Bernie Sanders pode ser o próximo ‘Ronald Reagan’ na presidência dos Estados Unidos (no bom sentido)

Acreditem ou não, este senhor de 74 anos pode ser um divisor de águas na política norte-americana

por Carlos Eduardo, editor-assistente do Cafezinho

O título deste artigo é polêmico de propósito.

Sem dúvida nenhuma, comparar um ‘socialista democrático’, como se autodefine Bernie Sanders, com o radical de direita Ronald Reagan, não tem cabimento.

A questão que pretendo apresentar neste ensaio é a seguinte: Bernie Sanders tem tudo para ser um divisor de águas, um marco histórico na política norte-americana, assim como foi Ronald Reagan nos anos de 1980.

A eleição de Reagan representou o fim da era New Deal, iniciada nos anos de 1930 por Franklin D. Roosevelt e que resistiu por quase meio século.

Subitamente, de uma hora pra outra, o social-liberalismo e as políticas keynesianas ficaram fora de moda. A vitória de Ronald Reagan marcou o início da era neoliberal nos Estados Unidos.

O neoliberalismo se tornou a doutrina oficial da política econômica norte-americana, algo que permanece até os dias atuais. Uma política inspirada nos ideais de laissez-faire, ou seja, no princípio da não-intervenção do Estado na economia, e que teve como guru o economista Milton Friedman.

O debate sobre a passagem de Reagan na presidência dos Estados Unidos levanta paixões. Você pode idolatra-lo ou odiá-lo, mas ninguém pode negar que ele foi um presidente transformador.

Seu governo implementou uma série de iniciativas econômicas, como a desregulamentação do sistema bancário, redução dos gastos governamentais — principalmente com programas sociais — e cortes de impostos.

Curioso que antes de Reagan, nem mesmo o mais notável presidente republicano da era New Deal, o general Dwight D. Eisenhower, ousou mexer nas políticas de bem-estar social.

Reagan conseguiu até o final de seu governo reduzir a inflação e criar 16 milhões de empregos, a uma taxa média de crescimento de aproximadamente 8% ao ano. No entanto, Reagan quase triplicou a dívida pública norte-americana em sua revolução pelo ‘Estado Mínimo’.

Desde então os Estados Unidos vem caminhando para a direita do espectro político.

Bill Clinton, democrata que ocupou a Casa Branca entre 1993 e 2001, foi quem acelerou as transformações neoliberais iniciadas na gestão Reagan. Ideais estes que influenciaram o governo de FHC no Brasil.

Na eleição de Barack Obama, muitos acreditaram que ali estava um presidente que mudaria para sempre a política nos Estados Unidos. Mas infelizmente, após oito anos de mandato, vê-se que Obama fez muito pouco neste sentido.

Claro que a eleição do primeiro negro para o cargo mais poderoso do mundo já é por si só algo revolucionário, mas Obama não deu início a qualquer tipo de mudança de paradigma, como Roosevelt e Reagan o fizeram antes dele.

Por isso Bernie Sanders é o único candidato desta eleição com potencial para se tornar o novo ‘Ronald Reagan’ na história da política norte-americana.

Depois do fracasso em 2008, a chama de Hillary Clinton poder ser novamente apagada por um eclipse chamado Bernie Sanders

Reagan foi um presidente que acreditava verdadeiramente nos ideais do neoliberalismo e com seu carisma conseguiu convencer a opinião pública de sua época de que o ‘governo era o problema’. Foi graças a isso que ele aprovou no Congresso Americano medidas que seriam inimagináveis, por exemplo, nos tempos de Eisenhower.

Assim como Reagan, Sanders defende com paixão suas posições social-democratas e não cansa de repetir em seus discursos que a intervenção do Estado na economia é fundamental para corrigir as imperfeições do capitalismo liberal.

Pesquisas já mostraram que a maioria do eleitorado americano, quando perguntado sobre as propostas de Sanders, se dizem a favor. As pesquisas foram feitas sem mencionar o candidato, daí o dado mais interessante: mesmo entre o eleitorado republicano há consenso de que algo precisa ser feito para frear o avanço da desigualdade.

Mas as semelhanças não param por aí.

Reagan foi um dos presidentes mais carismáticos que os Estados Unidos já teve em sua história e estudos mostram que o eleitorado norte-americano vê Sanders como o candidato mais singular destas primárias — para o bem e para o mal.

Bernie Sanders parece possuir da mesma paixão por mudanças que Ronald Reagan uma vez levou para a Casa Branca, só que no lado oposto do espectro ideológico.

E o fato de Sanders vir a ser o mais velho a ocupar a presidência dos Estados Unidos depois de Reagan, caso seja eleito, é apenas coincidência. O mais curioso desta história é ver um senhor com 74 anos mobilizar a juventude em torno de sua candidatura assim como ocorreu na eleição de Reagan em 1980, quando este tinha 70 anos.

Franklin D. Roosevelt disse uma vez:

“A presidência não é apenas um escritório administrativo. Isso é o de menos. Ele é, antes de tudo, um lugar de liderança moral. Todos os nossos grandes presidentes eram líderes de pensamento nos momentos em que certas ideias históricas na vida da nação tinham de ser clarificadas”. (tradução livre)

Pois é isto que Sanders representa hoje para muitos americanos: uma liderança moral.

A desigualdade no mundo alcançou níveis alarmantes, como mostrou recentemente um estudo da Oxfam, daí a razão da campanha de Bernie Sanders ser toda calcada no tema da desigualdade social.

Sanders propõe colocar os pobres na agenda política do país, do mesmo modo como Lula fez no Brasil.

Podem criticar à vontade o ex-presidente Lula e os erros do PT nestes últimos 14 anos, mas o fato é que nenhum presidente que venha a ocupar o Palácio da Alvorada depois de Dilma terá a coragem de acabar com programas sociais como o Bolsa Família. Seria um suicídio político.

Os republicanos e liberais podem falar o que for das políticas de Ronald Reagan nos anos de 1980. De fato ele deu um boom na economia norte-americana, mas hoje vivemos na pele o resultado de tais medidas. A desregulamentação inconsequente dos bancos gerou crises mundias, aumentou a corrupção global e fez a diferença de renda entre os mais ricos para a classe média e as classes mais baixas se tornar insustentável.

Lista dos maiores doadores de Bernie Sanders desde sua primeira candidatura nacional em Vermont

Os críticos de Sanders dizem que se eleito, ele inevitavelmente irá decepcionar seus eleitores, pois suas propostas seriam ‘utópicas’ demais para serem colocadas em prática. Mas enxergo em Sanders um candidato sui generis na política norte-americana.

Obama se elegeu com a promessa de mudança, porém o maior doador de sua reeleição em 2008 foi o banco de investimento Goldman Sachs. Com Hillary Clinton não é muito diferente, os grandes bancos de Wall Street também são seus maiores doadores, como mostra o site OpenSecrets.org.

Enquanto isso a campanha de Bernie Sanders não aceita doações de empresas. Desde sua primeira eleição para deputado no estado de Vermont, até os dias de hoje, seu financiamento vem majoritariamente de sindicatos e de contribuições pela internet.

Bernie Sanders acredita realmente na liderança moral que um presidente deve exercer sobre o país, recusando-se a seguir as regras sujas das demais campanhas, onde os interesses de grandes corporações estão acima do interesse público.

Por isto, repito: Bernie Sanders tem tudo para ser o próximo ‘Ronald Reagan’, representante de uma nova era. Um divisor de águas na política norte-americana. Só que desta vez pra melhor.

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