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Mangabeira Unger: As Forças Armadas e o abandono da Defesa

Orientação pacífica não nos exime de nos defender Por Roberto Mangabeira Unger A Defesa do Brasil está abandonada. O gasto na Defesa, medido como participação no PIB, cai desde 1995, com apenas dois momentos de recuperação —em 2001 e de 2008 a 2010. Os gráficos que demonstram, nesses últimos 25 anos, as participações da despesa […]

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1017_submarino_tamoio Navios de guerra e de patrulhamento em ação na costa brasileira

Orientação pacífica não nos exime de nos defender

Por Roberto Mangabeira Unger

A Defesa do Brasil está abandonada. O gasto na Defesa, medido como participação no PIB, cai desde 1995, com apenas dois momentos de recuperação —em 2001 e de 2008 a 2010. Os gráficos que demonstram, nesses últimos 25 anos, as participações da despesa primária da União e da Defesa no PIB revelam curvas inversas. Aquela só sobe. Esta desaba.

Nosso gasto em Defesa caiu a 1,4% do PIB, comparável à Argentina, que, com suas Forças Armadas destroçadas, gasta 1,3%, e inferior ao Chile, que gasta perto de 1,9% —ou, para tomar o exemplo de outro país continental em desenvolvimento, à Índia, que gasta 2,4%. O mais grave é o descompasso entre o aumento, de ano a ano, do gasto em pessoal e a queda do investimento, que, para 2019, ameaça ser substancialmente menor, em termos tanto absolutos como relativos, do que foi, depois de anos de estagnação, em 2018.

As Forças lutam, como sempre fizeram em períodos de aperto, para preservar a formação dos oficiais e os projetos mais importantes. Estão perdendo a batalha. Quase ninguém protesta. Isso ocorre sob o governo com maior presença de militares em nossa história: maior do que nos governos do regime militar.

Dou três passos de um raciocínio para explicar o significado desse descalabro.

O primeiro passo é relembrar por que precisamos nos defender. O Brasil é o menos beligerante dos países grandes na época moderna e o único que ascende sem querer imperar. Nossa orientação pacífica não nos exime de nos defender. Nenhum país se desenvolveu com Defesa fraca. Não há desenvolvimento sem afirmação rebelde de caminho nacional. Para desbravá-lo, é preciso poder dizer não. E não interessa a nós —ou à humanidade— viver num mundo em que só os amigos da paz estão desarmados.

O segundo passo é compreender o que aconteceu com a Defesa do Brasil nesse último quarto de século. A tradição dos governos civis tem sido a de não levar a Defesa a sério, porém aplacar os militares com concessões a suas reivindicações corporativistas e a seus pedidos de equipamento. A exceção mais notável ocorreu sob o governo de Epitácio Pessoa e um ministro da Guerra civil, Pandiá Calógeras, quando se promoveu a maior reconstrução da Defesa dos últimos cem anos, com o apoio de movimento civil, liderado pela Liga de Defesa Nacional.

O projeto da Estratégia Nacional de Defesa de 2008 é esse: Defesa para valer, liderança civil. Os grandes eixos, transformados em lei, cujo cumprimento parou nas medidas preliminares, são: capacitar as Forças para flexibilidade, mobilidade e monitoramento; construir o complexo industrial da Defesa como manancial de vanguardismo produtivo e tecnológico para toda nossa economia; e reafirmar a participação de jovens de todas as classes, não apenas de rapazes pobres, na Defesa do país. As Forças Armadas do Brasil nunca devem ser parte da nação paga pelas outras partes para defendê-las. Devem ser a própria nação em armas.

O terceiro passo é entender o que ocorre agora. Rompeu-se, de ambos os lados, o contrato implícito na Estratégia Nacional de Defesa. Os militares ganharam o Ministério da Defesa. A Defesa ficou ao relento. Soldo e pensão de militar são o que se discute. Esquecida em tudo o que importa, a Defesa virou, com o lançamento das escolas cívico-militares passadistas, incidente nas guerras culturais a que se dedica o governo Jair Bolsonaro (PSL).

Algumas das maiores lideranças das Forças Armadas, patriotas que dedicaram suas vidas à nação, emprestam seu prestígio a governo que deixa o Brasil indefeso, alardeia submissão aos Estados Unidos e renuncia a qualquer estratégia nacional de desenvolvimento que não se resuma a agradar os mercados financeiros. O Brasil afunda na estagnação e na mediocridade.

Levante-se, povo brasileiro, para opor-se a esse plano contra a pátria. Assuma a tarefa sacrossanta de resguardar o Brasil.


Roberto Mangabeira Unger

Professor na Universidade Harvard (EUA), foi o principal formulador da Estratégia Nacional de Defesa, promulgada como lei em 2008; ex-ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos (2007-2009 e 2015, governos Lula e Dilma)

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Comentários

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João Ferreira Bastos

16/09/2019 - 13h36

as ffaa abdicaram de sua primeira e primordial função: Defender a Patria.

acabem com a inútil e perdularia ffaa


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