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180 dias que abalarão o Brasil: o único antídoto é a rua

Foto: Mídia NINJA 180 dias que abalarão o Brasil Por Saul Leblon, na Carta Maior O angu golpista borbulha mas não dá ponto. O alarido policial-midiático (uma extensão um do outro) difunde ilusões de consenso que embriagam o ambiente conservador. A realidade do golpe, porém, é diferente da propaganda, como ficou nítido nesta 2ª feira, […]

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Foto: Mídia NINJA

180 dias que abalarão o Brasil

Por Saul Leblon, na Carta Maior

O angu golpista borbulha mas não dá ponto.

O alarido policial-midiático (uma extensão um do outro) difunde ilusões de consenso que embriagam o ambiente conservador.

A realidade do golpe, porém, é diferente da propaganda, como ficou nítido nesta 2ª feira, quando o novo presidente da Câmara anulou a sessão que votou o impeachment da Presidenta Dilma Rousseff. O apavoramento que o episódio gerou no golpismo evidencia o medo do que se seguiu: qualquer faísca de esperança levanta o país.

Rapidamente os vigilantes do golpe, tendo à frente as milícias do jornalismo embarcado, cuidaram de sufocar a transgressão ao enredo delicado.

Salvam-se as aparências, mas a inconsistência do angu piora com o aumento da temperatura.

Caminha-se no chão mole de uma ruptura sem solidez, nem horizonte de futuro: um golpe que não se assume, mas que aos poucos é forçado a expor as garras de violência intrínsecas ao risco de se dissolver na contestação.

A impressionante convergência do que há de pior na sociedade –não estamos qualificando pessoas, mas interesses, diagnósticos, métodos, alinhamentos geopolíticos, padrões de civilidade, de jornalismo e, sobretudo, escolhas de desenvolvimento— leva alguns a confundir a borbulha do golpismo, a euforia, com hegemonia.

A aliança do baixo clero parlamentar com a plutocracia, da classe média fascistizada com o antipetismo histérico da mídia, bem como a do judiciário cúmplice com a toga acoelhada compõe, de fato, uma gordurosa coalizão da escória que avança para assaltar o poder no Brasil.

Daí a se confundir essa usurpação com o magnetismo que o uso da palavra hegemonia requer, vai uma grande diferença.

Hegemonia não significa apenas força, ainda que necessariamente a inclua.

Hegemonia implica, sobretudo, consentimento  –algo incompatível  com a natureza própria de um golpe.

Num caso, predomina a conspiração violenta; no outro, a capacidade de pactuar, de liderar, de arrebatar, de convencer, de arregimentar, enfim, de mobilizar corações e mentes para empreender o passo seguinte na vida de uma nação.

Quem o faria ? Temer?

Serra? Jucá…

…Janaína Paschoal?

O que esses timoneiros lograram de mais visível, com escoltas de nível equivalente na mídia e no judiciário, foi arquitetar o sequestro de um mandato portador de 54,5 milhões de votos.

O feito apoia-se em um massacre propagandístico só equivalente, ou superior, ao que antecedeu o golpe de 1964.

O que se conseguiu até agora foi gerar turbulência institucional, paralisia econômica, incerteza nos segmentos majoritários da sociedade, repulsa nas fileiras democráticas e apoio efetivo restrito a camadas conservadoras e na renda alta adestrada na crispação midiática.

Em uma sociedade trincada na vertical pelo esgotamento de um ciclo de expansão, essa dissolução apenas magnifica o desafio de se erguer linhas de passagem para um novo espaço de futuro.

O repertório que o golpe teima em enfiar goela abaixo da sociedade configura tudo menos a ‘ponte para o futuro’ que o publieditorial do jornalismo econômico acena para os mercados.

O que se preconiza, de fato, é  um  lacto purga em dose concentrada do arrocho neoliberal sistematicamente rejeitado pelas urnas em 2002, 2006, 2010 e 2014.

Esse é o embasamento histórico do golpe.

Se lograr êxito abrir-se-á uma temporada de 180 dias que abalarão o Brasil.

Um regime de exceção, dirigido por um agrupamento de interesses excludentes, tentará então  a temerária imposição ao país de protocolos e diretrizes não pactuados nas urnas, tampouco negociados em grandes mesas nacionais para as quais, inclusive, não dispõe de mandato e tampouco de mediadores reconhecidos.

Escavar um fosso entre a representação política da sociedade e o poder de decisão sobre o destino do seu desenvolvimento é tudo o que a ganância cega das plutocracias pode almejar como êxito.

Isso dificilmente conseguirá prosperar em ambiente de vigência das liberdades democráticas.

Tampouco o sucesso nos seus próprios termos é plausível –ainda que a economia esteja no fundo do poço por conta, inclusive, de uma greve do capital golpista e alguma reação deva ocorrer.

