Haddad renuncia a seu espaço na Folha após ser criticado em editorial

Na manhã deste sábado, 9, o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT) renunciou o seu espaço na Folha de São Paulo após ser classificado como “poste” no editorial publicado pelo jornal na última segunda, 4.

No texto intitulado “Filme antigo”, a Folha fala sobre a necessidade de formar uma frente ampla contra o presidente Jair Bolsonaro, mas ressalta o possível sectarismo e anacronismo do PT que insiste no viés personalista de Lula.

Na sequência, o texto relembra as eleições de 2018 onde “Haddad assumiu o papel de poste” do ex-presidente Lula que naquele momento estava preso em Curitiba (PR) e impossibilitado de concorrer a presidência da República. Com isso, Haddad publicou um artigo na manhã de hoje comunicando sua renúncia e criticou a afirmação da Folha.

Leia o texto na íntegra!

Despedida

Por Fernando Haddad

Agradeço ao leitor a consideração que me tenha dispensado. Procurei ser o mais zeloso possível ao ocupar este espaço, trazendo à sua consideração um ponto de vista menos paroquial sobre assuntos de interesse nacional.

Quando fui convidado para ser colunista da Folha, relutei em aceitar. Na época, me incomodava o posicionamento do jornal no segundo turno das eleições de 2018.

Pareceu-me uma falsificação inaceitável um órgão de imprensa que apoiou o golpe militar de 1964 equiparar, em editorial, um professor de teoria democrática a uma aberração saída dos porões da ditadura.

Àquela altura, a Folha já sabia que a família Bolsonaro era autoritária e corrupta, mas entendia que a agenda econômica neoliberal de Paulo Guedes compensaria o risco. Teria sido mais correto assumir isso publicamente.

Aceitei o convite, no entanto, porque intuía que o governo Bolsonaro traria graves consequências ao país, o que exigia da parte de todos uma disposição ainda maior ao diálogo.

Na semana passada, ocorreu um episódio insólito. Uma jornalista sugeriu, em artigo publicado no Estadão, que o STF mantivesse a condenação de Lula e desconsiderasse as provas de parcialidade de Moro.

E por quê? Para evitar que Lula seja candidato em 2022, o que, supostamente, favoreceria a candidatura de Bolsonaro. Reagi, nas redes sociais, afirmando que, diante de tanta infâmia e covardia, restava ao PT reafirmar os argumentos da defesa de Lula e relançá-lo à Presidência.

Em editorial, segunda-feira (4/1), este jornal resolveu me atacar de maneira rebaixada. Incapaz de perceber na minha atitude a defesa do Estado de Direito, interpretou-a como tentativa oportunista de eu próprio obter nova chance de disputar a eleição presidencial, ou seja, que seria um gesto motivado por interesse pessoal mesquinho.

Simplesmente desconsiderou que, nos últimos dois anos, em todas as oportunidades, inclusive em entrevista recente ao jornal, defendi sempre a mesma posição, qual seja, a precedência da candidatura de Lula.

Ao me desqualificar mais uma vez, inclusive com expediente discursivo desrespeitoso, ao estilo bolsonarista, esta Folha demonstra pouca compreensão com gestos de aproximação e sacrifica as bases de urbanidade que o pluralismo exige. Infelizmente, constato que, nos momentos decisivos, a Folha, em lugar de discutir ideias, prefere agredir pessoas de forma estúpida.

O jornal tem méritos que não desconsidero, mas não vejo como manter uma colaboração permanente com este veículo.

Por fim, a julgar pelo histórico dos políticos que a Folha veladamente tem apoiado, penso que ela deveria redobrar os cuidados antes de pretender deslegitimar alguém.

Fernando Haddad

Professor universitário, ex-ministro da Educação (governos Lula e Dilma) e ex-prefeito de São Paulo

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