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Lenio Luiz Streck: STF tem de mostrar que a imparcialidade é sagrada e Moro foi um herege

Por Lenio Luiz Streck, Marco Aurélio de Carvalho e Fabiano Silva dos Santos*  Em uma de suas crônicas, Luis Fernando Verissimo brinca com contradições performativas, dizendo algo como: “Não fossem os 6 milhões de mortos, Hitler até que…”, “não fossem as torturas e censuras, a ditadura militar até que…”, “não fosse o desfalque no banco, meu […]

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Por Lenio Luiz Streck, Marco Aurélio de Carvalho e Fabiano Silva dos Santos* 

Em uma de suas crônicas, Luis Fernando Verissimo brinca com contradições performativas, dizendo algo como: “Não fossem os 6 milhões de mortos, Hitler até que…”, “não fossem as torturas e censuras, a ditadura militar até que…”, “não fosse o desfalque no banco, meu primo até que seria um bom cara”, e assim por diante.

Daí a ironia: “Não fosse Moro um juiz suspeito, parcial, que fez conluio com a acusação, seria um bom juiz”. São frases autocontraditórias. É como dizer “eu estou morto”, ou, tanto pior, “em nome da liberdade, eu quero o AI-5”. 

O Direito não funciona assim. Nele está vedado esse tipo de contradição. Nele se proíbe “prova ilícita de boa-fé”, como queriam Sergio Moro e Deltan Dallagnol no projeto das tais dez medidas. Também não vale no direito a máxima de que “os fins justificam os meios”. Ou, ainda, de que “é proibido vazar os diálogos de Lula e Dilma, mas vazarei”. 

O que isso tem a ver com o processo da suspeição de Moro que está no Supremo Tribunal e com as mensagens da Operação Spoofing, agora periciadas pela Polícia Federal? Tudo. Porque demonstram, com detalhes sórdidos, a cumplicidade entre o juiz e a acusação. Combinação de provas, conselhos, reuniões, troca de informações, ironias e desdém para com determinados e específicos acusados, quebra de acordos internacionais, desprezo pela Constituição, tudo o que qualquer estudante de direito aprende que um juiz não pode e não deve fazer.

Mas o juiz fez. E o acusador fez. E fizeram juntos. Nunca na história de um Estado Constitucional se ouviu falar em tamanha conspiração judicial mediante lawfare, o uso político do direito contra os inimigos. Os procuradores Dallagnol e Januário Palumbo escancaram o lawfare, ao dizer que as garantias processuais eram só “filigranas” e que o que valia era, mesmo, a política. Tudo confessado. Tudo periciado, embora Moro continue a ser, pateticamente, um negacionista. 

Pois é. Os que têm a ousadia de sustentar que “tudo o que ocorreu foi normal” até podem usar com certo grau de coerência as ironias de Verissimo. Algo como: “Não fosse a falta de isenção, não fosse o fato de Dallagnol querer e usar a imprensa para pressionar tribunais, não fosse o criminoso vazamento dos diálogos de Lula e Dilma,  não fosse o lado assumido pela força-tarefa (entre o Diabo e o Coisa Ruim) confessado pelo procurador Carlos Lima em rede nacional, não fosse a subserviência de Deltan Dallagnol ao juiz Moro, não fosse a tentativa da constituição de um fundo ou fundação por parte dos integrantes da Lava Jato – fulminada pelo STF –, não fosse tudo isso, até que…”!

Falemos, pois, a sério. Uma democracia exige o rule of law, que é mais do que Estado de Direito. Direito é uma questão de meio, não de fim. Não vale estuprar em nome da continuidade da humanidade, para parafrasear um velho adágio. Por isso, os defensores da Constituição não podem aceitar qualquer tentativa de “passar panos quentes” nas ilicitudes cometidas pelo juiz Sergio Moro e a força-tarefa. Não dá para salvar o “insalvável”. Todos os atos tramados pela acusação em conjunto com o juiz e as quebras das garantias e dos tratados internacionais são chamados, em um país sério, de ilicitudes originárias. 

Por isso, temos de ficar atentos a uma espécie de “puxadinho hermenêutico” que se pode querer fazer para salvar um dos processos, o do sítio de Atibaia, que, segundo seus defensores, “não seria nulo” (sic) porque não foi Moro quem sentenciou, e sim a juíza Gabriela Hardt. Ora, não se pode concordar com eventual “tese” de separação entre a fase de produção da prova e a fase da sentença neste processo. Aliás, pelo que se apurou, a juíza fez “um cópia-e-cola” da decisão de Moro.

Este caso, como todos os outros conduzidos pelo então juiz Sergio Moro, começou pelo fim. O juiz atirou a flecha e depois pintou o alvo. Ilicitude originária ocorre quando a raiz da árvore envenena o fruto. Os diálogos mostram a dimensão da peçonha. Não foi por nada que os norte-americanos deram a essa tese o nome de “frutos da árvore envenenada”. 

