Importação de diesel fez o Brasil transferir R$ 122 bilhões a refinarias americanas nos últimos 5 anos

Foto de uma das manifestações pelo impeachment da Dilma, de 2015. Redes sociais.

O Brasil nunca produziu tanto petróleo. 

As estimativas do mercado hoje são de que o ano de 2021 termine com produção média de 2,9 milhões de barris por dia, e chegue a 3,4 milhões por dia no ano que vem. Até há pouco, a expectativa era de que esse nível só seria alcançado em 2025. 

Também nunca exportou tanto como nos últimos dois anos.

A razão disso, naturalmente, é o sucesso do pré-sal, que hoje representa 72% de toda a produção nacional.

O pré-sal não apenas se mostrou real, como maior ainda do que se esperava, e os obstáculos para a extração de petróleo a tamanha profundidade foram superados com maestria pela Petrobras. 

O gráfico abaixo é da Agência Nacional de Petróleo. Começa em 1964, ano do golpe militar e vai até setembro de 2021.  

Apesar da produção recorde, porém, os preços dos combustíveis nunca foram tão elevados no Brasil, e isso num momento dramático da economia, com desemprego alto, negócios fechando e perspectivas sombrias para a juventude. 

Não faz sentido.

Ou melhor, até faz, considerando que o nosso governo não tem compromisso com o bem estar da socieadade, nem com o desenvolvimento do país. 

 

Uma das razões para os altos preços do combustível é a mudança abrupta da política da Petrobras, após a Lava Jato, desistindo de investir em novas refinarias, e mesmo parando de reformar aquelas que já existem. 

Essa decisão fez com que o processamento (refino) de petróleo permanecesse estagnado, ou mesmo em declínio, a partir de meados de 2014, após o início de uma leve alta nos anos de 2012 a 2013. O consumo, por sua vez, cresceu nos últimos anos, embora não muito, em função da crise econômica. 

Houve um descolamento entre o consumo de petróleo no país e o seu processamento, o que iria obrigar o país a aumentar dramaticamente as importações, em especial de diesel, que é o principal combustível usado no transporte de cargas.

As importações de diesel nos últimos dois anos foram as maiores da nossa história. Observe que, nos anos de 2010 a 2014, também houve um crescimento das compras de diesel, mas por outros motivos: a economia cresceu de maneira muito forte nesse período, e a exploração do pré-sal ainda estava começando a dar resultados. 

O próprio presidente Jair Bolsonaro, em live desta quinta-feira, disse que uma das razões para o preço elevado do diesel é o percentual significativo que é importado, em torno de 25%. 

A fala de Bolsonaro me fez lembrar uma palestra de Sergio Moro, do tempo em que ele rodava o país dando palestras como uma celebridade. Num desses eventos, cujo ingresso era de R$ 1.800 por pessoa, o juiz criticou duramente a decisão dos governos petistas de investir em novas refinarias, o que, segundo ele, seria apenas “para roubar”.

Pois bem, a Comperj no Rio foi cancelada. As refinarias no Maranhão foram canceladas. A Petrobras parou de realizar melhorias nas refinarias já existentes, e, mais recentemente, o governo Bolsonaro decidiu privatizar as refinarias da estatal.

O resultado é esse aí: preços elevadíssimos, risco de desabastecimento no Brasil, subdesenvolvimento.

Entretando, o capitalismo tem uma característica. Sempre que alguém perde, outro ganha.

Neste caso, os principais ganhadores das decisões tomadas pela Petrobrás após o golpe de 2016 tem sido as refinarias norte-americanas, de onde tem vindo quase todo o diesel importado pelo Brasil nos últimos anos.

No último quinquênio (5 anos), de 2017 a 2021, o Brasil transferiu, apenas para refinarias norte-americanas, um total de R$ 122 bilhões, para importar diesel. Esse valor foi convertido pelo câmbio de 21 de outubro de 2021, que foi de R$ 5,668.

Se o blog fosse afeito a teorias de conspiração, poderia associar a mudança de regime vivida no país, com o impeachment de Dilma, e esse aumento dramático das importações de diesel americano.

Bom lembrar ainda que, por acaso, exatamente nesse período, que vai de 2013 a 2016, os Estados Unidos precisavam desesperadamente encontrar mercados para o seu diesel, após a Casa Branca liberar a produção do Alasca e autorizar a exploração de petróleo de xisto, no sul do país. Em poucos anos, os EUA voltaram a ser o maior produtor de petróleo do mundo, e precisavam exportar seus excedentes. Neste cenário, seria extremamente desagradável que o Brasil construísse refinarias e, ao invés de ser um importador líquido de diesel e de outros derivados de petróleo, se tornasse um exportador, concorrendo com as refinarias norte-americanas!

Quando se estudar os interesses imperialistas no Brasil, e a geopolítica do petróleo atual, não podemos esquecer que, no momento, os Estados Unidos não estão demasiadamente interessados em nossas reservas. A sua cobiça é, sobretudo, por nosso mercado de combustíveis!

Até porque a ditadura militar também serviu para isso. O transporte ferroviário foi desativado e, em seu lugar, toda a estrutura de escoamento e transporte de nossos produtos passou a ser feita por rodovias, em caminhões que usam diesel. Isso era do interesse dos EUA, que já era, na década de 60, o nosso principal fornecedor do produto.

A partir dos anos 70, 80 e 90, a produção americana de petróleo iria declinar, e seus interesses se voltariam para a captura de novas jazidas em outros países. Daí a sucessão de golpes e guerras no Oriente Médio. Na segunda década dos anos 2000, o consumo americano de derivados se estagnou, até pela substituição crescente por meios alternativos, e a produção, como dissemos, cresceu dramaticamente. O interesse a partir desse momento seria a conquista de novos mercados, e nada melhor do que o maior país da América do Sul, inteiramente cortado por estradas, e que é um dos principais consumidores mundiais de diesel e gasolina!

Fiz um vídeo para explicar esse artigo e trazer algumas informações complementares:

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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