Durante entrevista ao jornalista Breno Altman, editor do site Opera Mundi, o assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, Celso Amorim, detalhou a posição do governo brasileiro sobre a ausência da Venezuela na última cúpula do BRICS, realizada no Rio de Janeiro, e abordou o papel do Brasil nas negociações diplomáticas envolvendo o país vizinho.
Amorim afirmou que o Brasil não apoiou o ingresso formal da Venezuela como membro do grupo, mas negou que tenha havido veto à presença do país na condição de observador. “Não houve um veto”, declarou o assessor, ao comentar os critérios adotados para seleção dos países convidados à reunião.
Segundo Amorim, a definição dos observadores considerou afinidade política e a busca por equilíbrio interno do bloco. “Queríamos um BRICS equilibrado em todos os sentidos para ele poder ter o efeito que nós queremos”, explicou. O assessor citou que outros países sul-americanos, como Argentina, Peru e Equador, também não foram convidados, argumentando que a ausência da Venezuela não foi um caso isolado nem indicativo de discriminação.
Relações diplomáticas e política externa brasileira
Na entrevista, Amorim reforçou a posição tradicional da diplomacia brasileira sobre o reconhecimento de Estados, e não de governos. “O Brasil não reconhece governos, reconhece Estados, e estamos mantendo com a Venezuela uma relação normal”, afirmou.
O assessor também destacou que a política externa brasileira se pauta por princípios como a não intervenção e o respeito aos acordos internacionais. Segundo ele, o governo mantém uma postura de diálogo com diferentes atores regionais, inclusive em momentos de tensão.
Amorim citou ações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no campo diplomático e ressaltou o histórico de participação brasileira em iniciativas para reduzir conflitos na América do Sul. Ele lembrou que o Brasil, mesmo em gestões anteriores, se manteve contrário a medidas unilaterais que agravassem o isolamento da Venezuela.
Críticas às sanções e recordações do governo anterior
Amorim foi direto ao criticar sanções impostas contra a Venezuela por países estrangeiros. “Eu concordo que a Venezuela é vítima de ações unilaterais. O Brasil sempre se opôs, talvez tenha sido o país que se opôs não só da boca para fora, mas efetivamente”, afirmou.
Durante a conversa, o assessor ainda mencionou momentos em que o governo brasileiro anterior cogitou medidas mais duras contra Caracas. Segundo ele, durante o mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro, chegou-se a considerar uma intervenção no país vizinho. “O Brasil chegou a cogitar uma ‘intervenção humanitária’, o que é uma ameaça de guerra”, disse.
Essas ações, de acordo com Amorim, foram revertidas com o retorno da atual política externa, que privilegia o diálogo multilateral e a mediação de conflitos por vias diplomáticas.
Processo eleitoral na Venezuela e acordos internacionais
Ao ser questionado sobre o processo eleitoral na Venezuela, Amorim mencionou o acordo firmado em Barbados, assinado entre governo e oposição, como um marco que previa etapas específicas. “Na nossa opinião, aquele processo não foi seguido”, declarou.
Ele ponderou que a crítica brasileira não deve ser interpretada como interferência em assuntos internos. “Não é ingerência nos negócios internos. Havia uma previsão de etapas a serem cumpridas, e essas condições não foram totalmente cumpridas”, explicou.
Amorim também compartilhou sua experiência direta no processo, relatando visitas ao país como parte dos esforços diplomáticos. “Fui três vezes à Venezuela nesse período”, disse o assessor, ao comentar sua participação como testemunha nas negociações.
Equilíbrio político e imagem pública
A entrevista também abordou a imagem pública de Amorim em diferentes contextos políticos. O assessor relatou situações em que foi interpretado de forma contraditória por setores opostos nos dois países. “Sou o único cara que aqui no Brasil sou chamado de antiamericano, e aí na Venezuela sou persona non grata porque era agente americano. Então eu devo estar com equilíbrio razoável”, disse, em tom irônico.
A fala reflete o papel complexo que Amorim desempenha como representante do governo brasileiro em questões internacionais. Sua atuação recente no caso venezuelano insere-se na estratégia do Palácio do Planalto de reativar mecanismos de mediação regionais e adotar posições compatíveis com a tradição diplomática do país.
Participação da Venezuela no BRICS segue indefinida
A inclusão da Venezuela como membro do BRICS não está, por ora, na agenda de expansão do grupo. Segundo Amorim, o bloco ainda avalia os critérios para admissão de novos países e busca preservar um equilíbrio interno entre seus integrantes.
O assessor explicou que a ampliação do BRICS deve ocorrer com base em afinidade política, complementaridade econômica e consenso entre os atuais membros. A presença de observadores, por sua vez, é decidida de forma pontual, de acordo com os objetivos estratégicos de cada cúpula.
Ao comentar o futuro da integração regional e a relação com a Venezuela, Amorim reiterou que o Brasil continuará atuando em fóruns multilaterais e priorizando o diálogo como instrumento de política externa. A posição foi alinhada com declarações anteriores do presidente Lula, que defende a construção de um ambiente de cooperação entre os países da América Latina, independentemente das diferenças ideológicas.
Com isso, o governo brasileiro reafirma seu compromisso com a estabilidade institucional da região e com a promoção de canais diplomáticos que permitam a resolução de impasses entre governos vizinhos.


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