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A insanidade da desigualdade

Por Pedro Breier Foi lançado ontem o Mapa da Desigualdade 2017, estudo de uma organização da sociedade civil chamada Rede Nossa São Paulo. Um dos dados chocantes do estudo sobre a desigualdade em São Paulo é a diferença de expectativa de vida entre os bairros ricos e os bairros pobres da cidade, que chega a […]

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Por Pedro Breier

Foi lançado ontem o Mapa da Desigualdade 2017, estudo de uma organização da sociedade civil chamada Rede Nossa São Paulo.

Um dos dados chocantes do estudo sobre a desigualdade em São Paulo é a diferença de expectativa de vida entre os bairros ricos e os bairros pobres da cidade, que chega a 24 anos.

“Se fossem très ou cinco anos de vida, você poderia até pensar que é uma variação normal, mas 24 anos não é uma diferença nada aceitável. É uma geração inteira”, disse Américo Sampaio, gestor de projetos da Rede Nossa São Paulo, à reportagem da Folha.

Estes dados derrubam, por si só, a ideia de que vivemos em uma meritocracia, onde a posição social é definida pelo mérito individual de cada um.

Podemos falar em meritocracia quando alguns moram em bairros com altos índices de assassinato, “sem cultura” (mais da metade dos bairros de São Paulo não têm cinema, museu, casa de cultura ou local para show) e onde se demora 17 vezes mais dias que em outros bairros para conseguir vagas em creches para os filhos?

Haveria alguma meritocracia caso as condições mínimas de vida digna fossem garantidas a todos, mas isso está longe de acontecer. Só o Estado pode impulsionar a melhora nas condições de vida das populações desfavorecidas, uma vez que a lógica do lucro faz com que as empresas invistam somente em lugares que darão um certo retorno financeiro.

Mas a direita brada aos quatro ventos que o Estado tem que ser mínimo. O motivo inconfessável: a mão de obra tem que continuar barata. Se filho de pobre estudar, por exemplo, quem vai trabalhar duro e ganhar pouco?

O sociólogo Jessé Souza explica como se constrói uma classe social. O pai de classe média lê, a mãe conta histórias, instigando a imaginação dos filhos. Os filhos dos pobres brincam com o carrinho de mão do pai. Quando chegam na fase escolar, as crianças já estão em plena competição. Uma classe rouba o tempo da outra a preço vil: a empregada doméstica limpa, alguém traz a pizza, a babá cuida dos bebês, o que faz com que sobre mais tempo ainda para a preparação da classe média/alta.

As pessoas que abraçam a ideologia egoísta que sustenta o capitalismo percebem o quanto é pesado fazer faxina todo dia ou trabalhar em uma obra e ainda passar infindáveis horas no transporte público abarrotado para voltar para casa na periferia, onde mal dá tempo para comer qualquer coisa, ver um pouco de televisão e dormir porque no outro dia, antes do sol nascer, começa tudo de novo.

Percebem mas fingem que está tudo bem assim. No fundo, o que importa é a própria sobrevivência. Não se enxerga o outro como um ser humano, mas como um adversário no “jogo da meritocracia”.

Entretanto, mesmo de acordo com uma ótica egoísta, é insanidade e burrice não lutar contra a desigualdade porque ela é fator determinante para a violência urbana que assola também os filhos das classes média e alta.

O preço de viver sob a lógica do cada um por si é viver com medo.

 

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Pedro Breier

Pedro Breier nasceu no Rio Grande do Sul e hoje vive em São Paulo. É formado em direito e escreve sobre política n'O Cafezinho desde 2016.

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André Carvalho

25/10/2017 - 14h27

Esse discurso da meritocracia também ofusca outros “inimigos”, internos e externos, a serem atacados: os rentistas e financistas, que têm que promover a exploração cada vez maior dos pobres, inviabilizando ainda mais qualquer possibilidade de emancipação dos mesmos.


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