Minha análise do debate na RedeTV!

Naturalmente, é apenas a minha opinião. Cada cabeça é uma sentença e sabe-se lá o que achou cada um dos milhões de brasileiros que assistiram, ontem, ao debate dos presidenciáveis na RedeTV!

Alguns números do debate: o vídeo no Facebook da RedeTV teve, até o momento em que escrevo, 11 da manhã do dia 18 de agosto, 2,8 milhões de visualizações.

O vídeo no youtube da emissora, por sua vez, está com 1,04 milhão de visualizações.

Na TV aberta, a audiência bateu índices máximos de 4,4 pontos em São Paulo, 5,3 pontos no Rio e 5,1 pontos em Porto Alegre. A RedeTV! costuma ter apenas 1 ponto de audiência neste horário. O debate atingiu o 3º lugar de audiência no Rio e Porto Alegre, e 4º lugar em São Paulo. Não é grande coisa, mas também não é nada.

Até hoje não compreendo porque a sociedade brasileira não exige que os debates entre presidenciáveis sejam realizados em horário nobre, às 20:30, para que todos os brasileiros possam se informar melhor sobre os candidatos ao cargo político máximo do país.

É inacreditável que, vivendo a mais dramática crise política da nossa história, a opinião pública não exija que as concessões públicas de TV tenham um mínimo de compromisso com o processo democrático.

Se a audiência tende a ser excelente, a única justificativa para que as emissoras empurrem os debates para horários inóspitos é o seu medo de que a população tenha um contato mais direto, sem a mediação da própria mídia, com seus representantes políticos. É a mesma mentalidade que se recusa a investir em grandes projetos de educação para o povo!

Vamos à análise do debate.

Lula, o ausente

Os dirigentes do partido, sempre que se deparam com uma notícia positiva, costumam repetir que isso é a prova de que sua “estratégia está correta”. No entanto, não usam o mesmo protocolo para analisar seus revezes, que são atribuídos inteiramente à malignidade satânica e desumana de seus adversários.

A ausência de um representante do PT no debate de ontem (assim com em todos os debates e sabatinas que já ocorreram e ainda vão ocorrer), que pudesse defender o ex-presidente e o legado dos governos petistas, além de oferecer propostas para o futuro, inflige obviamente significativo dano político ao partido. Depois de tudo que sofremos com Dilma, que se recusava a criar uma estratégia de contra-informação que protegesse o governo e todo o campo progressista dos ataques diários da mídia, o PT repete a mesma postura misteriosa e incomunicável, apostando todas as suas fichas na construção de uma imagem sebastianista do presidente Lula, o “único que pode salvar o Brasil”.

O PT sabe que um debate sem a sua participação lhe traz prejuízos, por isso tomou a iniciativa, no último encontro de presidenciáveis, de fazer um “debate paralelo”, o que me pareceu uma atitude um tanto infantil, e até mesmo antidemocrática, na medida em que pressionou parte de sua militância a não assistir o que outros presidenciáveis tinham a dizer.

Mesmo que o debate paralelo do PT tenha obtido bons índices de audiência, é óbvio que não agregou nada politicamente ao partido. Ao contrário, irritou os simpatizantes de outras candidaturas, especialmente aquelas com as quais há pontos de contato, como as de Marina, Boulos, Ciro. Ao contrário do PT, que tem o segundo maior tempo de TV, esses candidatos terão muito pouco tempo de horário eleitoral, e portanto precisam desesperadamente que o máximo de pessoas assista aos debates, para conseguir transmitir suas ideias a uma parcela maior da população.

Claro, Haddad poderia participar dos debates. Só que Haddad não é o candidato a presidente e as regras eleitorais não obrigam os canais de TV a substituir os candidatos por seus vices.

O preço da ausência do PT neste debate em particular foi bastante alto, porque tanto o partido quanto Lula foram atacados por todos os candidatos.

Bolsonaro, Alvaro Dias e Geraldo Alckmin foram os que atacaram mais diretamente o PT. O primeiro, explorando esse antipetismo irracional, nem se dá ao trabalho de explicar muito seus ataques. Ele se contenta em xingar. Em determinado momento, chamou Lula de “bandido”. Alvaro Dias, que resolveu apostar tudo na ideia de ser o “candidato da Lava Jato”, também criticou pesadamente o ex-presidente. Alckmin culpou o PT por todas as mazelas econômicas vividas pelo país.

