Radioatividade: um conto nuclear brasileiro

Por Lia Bianchini, repórter especial do Cafezinho.

Esta história começa na década de 1970, em Massachusetts, Estados Unidos, com um engenheiro naval da marinha (nosso personagem principal) especializando-se em engenharia nuclear no Massachusetts Institute of Technology (o famoso MIT).

No Brasil, onde Angra 1 começava a ser construída, o governo firmava um acordo de cooperação com a Alemanha para ter acesso ao ciclo completo de abastecimento da usina. Incluso nesse ciclo, estava o enriquecimento de urânio, que, até então, era feito por meio de difusão gasosa.

Um novo modo de enriquecimento de urânio, porém, começava a ser estudado e despertava o interesse do governo brasileiro: o método da ultracentrífuga, mais eficiente e econômico.

Já no final da década de 70, nosso engenheiro naval retorna ao Brasil, devidamente especializado em engenharia nuclear. Sua função, agora, era determinar as possibilidades de produção nuclear no Brasil. As pesquisas começam, avançam, e surge a afirmação: pode-se desenvolver o ciclo do combustível nuclear em solo brasileiro.

Começava, assim, sob a responsabilidade de nosso engenheiro naval, o Programa de Desenvolvimento do Ciclo do Combustível Nuclear e da Propulsão Nuclear para Submarinos. O programa tinha o intuito de viabilizar a produção de válvulas, sensores e medidores das centrífugas de enriquecimento de urânio.

Após 14 anos, nosso engenheiro naval, agora vice-almirante, tem de deixar o projeto, pois completara seu tempo de serviço militar. O resultado de seus anos de trabalho, no entanto, receberia grande reconhecimento da comunidade científica e fixaria um marco na história: o Brasil conseguira sua própria tecnologia de enriquecimento de urânio através da ultracentrifugação.

Foram gastos no projeto US$ 663 milhões, que incluíram o desenvolvimento do ciclo de combustível, da propulsão para submarinos, do submarino, propriamente dito, e a infraestrutura.

Quase uma década após ter exercido trabalho fundamental no Programa Nuclear Brasileiro, já nos anos 2000, nosso engenheiro naval assume a presidência da empresa responsável por construir e gerenciar as usinas nucleares brasileiras, a Eletronuclear – Eletrobrás Termonuclear, criada em 1997.

Utilizando o método de enriquecimento de urânio através da ultracentrifugação, as usinas nucleares brasileiras (Angra 1 e Angra 2) são responsáveis, hoje, pelo fornecimento de cerca de 3% da energia elétrica consumida no país.

Uma década após assumir a presidência da Eletronuclear, a história de nosso engenheiro naval (até então protagonizada por grandes feitos e avanços tecnológicos, entrelaçando-se à história da atividade nuclear brasileira) passa a figurar nas páginas policiais.

A denúncia: nosso engenheiro naval teria recebido propina de companhias que compõem o consórcio de construção da usina nuclear Angra 3.

As provas: ainda não existem.

E, assim, como num passe de mágica, a história de nosso engenheiro naval deixou de ser a de grandes conquistas tecnológicas para o Brasil e passou a ser a de um (ainda suposto) envolvimento em um esquema de corrupção.

Se você não conhece “nosso engenheiro naval”, basta procurar pelo nome de Othon Luiz Pereira da Silva, preso na última terça-feira, dia 28 de julho, na 16ª fase da Operação Lava Jato, denominada Radioatividade.

No entanto, uma busca rápida pode não ser eficaz, pois mostrará apenas manchetes sobre propina e prisão. Enquanto as denúncias são investigadas, é recomendável uma busca mais profunda, que mostrará feitos de um importante cientista brasileiro, reconhecido internacionalmente por seu trabalho.

Lia Bianchini:
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