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O voto de Celso de Mello em favor da criminalização da homofobia

Decano declara omissão legislativa e afirma que homofobia representa forma contemporânea de racismo Em seu voto na ADO 26, o ministro Celso de Mello deu interpretação conforme a Constituição Federal para enquadrar a homofobia e a transfobia nos tipos penais previstos na legislação que define os crimes de racismo, até que o Congresso Nacional edite […]

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Decano declara omissão legislativa e afirma que homofobia representa forma contemporânea de racismo

Em seu voto na ADO 26, o ministro Celso de Mello deu interpretação conforme a Constituição Federal para enquadrar a homofobia e a transfobia nos tipos penais previstos na legislação que define os crimes de racismo, até que o Congresso Nacional edite norma autônoma sobre a matéria.

20/02/2019 20h05

O voto do relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, ministro Celso de Mello, foi retomado e finalizado na sessão plenária do Supremo Tribunal Federal (STF) desta quarta-feira (20). O decano da Corte concluiu que o Congresso Nacional foi omisso ao deixar de editar lei que criminaliza atos de homofobia e transfobia. O julgamento da ação, ajuizada pelo Partido Popular Socialista (PPS), teve início na semana passada, na sessão do dia 14. A análise da matéria terá continuidade nesta quinta-feira (21), com a leitura do voto do ministro Edson Fachin, relator do Mandado de Injunção (MI) 4733, sobre a mesma matéria.

Em seu voto, o ministro Celso de Mello reconheceu a inconstitucionalidade na demora do Congresso Nacional em legislar sobre a proteção penal aos integrantes do grupo LGBT, declarando a existência de omissão legislativa. O ministro deu interpretação conforme a Constituição Federal para enquadrar a homofobia e a transfobia, ou qualquer que seja a forma da sua manifestação, nos diversos tipos penais definidos em legislação já existente, como a Lei Federal 7.716/1989 (que define os crimes de racismo), até que o Congresso Nacional edite uma norma autônoma.

O ministro destacou que as práticas homofóbicas configuram racismo social, consagrado pelo Supremo no julgamento do Habeas Corpus (HC) 82424 – Caso Ellwanger – considerando que essas condutas são atos de segregação que inferiorizam membros integrantes do grupo LGBT. Ele votou pela procedência da ação com eficácia geral e efeito vinculante. Em seu voto, declarou que os efeitos da decisão somente se aplicarão a partir da data de conclusão do julgamento.

Coletividade social

O decano avaliou que este é um julgamento em favor de toda a coletividade social e que a decisão não será proferida contra alguém ou contra algum grupo, da mesma forma que não pode ser considerado um julgamento em favor de apenas alguns. “O fato irrecusável no tema em exame é um só: os atos de preconceito ou de discriminação em razão da orientação sexual ou da identidade de gênero não podem ser tolerados, ao contrário, devem ser reprimidos e neutralizados, pois se revela essencial que o Brasil dê um passo significativo contra a discriminação e contra o tratamento excludente que tem marginalizado grupos minoritários em nosso país, como a comunidade LGBT”, salientou.

O ministro afirmou que a homofobia representa uma forma contemporânea de racismo e avaliou a importância do julgamento no processo de ampliação e de consolidação dos direitos fundamentais das pessoas. “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade de direitos”, destacou o relator, ressaltando que a orientação sexual e a identidade de gênero são essenciais à dignidade e à humanidade de cada pessoa, “não devendo constituir motivo de discriminação ou abuso”. Segundo ele, a diversidade das formas de vida e o direito à diferença não podem, em nenhum caso, servir de pretexto aos preconceitos raciais, mesmo porque as diferenças entre os povos do mundo não justificam qualquer classificação hierárquica entre as nações e as pessoas.

Omissão

De acordo com o relator, o Estado tem o dever de atuar na defesa da dignidade da pessoa humana e contra a permanente hostilidade contra qualquer comportamento que possa gerar desrespeito aos valores da igualdade e da tolerância. O ministro Celso de Mello observou que a ausência de ação estatal quanto às agressões praticadas contra grupos sociais vulneráveis “e a recusa do poder público em enfrentar e superar as barreiras que inviabilizam a busca da felicidade por parte de homossexuais e transgêneros, vítimas de inaceitável tratamento discriminatório, traduzem omissão que frustra a autoridade do direito, que desprestigia o interesse público, gera o descrédito das instituições e compromete o princípio da igualdade”. Ele afirmou que o Poder Judiciário deve tornar efetiva a reação do Estado na prevenção e repressão nos atos de preconceito e discriminação praticados contra pessoas que integram grupos vulneráveis.

Caso Ellwanger

Em diversos momentos de seu voto, o relator citou partes do julgamento do Habeas Corpus (HC) 82424, realizado em setembro de 2003, quando o Plenário do Supremo manteve a condenação do editor Siegfried Ellwanger por crime de racismo. Considerado como precedente histórico, o HC 82424 orientou o voto do relator no sentido de que a noção de racismo abrange as situações de agressão injusta que resultam de discriminação ou preconceito contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero.

