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Quando o ativismo vira crime no ambiente acadêmico dos EUA

Columbia University expulsa dezenas de estudantes por protestos pró-Palestina em meio a pressão política nos EUA A Universidade de Columbia, uma das instituições de ensino superior mais prestigiadas dos Estados Unidos, entrou em conflito direto com seu próprio corpo estudantil após aplicar punições severas a quase 80 alunos que participaram de manifestações em apoio aos […]

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Por que a Universidade de Columbia está expulsando estudantes pró-Palestina?
Quase 80 estudantes foram disciplinados, com alguns sendo totalmente expulsos, devido aos protestos pró-Palestina no campus / Reuters

Columbia University expulsa dezenas de estudantes por protestos pró-Palestina em meio a pressão política nos EUA


A Universidade de Columbia, uma das instituições de ensino superior mais prestigiadas dos Estados Unidos, entrou em conflito direto com seu próprio corpo estudantil após aplicar punições severas a quase 80 alunos que participaram de manifestações em apoio aos palestinos. Entre as medidas disciplinares estão expulsões, suspensões que variam de um a três anos e até mesmo a revogação de diplomas já concedidos.

O caso tem chamado atenção nacional e internacional, não apenas por envolver uma universidade de renome, mas por colocar em xeque o equilíbrio entre liberdade de expressão e manutenção da ordem acadêmica em meio a um dos conflitos mais polarizadores da atualidade: a guerra entre Israel e Hamas em Gaza.

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Segundo informações divulgadas pelo Conselho Judicial da universidade, as punições foram aplicadas após a conclusão das audiências disciplinares referentes a dois momentos específicos de mobilização estudantil: a manifestação ocorrida na Biblioteca Butler em 7 de maio de 2025 e o acampamento denominado “Revolta por Rafah”, realizado em 31 de maio de 2024, durante o tradicional fim de semana de encontro de ex-alunos.

“A suspensão da Columbia por protestar contra o genocídio é a maior honra”, rebateu a Columbia University Apartheid Divest (CUAD), coalizão de grupos estudantis engajados na causa palestina, em uma publicação nas redes sociais. “Rejeitamos que a Columbia tenha qualquer reputação que valha a pena manter e declaramos categoricamente que não desejamos mantê-la”, completou o grupo.

Protestos que viraram movimento global

Os protestos na Columbia não aconteceram em isolamento. Em 2024, estudantes pró-palestinos montaram acampamentos em diversos campi universitários dos EUA, mas foi em Manhattan que o movimento ganhou maior repercussão. A ocupação da Biblioteca Butler, um dos principais símbolos da universidade, ocorreu durante o período de provas finais, gerando tensão e mobilizando a atenção da mídia.

Na ocasião, a polícia de Nova York foi chamada para desmontar o acampamento, resultando na prisão de 78 pessoas. Os manifestantes reivindicavam que a universidade se desligasse financeiramente de empresas com vínculos ao exército israelense, rompesse relações comerciais com o Estado de Israel e assumisse uma posição pública de solidariedade com os palestinos diante da escalada da violência em Gaza.

Segundo os organizadores, o protesto em maio foi descrito como uma “aula pacífica” com leituras e debates sobre o pensamento e a trajetória do ativista palestino Basil al-Araj, morto pelas forças israelenses em 2017. Apesar da natureza declaradamente educativa do evento, a universidade considerou que houve interrupção das atividades acadêmicas e aplicou as sanções em massa.

Pressão política e financiamento federal

A onda de punições não ocorre em vácuo. Nos bastidores, há uma forte pressão do governo federal, especialmente após o anúncio do então presidente Donald Trump de que reteria cerca de US$ 400 milhões em financiamento destinado à Columbia, sob a justificativa de que a universidade não teria agido com firmeza contra o que ele classificou como “atividades antissemitas” durante os protestos.

A medida levou a instituição a negociar com o governo a restituição do financiamento, o que resultou em uma série de concessões. Entre elas, a proibição do uso de máscaras em manifestações no campus e a concessão de poderes especiais a 36 policiais do campus para realizar prisões de estudantes.

O jornal estudantil Columbia Spectator apurou que a maioria dos alunos punidos recebeu suspensão de dois anos e que foi exigido que apresentassem um pedido formal de desculpas à universidade antes de poderem retornar às atividades acadêmicas.

Reação e repercussão

A ação disciplinar em massa, descrita como a maior da história da universidade, provocou reações imediatas de grupos de defesa dos direitos civis e de estudantes de outras instituições. Muitos enxergam a punição como parte de uma tendência crescente de repressão ao ativismo pró-Palestina nos campi universitários dos EUA.

Em comunicado divulgado na terça-feira, a própria Universidade de Columbia defendeu as medidas tomadas. “Nossa instituição deve se concentrar em cumprir sua missão acadêmica para nossa comunidade. E para criar uma comunidade acadêmica próspera, deve haver respeito mútuo e pelo trabalho, políticas e regras fundamentais da instituição”, afirmou a nota. “Interrupções nas atividades acadêmicas violam as políticas e regras da Universidade, e tais violações necessariamente gerarão consequências.”

A universidade não divulgou quantos estudantes foram expulsos, suspensos ou tiveram diplomas revogados, nem revelou os nomes dos punidos, alegando proteção à privacidade estudantil.

