A Ditadura do Micheleco – censura aos blogs e brucutu nas ruas

Por Bajonas Teixeira, colunista de política do Cafezinho

 

Micheleco é o nome que usamos para batizar a nova era, muito promissora, inaugurada com a posse de Michel Temer. Como observou o senador Roberto Requião, vivemos agora o momento em que passa a vigorar a “diplomacia do pixuleco” com José Serra e na qual, para não ficar de fora, a Justiça legaliza o pixuleco para juízes. Portanto, nada mais adequado, pensamos, que designar esse admirável mundo novo de “ditadura do Micheleco”.

Brucutu –  “Com a instauração da ditadura com o Golpe Militar de 64, o Brasil assistiu a algumas manifestações públicas de protesto. O regime então muniu seus aparatos repressivos de equipamentos destinados a dispersar multidões. O nome Brucutu, originário das histórias em quadrinhos, havia se popularizado em todo o país com uma canção de Roberto Carlos. Na gíria policial, adotada pela imprensa, o veículo blindado, por sua força bruta, recebeu este apelido, que se consagrou.”

Censura – É o assassinato da vida pública e a pá de cal sobre a democracia, porque, como dizia Karl Marx (citado por O Globo, que ironia) “A função da imprensa é ser o cão de guarda público, o denunciador incansável dos dirigentes, o olho onipresente, a boca onipresente do espírito do povo que guarda com ciúme sua liberdade”.

O governo Temer começa com gestos agressivos, acenando com rigores e ameaças explícitas. Para quem viveu o período da Ditadura, e, mais ainda, experimentou o “espírito autoritário” daqueles anos, de imediato, como se fosse despertado por um certo perfume de putrefação, liga essa poesia de efeito moral aos velhos tempos.

E ela parece ainda pior que a prosa do velho general Figueiredo, celebrizada com a frase sutilmente cavalar e epigramática que sentenciava: “Quem for contra a abertura, eu prendo e arrebento.” O milico foi canhestro, mas ao menos sua frase equina se referia à Abertura. Já no caso de Temer, o ex-chefe de polícia,  o pathos, sendo também canhestro, é mais grave, porque seu golpe se faz contra a democracia.

A julgar pelo que acaba de ser divulgado pelo Globo, com ares de cumplicidade e apoio, as primeiras palavras balbuciadas pelo governo foram destinadas a intimidar os opositores. Coisa que confirma o que vinha sendo divulgado nos últimos dias por seus assessores e, sobretudo, do que era o desejo da mídia, expresso em diversos momentos de forma mais ou menos límpida.

Algumas das pérolas intimidatórias pronunciadas por Temer na reunião ministerial pós-golpe:

? ” ‘Golpista é você, que está contra a Constituição’”, enfatizou, referindo-se aos opositores que o acusam de ter dado um golpe.”

? “Não podemos deixar uma palavra sem resposta”, afirmou.

? “As coisas se definiram, e é preciso muita firmeza”, afirmou.

? “Ele ainda disse que ‘no plano internacional tentaram muito e conseguiram dizer que no Brasil houve golpe’, e disse que não se pode tolerar essa informação. ‘Isso aqui não é brincadeira.’”

Como assim “isso aqui não é brincadeira não”? Se esse é um governo democrático, como garantem Temer e seus apoiadores, por quê faria gestos ameaçadores contra os que discordam dessa narrativa?

Mas esses gestos são inevitáveis, e terão que passar à prática também muito em breve,  porque se trata de um governo de saque em todas as frentes. Conduzido por um presidente que, como nenhum outro, fará todas as concessões possíveis para qualificar-se como perfeito lacaio das elites, nacionais e internacionais, não restará alternativa alguma senão a violência.

O preço a ser pago, será o da busca de uma solução para o equilíbrio fiscal, ou, se se quiser, para a crise econômica, no magro terreno dos grupos sociais da parte inferior da pirâmide social. Não será para cima, ou seja, exigindo o sacrifício das elites, com imposto progressivo, corte em isenções, fim de juros subsidiados, etc. Se isso é coisa impossível com elites predatórias em situação normal, quanto mais quando se sentem pilares e promotoras do golpe.

Como grandes eleitores do novo presidente, eles agora entregarão a fatura. E ela será gorda.

Por isso que, já há quatro dias, em entrevista a O Globo, Moreira Franco, o fiel escudeiro do mordomo, dizia que, após a posse definitiva, Temer seria muito mais firme. E essa firmeza assumia especial significado em relação aos cortes das áreas de saúde e educação. Ao ser perguntado sobre se haveria exceção para saúde e educação, respondeu assim:

“Temos que ter cautela, prudência, a firmeza de trabalhar com o fato. Dr. Ulysses (Guimarães, ex-presidente da Câmara dos Deputados) disse que, na política, o fato era tão importante que devia ser tratado de Excelência. Na economia, o fato é muito mais importante do que na política porque é ele que determina rumos e circunstâncias e as alternativas. A solução proposta pela Fazenda é uma solução extremamente criativa. Com medidas complementares, ela vai nos abrir a possibilidade de buscar o equilíbrio fiscal sem açodamento, construindo o encontro da receita com a despesa.”

Portanto, estão desenhadas no horizonte duas direções em que o governo Temer pretende imprimir firmeza, ou seja, repressão:

1) Contra quem questione o seu governo e insista em considera-lo um governo golpista. E, para além de qualquer dúvida, a julgar pela satisfação de O Globo, quem está sob ameaça são os blogs. De fato, que significa a menção de Temer a que “no plano internacional tentaram muito e conseguiram dizer que no Brasil houve golpe” e de que “não se pode tolerar essa informação”? Ele visa os blogs já que são esses que fazem a denúncia do golpe. Portanto, uma onda de repressão contra os blogs – “Isso aqui não é brincadeira não” –, dará continuidade aquela com que inaugurou o seu governo interino, com o corte brutal dos financiamentos já aprovado.

2) A firmeza será dirigida também contra aqueles políticos que, no Congresso, venham a se melindrar diante das consequências sociais da aprovação de medidas extremamente impopulares. Eles serão tratados com firmeza. Mas o principal é que, para impor essas medidas, haverá também a necessidade de atuar com firmeza exemplar sobre as ruas, reprimindo os movimentos sociais que se rebelarão contra as medidas de saque e de desmonte.

É preciso ter presente, no que diz respeito à comunicação, o fato de que para a Globo e as demais grandes empresas da mídia corporativa, os blogs são um grande incômodo. E sabe-se que a rivalidade de narrativas não é o único motivo. Um outro, igualmente importante, é o pânico que aumenta dia a dia na mídia corporativa diante da concorrência das formas alternativas de comunicação.

Portanto, temos o nítido registro taquigráfico dos primeiros balbucios do novo velho governo golpista: repressão intelectual e repressão política, censura política aos blogs e violência policial contra as ruas. Essas são as frases que velam o berço do nascente governo Temer. O brucutu está de volta.

Bajonas Teixeira de Brito Júnior – doutor em filosofia, UFRJ, autor dos livros “Lógica do disparate”, “Método e delírio” e “Lógica dos fantasmas”. É professor do departamento de comunicação social da UFES

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