O ministro ressaltou que o racismo, para efeito de configuração típica dos delitos na Lei 7.716/1989, não se resume a um conceito estritamente antropológico, fenotípico, biológico, mas projeta-se numa dimensão cultural e sociológica, o denominado racismo social. Ele julgou que deve ser rejeitada a visão arbitrária, preconceituosa, inconstitucional e perversa do racismo. “O preconceito e a discriminação resultantes da aversão aos homossexuais e aos demais integrantes do grupo LGBT – típicos componentes de um grupo vulnerável – constituem a própria manifestação cruel, ofensiva e intolerante do racismo por representarem a expressão de sua outra face, o racismo social”, ressaltou.

Liberdade religiosa

Durante a leitura do voto, o ministro Celso de Mello também abordou questão relacionada à liberdade de expressão religiosa. Para ele, a decisão não interfere na prática religiosa, que é pressuposto essencial do regime democrático. “Essa livre prática não pode e não deve ser impedida pelo poder público nem submetida por ilícitas interferências do Estado, de qualquer cidadão ou qualquer instituição da sociedade civil”, afirmou.

O ministro observou que a divulgação objetiva de fatos e narrativas religiosas não configuram hipótese de ilícito civil ou penal, porque não se pode presumir o intuito de ofender pessoas e grupos. “A exposição e a reprodução de narrativas, de conselhos, lições ou orientações constantes de qualquer livro sagrado de qualquer religião não se revelam aptos a configurar delitos contra a honra, porque veiculados com intuito de divulgar o pensamento teológico e filosofia espiritual, próprios de cada denominação, circunstância que descaracteriza o ânimo de difamar e injuriar alguém tornando legítimos enquanto expressões de postulados de fé das religiões”, destacou.

Segundo o relator, é considerada crime a incitação ao ódio público e ao ódio racial. Ele salientou que as pregações religiosas, sermões ou homilias, enquanto expressões legítimas de transmissão de ideias em matéria de doutrina religiosa têm o amparo do texto constitucional, que protege aqueles que, na condição de fieis, líderes ou autoridades religiosas, desempenham junto às respectivas congregações, atividade pastoral ou de natureza confessional.

Leia a íntegra do voto do decano.

Texto publicado no portal do STF

Os vídeos com a fala de Celso de Mello podem ser vistos aqui:




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Comentários

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Zé Maconha

22/02/2019 - 11h38

Que o bolsominion do Paulo venha dar xilique aqui ao ver um grupo que ele odeia ter seus direitos afirmados é de se esperar.
Mas ver pessoas “progressistas” criticando o STF por outros assuntos em vez de elogiar a decisão correta , ainda mais nessa hora difícil.
Os lgbt também trabalham , defender eles é defender os trabalhadores e a homofobia pode vitimar qualquer um de nós.
Vocês podem ter um filho homossexual amanhã ou até serem mortos por serem confundidos com um.
Lembram do senhor hétero que foi morto por salvar uma travesti que estava sendo espancada?

    marco

    22/02/2019 - 14h35

    Caro Zé Canábis.
    A minha crítica se baseia no histórico das decisões desse sujeito, quase todas à favor do capital e contra os trabalhadores e seus aliados.
    Não me esqueço que Mello, foi um dos verdugos de Zé Dirceu e do presidente Lula inclusive com justificativas de votos de dar asco pela hipocrisia.
    Só se posiciona a favor do que não causa danos ao “mercado”.
    Leia o artigo “a América dividida ” no site do Paul Craig Roberts sobre o objetivo estratégico das pautas identitárias.

marco

21/02/2019 - 18h54

No julgamento de causas “identitárias” o cara é um leão.
Para julgar o direito dos trabalhadores é um gatinho.
Tenho nojo dessa justiça.

    ari couto

    21/02/2019 - 20h40

    Se vc olhar ao longo da história, o STF sempre foi uma instituição a serviço dos governos de plantão e/ou das classes dominantes. Nos últimos 3/4 anos, votou sistematicamente contra os trabalhadores, foi fiador do golpe e escandalosamente impediu o Lula até de falar. Mais recentemente, reprisou uma das mais vergonhosas decisões de sua história ao entregar o Battisti para os italianos.

Paulo

21/02/2019 - 18h51

Próximo passo: cotas para gays nas universidades. Este país está virando uma terra sem futuro, uma nação à deriva…

    Zé Maconha

    22/02/2019 - 11h43

    Ficou bravo porque agora vai ter que guardar seu ódio dentro de você se não vai pra cadeia?
    Toma mamadeira de piroca que passa hahaha
    Você é tão “hétero” que chama um homem de “mito” e adora homens de uniforme.
    Sei não hahahaha


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