Apesar da justificativa oficial, o episódio reacende o debate sobre os limites da liberdade de expressão em ambientes acadêmicos e o papel das instituições de ensino diante de pressões políticas externas. Enquanto alguns defendem a manutenção da ordem como prioridade, outros veem nas punições um sinal de que o ativismo estudantil está sendo criminalizado em nome de uma agenda controversa.

E o caso da Columbia, longe de encerrar o debate, promete alimentar ainda mais a polêmica em torno da liberdade de expressão, do papel das universidades na sociedade e dos limites do ativismo político dentro dos campi.

Estudantes da Universidade de Columbia mantêm resistência mesmo diante de expulsões e ameaças de deportação

Enquanto a Universidade de Columbia anunciava as severas punições aplicadas a quase 80 estudantes envolvidos em protestos pró-Palestina, outro capítulo da controvérsia ganhava força em Washington. Na mesma terça-feira, Mahmoud Khalil, um dos líderes mais visíveis do movimento estudantil na universidade, reunia-se com legisladores da capital norte-americana pouco mais de um mês após ser libertado da custódia da imigração na Louisiana.

Khalil, de 30 anos e residente permanente legal dos Estados Unidos, continua enfrentando o risco de deportação sob o governo Trump, que tem se baseado em uma disposição obscura da Lei de Imigração e Nacionalidade de 1952 para tentar expulsar estudantes internacionais identificados com a causa palestina. A tentativa, segundo especialistas em imigração, representa uma instrumentalização sem precedentes do sistema legal para fins políticos.

Diante das sanções anunciadas pela universidade, o grupo ativista estudantil Columbia University Apartheid Divest (CUAD) respondeu com uma declaração contundente. “Enquanto os EUA e Israel matam de fome 2,1 milhões de habitantes de Gaza, a Columbia tem trabalhado diligentemente com [o governo Trump] para suspender dezenas de estudantes por ativismo pró-Palestina”, afirmou o coletivo em nota.

O grupo destacou que as punições aplicadas constituem o maior número de sanções já registradas para um único protesto político na história da instituição, superando em muito os precedentes para palestras ou ocupações de prédios não relacionadas à Palestina. “Os estudantes continuam comprometidos em acabar com o genocídio israelense apoiado pelos EUA e pela Colômbia, independentemente das sanções da escola”, reforçaram.

Citando depoimentos apresentados durante as audiências disciplinares de julho, os estudantes reiteraram: “Todas as universidades em Gaza foram destruídas. Centenas de acadêmicos foram mortos. Livros e arquivos foram incinerados. Famílias inteiras foram apagadas do registro civil. Isto não é uma guerra. É uma campanha de apagamento.” A mensagem foi clara: “Não seremos dissuadidos. Estamos comprometidos com a luta pela libertação palestina.”

A ofensiva governamental contra as universidades

A repressão aos protestos universitários não se limita às sanções acadêmicas. O governo Trump tem conduzido uma ofensiva sistemática contra instituições de ensino superior, especialmente as consideradas “de elite”, como parte de uma estratégia mais ampla de combate ao que classifica como “ativismo de esquerda” e “antissemitismo” nos campi.

Os protestos contra a guerra em Gaza, que se espalharam por universidades como Columbia, UCLA e Harvard no ano passado, foram comparados por analistas à era anti-Guerra do Vietnã, quando o ativismo estudantil desafiava diretamente a política externa dos Estados Unidos. Trump aproveitou o momento para retratar os manifestantes como parte de uma revolta esquerdista e antissemita, utilizando o episódio para pressionar as instituições de ensino.

A administração argumenta que as universidades falharam em proteger estudantes judeus de supostos episódios de assédio e violência durante as manifestações, citando incidentes em acampamentos e cânticos considerados antissemitas. Desde o início de 2025, o Escritório de Direitos Civis do Departamento de Educação tem investigado mais de 50 universidades, incluindo a Columbia.

Medidas punitivas e ameaças à autonomia universitária

O que começou com investigações evoluiu para medidas concretas. O governo tem congelado bilhões em bolsas federais para pesquisa e ameaçado revogar o status de isenção fiscal ou mesmo a acreditação das instituições que não se submetem às exigências federais. Harvard, por exemplo, viu bilhões de dólares em financiamento federal congelados após se recusar a permitir que seus programas fossem auditados por supostas “capturas ideológicas”.

A situação se agravou quando o governo ameaçou barrar a entrada de estudantes internacionais em Harvard, alegando “segurança nacional” e altos índices de criminalidade no campus — uma justificativa contestada por especialistas. Diante da medida, Harvard entrou com uma ação judicial e conseguiu um bloqueio temporário de um juiz federal à ordem que proibia a entrada de estudantes estrangeiros.

Essas políticas refletem também a oposição geral do governo Trump aos chamados “vieses liberais” percebidos no ensino superior. A administração tem como alvo específico programas de diversidade, equidade e inclusão (DEI), acusando-os de promover divisão e “discriminação reversa”. Para críticos, a ofensiva representa uma tentativa de impor uma visão conservadora sobre educação, política e valores sociais.

Enquanto os estudantes mantêm sua resistência e os bastidores políticos fervem em Washington, o caso da Columbia e de outras universidades revela um momento delicado para a autonomia das instituições de ensino superior nos Estados Unidos. E, ao que tudo indica, a batalha pelo futuro da liberdade acadêmica está apenas começando.

Com informações de Al Jazeera*

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