São Paulo, a batalha final

Em editorial de hoje, o Globo sintetiza o que está em jogo em São Paulo. A disputa representa uma das batalhas mais importantes em meio à guerra maior, a realizar-se em 2014, pelo domínio do poder federal. O ingresso de Serra, de fato, nacionaliza a eleição em São Paulo, conferindo-lhe uma emoção que certamente não teria se o tucano não participasse.

Do lado dos tucanos, o desgaste causado pelo esvaziamento das prévias deverá ser rapidamente esquecido diante da perspectiva de poder. O orçamento da capital paulista supera o de muitos países (Bolívia, por exemplo), e uma derrota do PSDB nesta eleição representará um poder de fogo menor para enfrentar o PT em 2014.

O abortamento da aliança com o atual prefeito, por outro lado, traz um grande alívio para a militância petista, e o fato do adversário ser Serra, ajudará a mobilizar o eleitorado lulista, que vê em Serra o inimigo do “cara”. A militância ganha desenvoltura e poderá produzir um discurso político mais autoconfiante, coerente e agressivo. Não é por outra razão que Haddad declarou hoje aos jornais que sentia-se aliviado com a decisão de Kassab de apoiar o tucano.

Os jornais de hoje tratam das articulações febris que as lideranças partidárias já iniciaram para atrair aliados.

A briga maior é pelos partidos de centro, como PR, PSB e PDT. A presidência da República, que vinha declarando preferência pela neutralidade nas disputas mais polêmicas, agora se vê arrastada para o meio da cracolândia política de São Paulo. Fontes do Planalto iniciaram conversas com PR e PDT para lhes dar mais espaço no ministério em troca de apoio à Fernando Haddad. O PSB, por sua vez, está sendo diretamente cortejado pelo maiores nomes do PT: o próprio Lula, que já marcou um encontro pessoal com o presidente socialista, nos próximos dias; e Dilma, que também está fazendo gestões junto à direção do PSB para tê-lo como aliado do PT em São Paulo.

Esses partidos estão aproveitando a reviravolta em São Paulo para recuperar o cacife que haviam perdido diante da possibilidade de uma aliança entre Kassab e Haddad.

Será uma campanha agressiva. Serra sabe que seria humilhante perder uma eleição em São Paulo, e mesmo que tome cuidado para não ampliar sua enorme rejeição (atualmente em 35%), sua única chance de vitória será maximizar e explorar o antilulismo da classe média e das elites paulistanas, antilulismo este que flerta com o preconceito antinordestino, e os sentimentos mais reacionários de uma cidade famosa por seu conservadorismo.

Será uma campanha difícil. A alta rejeição de Serra não ilude os analistas mais experimentados. Ela é alta porque Serra é mais conhecido, e o tucano é líder nas pesquisas.

Ao se colocar no centro do palco político de 2012, a figura de Serra renasce das cinzas a que parecia ter se reduzido desde sua derrota em 2010 e, sobretudo, após o lançamento do livro de Amaury Ribeiro, a Privataria Tucana, que traz documentos envolvendo amigos, familiares, sócios de Serra, além dele mesmo, em sinistros esquemas de lavagem de dinheiro e corrupção da época em que ele foi ministro do governo FHC.

A abertura de uma CPI para investigar as denúncias do livro de Amaury Ribeiro poderia atrapalhar os planos de Serra para se eleger prefeito este ano, mas, ao mesmo tempo, a sua posição de candidato lhe confere um palco para se defender e contra-atacar. Provavelmente assistiremos a uma intensa troca de impropérios, onde os termos “piratas” e “mensaleiros” deverão constar com frequência.

No Estadão, o correspondente de Nova York, Gustavo Chacra, conseguiu uma entrevista exclusiva com Fernando Henrique, onde o ex-presidente faz uma curiosa apologia da mentira:

Estadão: Mas não pega mal para o Serra, que já foi prefeito uma vez e saiu para se candidatar (o tucano deixou a Prefeitura em 2006, para disputar a Presidência, e o governo do Estado, em 2010, para mais uma vez entrar na disputa presidencial)?

Ele vai tomar as precauções devidas porque ele tem de ganhar a eleição. Provavelmente ele vai reafirmar a disposição dele (de permanecer na Prefeitura). Mas não vi, não falei com ele. Política não é uma coisa em que o horizonte se fecha. De repente, o que estava fechado se abre.

Quer dizer, Serra vai prometer, outra vez, que vai cumprir o mandato até o final. Mas, segundo FHC, “o que estava fechado se abre”…

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No Rio, a oposição repete a fórmula de aliar o impopular ao rejeitado. César Maia e Garotinho uniram-se para combater a candidatura de Eduardo Paes. Para isto, trazem uma incrível “renovação”: os candidatos serão seus respectivos filhos. Rodrigo Maia e Clarissa Garotinho deverão formar a chapa que concorrerá à prefeitura do Rio em 2012.

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Concordo que um elogio do Irã não deve empolgar ninguém, mas é importante citá-lo para fazer frente à leviandade da Folha, praticada ao final do ano passado, que publicou manchete bombástica afirmando que “Irã ataca diplomacia brasileira”. Na verdade, o jornal colhera declaração de uma figura menor, e ainda por cima envolvido num dos sinistros processos de depuração interna, e a convertera numa posição oficial de governo. No dia seguinte, a informação foi negada por todas as instâncias oficiais, mas a Folha agarrou-se à sua versão com a birra de praxe. Dito isto, hoje encontrei a seguinte notícia, no Estadão: “Irã elogia posição brasileira sobre Primavera Árabe”.

Está claro que o Estadão conferiu destaque às declarações do chanceler iraniano porque entende que isso macula a imagem do governo Dilma, visto que o Irã tem fama de mau. Por outro lado, a informação reforça a tese de que a Folha foi leviana, ao reproduzir a opinião isolada de uma figura do governo iraniana como se representasse a posição oficial do país. O Irã é conhecido pela (diria até mesmo excessiva) franqueza com que se expressa sobre assuntos internacionais. Não hesita em atacar os países mais poderosos do mundo, chegando até mesmo a se recusar a vender petróleo para as nações que o atacam diplomaticamente. A declaração do chanceler iraniano, portanto, de que “nossas relações com o Brasil são excelentes e têm de tudo para continuar assim” devem ser avalizadas como a única posição legítima do governo persa, e põem de lado, de uma vez por todas, acusações de que Dima “rompeu” a política externa de Lula.

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Uma excelente notícia para os educadores brasileiros: o Ministério da Educação divulgou ontem que o novo piso salarial dos professores da rede pública este ano é de R$ 1.451 por mês, um aumento de 22% em relação ao ano anterior. A notícia ruim é que, segundo o Globo, o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, anunciou que irá descumprir a lei do piso, que hoje está em R$ 791,08 no estado. É triste ver que Genro, que foi ministro da Educação, reaja negativamente a uma lei justa e necessária.

No Rio, o piso está em torno de R$ 800, e tenho sérias dúvidas se nosso governador irá cumprir a lei.

De qualquer forma, a categoria agora ganha o mais poderoso aliado em sua luta por melhor remuneração: a Constituição.

O piso, no entanto, ainda é baixo. Um professor deveria ganhar, no mínimo, uns 4 mil reais, para ter uma vida decente.

Sobre o tema, sugiro ler essa entrevista com um alto membro do governo da Finlândia, país que tem um dos melhores sistemas de educação do mundo.

 

Ilustração da capa: pintura de Julian Schnabel.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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