A decisão liminar do ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), deve suspender imediatamente e possivelmente levar ao arquivamento dos 66 pedidos de impeachment de ministros da Corte que aguardam análise no Senado Federal.
A medida, revelada por reportagem do O Estado de S. Paulo, limita exclusivamente ao procurador-geral da República (PGR) a prerrogativa de apresentar denúncias por crime de responsabilidade contra integrantes do Supremo. Todos os pedidos atualmente protocolados foram apresentados por cidadãos, parlamentares ou entidades civis.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), mantém desde 2021 uma fila de solicitações para abertura de processos de impeachment contra ministros do STF. Pela Constituição, cabe apenas ao chefe da Casa decidir se arquiva ou envia ao plenário as representações. A decisão de Gilmar Mendes, porém, altera de forma direta esse cenário.
Decisão restringe legitimados e afeta pedidos já apresentados
Ao conceder a liminar, Gilmar Mendes destacou que a medida busca evitar riscos institucionais e preservar a independência do Poder Judiciário. “Trata-se de medida revestida de extrema urgência, dada a indispensabilidade de preservação da independência do Poder Judiciário”, registrou o ministro.
O entendimento restringe a legitimidade ativa para denúncias desse tipo, excluindo cidadãos, associações ou parlamentares. Como todos os 66 pedidos em análise foram apresentados por esses grupos, especialistas afirmam que o efeito imediato é a paralisação completa de qualquer tramitação.
Segundo o professor de Direito Constitucional da USP Rubens Beçak, a decisão tende a alcançar inclusive os processos já em curso. Para ele, há espaço claro para retroatividade: “A lei só retroage em benefício do réu. Se alguém está sendo acusado por meio de um processo de impeachment, é um eventual réu. Então seria natural, na sistemática do direito, que essa decisão retroagisse”, avaliou.
O advogado Acacio Miranda, doutor em Direito Constitucional pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), concorda. Para ele, a liminar “deixa implícito o seu efeito retroativo”, o que tornaria inválidos todos os pedidos apresentados até agora.
Efeitos dependem de julgamento no plenário do STF
Apesar das análises, a decisão ainda será examinada pelo plenário do Supremo. O julgamento ocorrerá no ambiente virtual entre 12 e 19 de dezembro. Somente após essa etapa será possível definir o alcance definitivo da medida.
Na análise do pesquisador Caio Morau, doutor em Direito pela USP, a liminar não extingue imediatamente os processos, mas suspende a tramitação até que o STF finalize o julgamento. “Nenhum dos processos poderá avançar. Eles continuam constando formalmente nos registros do Senado, mas ficam suspensos por causa da medida cautelar”, explicou.
Durante o julgamento, os ministros poderão modular os efeitos, definindo se a regra valerá apenas para novos pedidos ou também para os já apresentados. A modulação será decisiva para a situação dos 66 pedidos estacionados na mesa de Alcolumbre.
Senado já era historicamente refratário a processos contra ministros
Mesmo antes da decisão de Gilmar Mendes, especialistas apontavam que o ambiente político no Senado era desfavorável ao avanço de pedidos de impeachment contra ministros do STF. Em toda a história republicana, nunca um integrante da Corte foi destituído por crime de responsabilidade. Apenas um magistrado chegou a ser afastado em 134 anos.
Por isso, a avaliação é que a liminar apenas formaliza um cenário que já era considerado improvável do ponto de vista político. A prerrogativa do PGR — reforçada pela decisão — tende a reduzir drasticamente a judicialização de disputas políticas por meio de pedidos de impeachment.
Alcolumbre terá de cumprir decisão após julgamento final
Após o julgamento definitivo, caberá ao presidente do Senado aplicar o entendimento do Supremo. Caso o plenário confirme os efeitos retroativos, Alcolumbre deverá arquivar todos os pedidos protocolados sem a assinatura do procurador-geral da República.
Se houver modulação restritiva, preservando a validade de pedidos anteriores, os processos permaneceriam sob sua apreciação individual, mas ainda sem garantia de andamento.
Enquanto o julgamento não é concluído, todos os pedidos permanecem congelados. Para analistas, a tendência é de que o STF consolide um entendimento que limite a judicialização política e fortaleça a atuação exclusiva do Ministério Público em denúncias contra os ministros.


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