-verdade e, também, fake news. Peço aos cidadãos e aos jornalistas que evitem como “verdades” o linchamento nas redes que não são outra coisa além de juizados midiáticos.

27. Todos os peruanos decentes rechaçam a corrupção, que não tem partido político, mas tem rosto. Mas, esse repúdio e essa luta deve ser feita corretamente para que os êxitos sejam irreversíveis.

28. Os corruptos não devem alegrar-se com a sentença do Tribunal Constitucional que atua em defesa da Constituição e dos direitos fundamentais. Se os processos são conduzidos dentro desses parâmetros, todos ganharemos.

29. Os magistrados do Tribunal Constitucional não somos eleitos para ser populares. Nos elegeram para fazer Justiça Constitucional. É nosso dever atuar em defesa dos princípios constitucionais e dos direitos fundamentais.

30. As organizações criminosas usaram e usam as leis para tentar aproveitar a legalidade a seu favor distorcendo seu espírito, caráter e sentido. O Tribunal Constitucional não permitirá jamais que a Constituição e o devido processo sejam manipulados por ninguém.

Lima, 29 de abril de 2018

Ernesto Blume Fortini

Magistrado Presidente

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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