Relatório de ONGs revela centenas de remessas com origem no Canadá, contrariando a narrativa oficial de que o país teria rompido com o envio de armamentos
Mesmo com o governo canadense afirmando publicamente que interrompeu as exportações de armamentos para Israel, um novo relatório divulgado por organizações de direitos humanos revela que os envios de equipamentos militares continuam ocorrendo — e não apenas esporadicamente, mas de forma constante e organizada. O documento intitulado “Expondo as Exportações Militares Canadenses para Israel”, lançado nesta terça-feira (30) por um grupo de ONGs comprometidas com a causa palestina, traz evidências concretas de que munições, peças de aviões de combate, blindados e outros itens estratégicos seguem chegando ao país desde a suposta proibição anunciada em março do ano passado. A pesquisa foi baseada em registros oficiais da alfândega israelense, incluindo recibos de importação e descrições detalhadas dos bens transportados.
Para Yara Shoufani, representante do Movimento Palestino da Juventude (PYM), o relatório desmente qualquer ideia de que o Canadá tenha realmente se distanciado da guerra no Oriente Médio. “Este documento mostra, sem margem para dúvidas, que o apoio material do Canadá a Israel continua ininterrupto, mesmo diante de uma crise humanitária sem precedentes”, afirmou durante coletiva realizada na capital Ottawa, na segunda-feira (29).
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As quatro entidades responsáveis pelo estudo — World Beyond War, Palestinian Youth Movement (PYM), Canadians for Justice and Peace in the Middle East e Independent Jewish Voices — reforçam que a narrativa oficial governamental está longe da realidade. “Apesar das declarações enganosas do Executivo federal, o fluxo de materiais bélicos do Canadá para Israel não só persistiu como foi amplamente documentado”, completou Shoufani.
Rachel Small, ativista da World Beyond War, destacou que muitos dos produtos fabricados no Canadá estão integrados à estrutura militar israelense. “Esses equipamentos estão sendo usados no chão de batalhas. Não adianta dizer que paramos de exportar quando, na prática, estamos alimentando essa guerra há meses”, ressaltou.
Armas canadenses em território israelense
Segundo os dados compilados pelas ONGs, remessas de munições canadenses foram registradas em fevereiro, julho e dezembro de 2024. Em abril deste ano, a autoridade tributária israelense documentou a entrada de um lote classificado como “tanques e outros veículos blindados de combate, motorizados, com ou sem armamento, e peças relacionadas”.
Além disso, entre agosto e novembro de 2024, foram identificadas exportações de componentes de armas de fogo, acessórios e peças diversas. Outras entregas incluíram partes de aeronaves militares, sistemas de laser, câmeras avançadas e dispositivos de comunicação via rádio — todos itens com potencial uso militar.
O relatório completo, que ocupa mais de 58 páginas, detalha cerca de 390 operações logísticas distintas, provenientes de 21 empresas canadenses localizadas em seis cidades diferentes. Entre os itens encontrados, destacam-se mais de 420 mil balas, 735 unidades de cartuchos, componentes do caça F-35 — incluindo sensores de navegação e sistemas de radar — além de equipamentos de dupla finalidade, como antenas de GPS.
Uma proibição sem consequência prática
O governo canadense anunciou formalmente, em março de 2024, a suspensão de todas as transferências de armas para Israel. No entanto, conforme aponta o estudo, a medida não teve impacto real no fluxo de exportações. Um exemplo recente foi noticiado em junho: munições avaliadas em US$ 60 milhões, parte de uma venda total de US$ 20 bilhões aprovada pelos Estados Unidos, teriam sido produzidas em instalações industriais no Canadá.
Os ativistas também alertam que algumas dessas remessas podem estar sendo encaminhadas indiretamente por meio de terceiros, como os próprios EUA, dificultando o controle e a fiscalização do tráfego de armamentos. Isso gera uma lacuna legal e ética que permite que o sistema continue funcionando sob a sombra da burocracia.
Especialistas em políticas internacionais e direitos humanos questionam a transparência do governo federal. “Se o Canadá quer realmente romper com sua posição de fornecedor de armas para Israel, precisa agir com mais determinação e oferecer informações verificáveis sobre onde e como esses produtos estão sendo utilizados”, disse um analista internacional que optou por permanecer anônimo.
Com a divulgação do relatório, as ONGs esperam intensificar a pressão sobre o Executivo federal para que adote medidas efetivas e transparentes. A meta é garantir que a promessa de parar as exportações seja, enfim, cumprida — não apenas em palavras, mas em ações concretas.
Enquanto isso, a polêmica ganha força nas ruas, nos meios acadêmicos e até dentro da própria comunidade judaica canadense, que tem dividido opiniões sobre o papel do país no conflito. Com cada nova denúncia, o debate sobre responsabilidade moral e política volta à tona — e, dessa vez, parece difícil negar que o Canadá ainda está no centro da disputa.