Guilherme Boulos, do PSOL, fez críticas indiretas aos governos Lula-Dilma, ao afirmar, entre outras coisas parecidas, que seu partido nunca fez alianças com legendas duvidosas.

Ciro mencionou umas duas vezes, de maneira crítica, as políticas econômicas do governo Dilma.

Marina Silva

A candidata da Rede possivelmente foi a grande vencedora do debate, ou pelo menos protagonizou o momento que está sendo mais badalado nas redes. Astuta, Marina percebeu que Bolsonaro deixara um rabo solto numa de suas respostas anteriores sobre a questão da mulher, e, assim que teve a oportunidade, aproveitou a chance para ir para cima do capitão. O final de sua fala surpreendeu muita gente, especialmente o campo progressista: “numa democracia, o Estado é laico”. Eu arriscaria dizer que, após esse debate, Marina encontrou um nicho político interessante, e que os analistas que vinham lhe considerando “carta fora do baralho” talvez estejam reconsiderando suas posições. Um segundo turno entre um candidato da direita versus Marina não é mais tão impossível.

Guilherme Boulos

Boulos foi bem, como sempre.

O problema de Boulos é que ele não encontrou o seu nicho político: sua defesa solidária, justa, necessária, do ex-presidente Lula, e a própria guinada do PT à esquerda (um tanto forçado pelas circunstâncias, é verdade) acabou gerando um duplo impacto negativo no PSOL: a defesa de Lula afugentou o eleitor de esquerda mas antipetisa e pró-Lava Jato, que a candidatura de Luciana Genro ainda possuía; a transformação de Lula numa espécie de mito heroico da esquerda, por sua vez, atraiu os votos radicais que antes iam para o PSOL no primeiro turno.

Geraldo Alckmin

Coube ao picolé de chuchu, o candidato dos mercados e da Globo, fazer a crítica mais perigosa ao PT: a de que as mazelas econômicas de hoje se devem aos erros cometidos no período Lula-Dilma. A campanha do tucano será um longo editorial de Miriam Leitão: defesa das reformas de Temer e pau no PT. Com 44% do tempo de TV, essas bandeiras podem não ser suficientes, em função da falta de carisma do candidato, para levá-lo ao segundo turno, mas jogarão ainda mais veneno e ódio no debate político. O problema de Geraldo é a profunda sensação de sonolência e tédio que sua figura exala. Seu ponto mais fraco, explorado por Ciro várias vezes, é sua proximidade com o governo de Michel Temer, que inclusive sinalizou, há alguns dias, que o seu candidato é Geraldo Alckmin, porque ele tem apoio dos mesmos partidos que formam a base de seu governo, e é o que mais defende suas reformas.

Ciro Gomes

O candidato do PDT deu continuidade, neste segundo debate em tv aberta, à estratégia de neutralizar a imagem de personalidade irascível, bélica, brigona. É a versão Ciro paz e amor, que gasta parte importante do escasso tempo de que dispõe para fazer cumprimentos cavalheirescos a seus oponentes.

Sua ideia, suponho, é arrancar votos do eleitorado indeciso, cansado da polarização e do clima de guerra de vida e morte que tem marcado o debate político dos últimos anos. Repetiu a estratégia com Alckmin, Marina e Bolsonaro. E arrancou manifestações simpáticas dos três. Depois de ouvir as palavras amistosas de Ciro, Alckmin entrou no “ringue” com um sorriso relaxado, e depois ainda retribuiu o pedetista, escolhendo-o para um outro tête-a-tête. Ciro fez elogios quase entusiásticos a Marina, arrancando-lhe sorrisos e olhares encabulados. Com Bolsonaro, a estratégia foi enfatizar o fato de que ambos tinham sido colegas na Câmara dos Deputados, e fazer o confronto de maneira “respeitosa”; ao final, Bolsonaro, impulsivamente, lhe estendeu a mão.

Cabo Daciolo

Daciolo é um personagem muito interessante nesses debates, fazendo o papel milenar do “bobo da corte”, quebrando o tédio e frieza de um ambiente dominado pelo mais frio cálculo político. É impossível não sentir carinho pelo candidato, mesmo com os absurdos que ele fala, misturando política e religião da maneira mais grotesca.

Meirelles

Um zero. Está lá para cumprir tabela, e permitir que o PMDB embolse os milhões do fundo partidário.

Álvaro Dias

Tem apostado tudo no antipetismo e na defesa da Lava Jato.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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