Há inconsistências maiores, porém, que limitam o fôlego dessa empreitada.

Desdenhar dos partidos e entregar o destino da sociedade a uma lógica cega que se avoca autossuficiente e autorregulável, foi justamente o que se fez nas últimas décadas no mundo capitalista.

O corolário desse voo cego foi a crise sistêmica de 2008, da qual a economia internacional está longe de haver superado.

O golpe aposta suas fichas em ‘crescer para fora’  e ‘arrochar para dentro’  na crença em uma recuperação global da qual o próprio Fed duvida,  tendo renunciado a novas altas nas taxas de juros por isso, e a Europa, a cada dia, tem menos razões para acreditar.

Não há demanda no mundo depois de 40 anos de dilapidação neoliberal de direitos sociais e trabalhistas e do esgoelamento fiscal dos Estados nacionais, que abdicaram de arrecadar para se endividar. Hoje não dispõem de fôlego  nem de ferramentas (banco públicos de desenvolvimento, por exemplo) para investir e arrastar o capital privado, viciado na cocaína rentista.

A ilusão de que  replicar a receita fracassada da ortodoxia será suficiente para fazer decolar a economia brasileira explica o desdém com a crise de  hegemonia que move o golpe e, paradoxalmente, irá paralisa-lo logo em seguida.

A solução rasa e repetitiva do arrocho fiscal (corta, corta, corta) e monetário (juro alto) reflete um campo de visão de classe, endogenamente estreito.

O Brasil plano, feito de desafios monocausais, infantilmente atribuídos ao ‘lulopetismo’ pelo doutrina colegial do jornalismo conservador, simplesmente não existe.

O relevo econômico do país inclui-se entre as encostas mais acidentadas do capitalismo mundial, graças à tradição secular de predadores, ora abrigada sob as asas do timoneiro Temer.

O que se desenha para os próximos 180 dias, assim, é um condensado acerto de contas de velhas e novas pendências trazidas de uma espiral histórica de confronto e crispação que se acomodou brevemente no ciclo de expansão recente (2004/2012), mas cuja recidiva explodiu com octanagem redobrada pela perspectiva de se quebrar o ciclo de treze anos de governos progressistas no país.

Com um agravante.

A paralisia econômica fundiu-se ao  enrijecimento de um sistema político incapaz de prover as condições, canais e  instrumentos requeridos à repactuação do  passo seguinte do desenvolvimento brasileiro.

Herdado do ciclo da redemocratização, o sistema político do país reflete uma transição tutelada que inoculou no DNA da sociedade a incapacidade para renovar-se.

O insulamento de uma representação política tragada pelo círculo vicioso dos interesses autorreferentes, culminou, assim, com a captura da nação por uma escória parlamentar liderada por um maestro da vigarice.

Desse ovo nasceu a serpente que agora almeja usurpar o mandato de uma mulher honesta em benefício de projetos e agentes que nunca dispuseram de voto para derrota-la.

O único antídoto a essa mistura de esgotamento e desespero conservador é a rua.

Sem votos, o chão firme dos interesses conservadores apoia-se  em duas hipertrofias –a do judiciário e a da mídia.

Ambas são   insustentáveis se a sociedade se erguer e se mobilizar, não aquecida por um incêndio passageiro.

Mas organizada de forma propositiva e assertiva na definição do que se aspira para a cidadania e a economia, com base em uma tríade:  redemocratização, desenvolvimento e  repactuação nacional.

O governo legítimo –o da Presidenta Dilma—deve organizar uma agenda de resistência que contemple essas prioridades, traduzindo-a em um calendário de 180 dias de atividades.

Incluem-se aí debates, fóruns, mesas de negociação e conferências regionais por todo o Brasil , até desembocar no final do processo em uma gigantesca Conferência Nacional da Democracia e do Desenvolvimento, para sacramentar uma frente política e um Plano de Ação –para voltar ao governo ou para concorrer em 2018.

Portanto, não se trata apenas de derrotar um golpe manco.

Mas de faze-lo desbravando um novo caminho, com uma nova frente de forças, capaz de empolgar o país com as possibilidades renovadas para o seu desenvolvimento, graças ao poder revigorado da democracia de dizer sim e não ao mercado.  

Isso é o que pode fazer dos próximos 180 dias a sepultura do golpe. E mais que isso:  o renascimento da esperança no país que poderíamos ser,  mas que ainda não somos.

A ver.

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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Macau

11/05/2016 - 15h18

Só discutindo e representando MUITO agora. Se não aproveitarmos esses 6 meses para juntarmos forças, não vamos ter futuro.

Clarivaldo Freire

11/05/2016 - 10h39

Vamos ver se com as novas filiações o PT volta a ser PT e volta a fazer política com grandeza. Saudades dos núcleos de base…


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