As eportações militares do Canadá para Israel
Apesar das declarações oficiais do governo canadense de que interrompeu o envio de armas para Israel desde janeiro de 2024, um novo relatório revela que produtos militares fabricados no país ainda estão chegando ao território israelense. A contradição entre a narrativa governamental e os dados coletados por ONGs tem gerado críticas crescentes em relação à falta de transparência e responsabilidade.
O estudo, produzido por pesquisadores da World Beyond War, Palestinian Youth Movement (PYM), Canadians for Justice and Peace in the Middle East e Independent Jewish Voices, utilizou registros da Autoridade Tributária de Israel e documentos comerciais públicos. De acordo com as informações compiladas, importações de munições, peças de armamento e equipamentos militares descritos como originários do Canadá continuam ocorrendo mesmo após a prometida suspensão oficial.
“Este relatório expõe, sem sombra de dúvida, a verdadeira extensão do apoio material contínuo do Canadá a Israel em meio a este genocídio”, afirmou Yara Shoufani, integrante do Movimento da Juventude Palestina, durante uma coletiva realizada em Ottawa. Para ela, o governo federal “enganou deliberadamente o público com suas declarações”.
Lacunas nas licenças e ausência de controle
O Ministério das Relações Exteriores do Canadá (Global Affairs Canada – GAC) afirma que não vende diretamente armas ao Estado de Israel, mas regula as exportações feitas por empresas privadas. Para isso, as firmas locais precisam obter licenças individuais. Apesar de o órgão dizer que não aprovou novos pedidos para itens que poderiam ser usados no conflito em Gaza desde janeiro de 2024, muitas autorizações emitidas antes dessa data ainda estão válidas.
Essas licenças, concedidas principalmente nos meses seguintes ao início da guerra em outubro de 2023, podem ter validade de até quatro anos. No entanto, o relatório ao Parlamento canadense lista apenas os números das permissões, sem revelar os nomes das empresas envolvidas ou detalhes sobre o destino final dos bens. Isso dificulta qualquer forma de fiscalização pública eficaz.
Rachel Small, da World Beyond War, ressaltou que os produtos canadenses estão profundamente enraizados na estrutura militar israelense. “Há uma completa falta de transparência sobre quais licenças permanecem ativas, quais foram canceladas e sob quais critérios tudo isso foi decidido”, disse Shoufani em entrevista. “O governo canadense não está disponibilizando os dados essenciais para que se faça uma análise objetiva. Tivemos que buscar informações em fontes externas.”
Dados contradizem as negativas
De acordo com o relatório, houve registros de importações de munições canadenses em abril e junho deste ano, incluindo 175.000 unidades de projéteis e 15.000 peças de armas militares. Além disso, foram identificadas diversas remessas aéreas saindo de cidades como Montreal e Toronto, transportando componentes de aeronaves militares, antenas de GPS e dispositivos de radar.
Em 17 de julho, por exemplo, uma carga partiu do Aeroporto Dorval, em Montreal, passou por Nova York e foi entregue em Bnei Brak, Israel, dias depois. O código postal informado (J5Z 2P4) corresponde a uma fábrica da General Dynamics Ordnance and Tactical Systems, localizada em Repentigny, Quebec.
Quando questionada sobre uma remessa específica de cartuchos de morteiro enviada em setembro do ano passado, a empresa confirmou à imprensa que tratava-se de “munição simulada”, ou seja, projéteis destinados ao treinamento e considerados não letais — e, portanto, isentos de licença de exportação. No entanto, a General Dynamics não forneceu mais detalhes sobre o calibre ou o cliente final.
Até agora, o governo canadense não ofereceu nenhuma explicação clara para a discrepância entre suas declarações e os dados reais. Em resposta a perguntas da imprensa, a porta-voz do GAC, Charlotte MacLeod, reforçou que o Executivo não comenta acordos específicos por motivos de confidencialidade comercial.
Pressão por embargo total
Diante da polêmica, ativistas exigem a implementação de um embargo completo sobre armas exportadas para Israel. “Enquanto o mundo inteiro observa o que está acontecendo em Gaza e começa a reconhecer isso como um genocídio, o Canadá deveria parar de se esconder atrás de burocracias e licenças antigas e adotar uma posição clara: acabar com todas as exportações de armas”, defendeu Shoufani.
A pressão também vem crescendo dentro do próprio Congresso canadense, onde parlamentares de diferentes partidos têm cobrado maior rigor na fiscalização e transparência das exportações. Alguns grupos sugerem a criação de uma comissão investigativa independente para auditar todas as operações ligadas às vendas de armas para o Oriente Médio.
Enquanto o debate se intensifica, o caso ilustra a complexidade de rastrear e regular o tráfego internacional de armamentos — especialmente quando grandes corporações estão envolvidas. E, para os defensores dos direitos humanos, o principal ponto é claro: enquanto houver dúvidas sobre a origem e o destino desses produtos, o Canadá continua, de alguma forma, contribuindo para o conflito.


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