A janela do impeachment

Ainda é possível mandar o bolsonarismo pro espaço antes das eleições. Foto: Marcos Corrêa/PR

É unanimidade entre os analistas que não há correlação de forças na Câmara Federal para que prospere um impeachment de Jair Bolsonaro neste momento. Além disso, economistas sérios como Paulo Nogueira Batista Jr. avaliam que os sinais de crescimento da economia, que por enquanto só animam a “economia virtual”, devem ter efeitos também na economia real nos próximos meses. E isso, somado à aceleração da vacinação, pode deixar Jair Bolsonaro em uma situação consideravelmente melhor do que a atual para a disputa das eleições de 2022.

No entanto, continuam surgindo evidências – cada vez mais escabrosas – da sabotagem do governo federal ao combate à pandemia, especialmente à vacinação da população. A CPI da Pandemia é a grande catalisadora das revelações e, também, a responsável por rememorar alguns absurdos cometidos por Bolsonaro nos últimos meses (são tantos que é inevitável alguns serem esquecidos). Por exemplo: na semana passada a senadora Simone Tebet (MDB), relembrou, em uma fala contundente, que o presidente vetou alguns dispositivos de um projeto sobre uso de máscaras aprovado pelo Congresso, dentre os quais a obrigatoriedade do uso de máscaras em órgãos públicos e em estabelecimentos comerciais. Esse veto foi derrubado pelo Congresso, mas ainda assim é (mais uma) evidência da criminosa sabotagem governamental.

Além disso, a “terceira onda” – na verdade o gráfico brasileiro de mortes não é em ondas, como em países sem um genocida na presidência, mas em uma escada sempre crescente – está prestes a explodir. Já estamos com uma média de 2 mil mortes diárias; um aumento a partir desta base deve igualar ou superar os piores momentos da pandemia, quando passamos de 3 mil mortes diárias oficiais em média.

Um parêntese: é preciso ressaltar que tratamos aqui de mortes oficiais, apenas. Como bem lembrou o camarada Leonardo Aragão no último Paris Café, a oposição abandonou o debate sobre a subnotificação das mortes. Há estudos afirmando que podemos ter quase 50% a mais de mortos do que dizem os números oficiais – o que daria, neste momento, mais de 700 mil óbitos totais. E nós vamos simplesmente continuar engolindo a contagem oficial, enquanto assistimos Bolsonaro seguir alimentando a tese estapafúrdia de que há uma “supernotificação”? Na minha humilde opinião, nenhum texto, vídeo, fala ou qualquer tipo de manifestação da oposição sobre as mortes deveria deixar de lembrar que os números oficiais estão bem abaixo dos reais.

Fechado o parêntese, sigo a minha linha de raciocínio. Me parece que, com a CPI aprovando um relatório inevitavelmente devastador para o governo e com uma nova explosão das mortes haverá uma brecha, a derradeira janela para tentar derrubar Bolsonaro antes das eleições de 2022. Talvez este não seja o curso dos fatos mais provável, admito, mas que há uma chance, não tenho dúvidas. Além do imponderável, três fatores podem ser decisivos para que o impeachment aconteça:

As ruas: as manifestações do próximo sábado, 19/06, tendem a ser maiores que as do dia 29/05, que já foram enormes. O sucesso dos atos e os cuidados com os protocolos sanitários adotados devem animar os militantes e os indignados em geral que não participaram por estarem receosos. Se este prognóstico se confirmar pode haver um terceiro, um quarto, um quinto ato ainda maiores, e o elemento pressão popular, sempre fundamental para um impeachment, estará pesadamente presente.

A oposição institucional: os partidos e atores políticos da oposição precisam acreditar na possibilidade de derrubar Bolsonaro e ter um timing perfeito para fazerem as articulações congressuais necessárias, aproveitando o empuxo da CPI e das manifestações de rua. É claro que é preciso antes querer derrubar Bolsonaro, e quanto a isso o maior partido de oposição (PT), especialmente o líder das pesquisas (Lula), dão sinais bastante dúbios. É bem conhecida a estratégia do Partido dos Trabalhadores de escolher adversário em eleição – deu ruim em 2014 e deu péssimo em 2018. O que é uma pena, uma irresponsabilidade e mais um monte de adjetivos impublicáveis. Ainda dá tempo de mudar de postura.

A mídia: falo aqui da mídia não bolsonarista, especialmente Globo, Folha e Estadão, cujo papel foi fundamental no impeachment de Dilma. Esses veículos representam os interesses de um naco importante dos donos do dinheiro. Se, por um lado, a política econômica de Paulo Guedes é certamente do agrado dos donos dos jornalões, por outro lado Bolsonaro é abertamente hostil à imprensa tradicional (inclusive quanto ao repasse de verbas). Além disso, retirar Bolsonaro da disputa é imperativo para que esses atores vislumbrem a possibilidade de levar um nome da direita “limpinha” ao segundo turno. Por isso não descarto que, caso a pressão pelo impeachment se eleve, a mídia mais especialista em golpes do planeta volte a bater seu bumbo pela queda do presidente. Desta vez com toda a razão.

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É provável que esses fatores confluam e resultem em um processo de impeachment do presidente? Talvez não. Mas, repito, há uma chance. Se cada um fizer o que lhe cabe direitinho e o imponderável colaborar, podemos dar um golpe “na jugular” do bolsonarismo, como vem pregando o Paulo Nougeira Batista Jr.

Tudo começa no próximo sábado, dia 19 de junho. Enchamos as ruas, com todos os cuidados. O caldeirão do impeachment precisa começar a esquentar.

Pedro Breier: Pedro Breier nasceu no Rio Grande do Sul e hoje vive em São Paulo. É formado em direito e escreve sobre política n'O Cafezinho desde 2016.
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