É preciso que o STF dê um basta. E diga que o processo penal não é joguete nas mãos de gente ávida por projetos políticos. O Supremo tem de mostrar para o Brasil que a imparcialidade é sagrada. E que Moro foi um juiz herege. As mensagens revelam que não dá para fazer discursos autocontraditórios. Assim, se o juiz se fez de acusador, na própria investigação feita pelo Ministério Público existe uma ilicitude originária. Não há “puxadinho hermenêutico” que salve. E, fundamentalmente, não se diga que as mensagens, porque produtos do trabalho de um hacker, não podem ser usadas. Ora, houve perícia e as mensagens valem como prova a favor da defesa. Isso se aprende no primeiro ano de qualquer faculdade. 

O Brasil, especialmente o STF, tem de seguir o exemplo do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, que adota a teoria da aparência: ele exige não só a imparcialidade do juiz; ele exige a aparência da imparcialidade e de justiça. A tese é: Justice must not only be done; it must also be seen to be done, inspirada no caso Rex vs. Sussex Justices, (1924) (UK). Como a mulher de César, não basta o juiz ser imparcial; tem de parecer imparcial. O lema é: Nada deve ser feito que crie até mesmo a suspeita de que tenha havido uma interferência indevida no curso da justiça. Encaixa como luva, não? Ou seja, a Constituição do Brasil e o Tribunal Europeu abominam o modelo “juiz Larsen” (Caso Hauschildt vs. Dinamarca), para citar apenas um exemplo.  

Os juristas brasileiros podem e devem buscar inspiração no Tribunal Europeu. Por lá, juízes e procuradores como Moro e Dallagnol não “formam”. Como será aqui? Seria muito ruim que, depois do julgamento pelo Supremo, alguém dissesse: “Não fosse o fato de o STF ter deixado passar todas as ilegalidades, até que foi um bom julgamento”. Confiamos no Supremo Tribunal Federal e no papel constitucional para o qual foi desenhado.

*Lenio Luiz Streck é jurista, professor e advogado; Marco Aurélio de Carvalho é advogado e coordenador do Grupo Prerrogativas; Fabiano Silva dos Santos é advogado e professor.

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Edson Luiz Pianca

10/02/2021 - 01h10

Alexandre,

Li Lênio Luiz Streck outras vezes, sempre sobre o caso Lula – Moro; sempre como advogado advogando. Ele está no seu papel de advogado de defesa, mesmo quando como militante de causas políticas. É bom advogado.

Li manifestações suas, aqui no ‘ocafezinho’, sobre diversos temas, especialmente sobre o PT e também sobre o caso Lula – Moro. Sempre como partidário petista. Você é um bom militante.

Estive por vinte e seis anos ocupado com direito tributário. Não como advogado: fui por mais de duas décadas auditor fiscal de tributos.

Logo ao tomar posse no cargo – eu ainda era bem novo – percebi que a autoridade da qual eu estava investido era da Lei. Não era eu a autoridade. Era da Lei a investidura que eu tinha para indicar penas e para sustentá-las nas instâncias de recursos. E, sim, aprendi também que havia os ritos.

A visão que eu tenho dos ritos de que se reveste o processo legal é a de que os ritos têm papel apenas acessório. Não está no rito nem o delito, nem o juízo. Penso que o rito, o que for acessório, desde que tempestivo, em uma visão moderna de operação do direito precisa sempre ser passível de ser saneado. Qualquer abordagem conveniente por parte de advogados ou de agentes públicos, transferindo a essência do dolo para o que é acessório e não para o delito e para as provas do delito, só resulta em impunidade para o delinquente.

Não sei se o ex-juiz Sérgio Moro é inocente ou culpado daquilo de que é acusado. Quero que seus atos sejam julgados. De tudo o que li, só vi inadequações legais por parte de Sérgio Moro. Mas ele pode ter incorrido em crime. O juízo de ele ser culpado ou inocente será, diante das provas, de quem couber julgá-lo.

Moro condenou os réus com as provas que estão nos processos. Se as provas são reais, não vejo porque anular decisões repetidas, e à unanimidade, de condenações de mais de um conselho colegiado que revisa os procedimentos legais do julgamento feito pelo juiz natural da causa. Se o ex-juiz Sérgio Moro forjou as provas que usou para condenar os réus, que os réus sejam inocentados e o ex-juiz condenado.

Não sei se Lula é culpado ou inocente. Ninguém sabe! A sua culpa ou inocência está nas provas arrecadadas e juntadas aos processos. Eu prefiro um modelo jurídico que não protele a decisão até ao propiciamento de impunidade. Também não gosto de punições excessivas, com penas pesadas para um único crime, não continuado, e que não seja crime contra a vida. Mas no caso de crimes de corrupção, no Brasil, nós sabemos que as condenações são leves, para favorecer os que detêm poder econômico ou político.

Afora isso, e mais pessoal, a única definição que tenho sobre a vida é a de que ‘a vida são as coisas que acontecem’; e a única definição que tenho sobre mim é a de que ‘eu sou um homem vivendo’. E vivo sobre uma ordem jurídico-política que não me serve de cidadania.
Tanto mais motivo para me posicionar sobre a vida, que é sempre política, deve estar sempre aberta e submetida ao escrutínio dos viventes. Especialmente quando se tratam de coisas públicas.

Evito opinião, mas nós sabemos que em muito isso é impossível. Quando opino – ou quando penso – busco sempre o conselho dos dados e dos fatos, que respeito. E evito exercer a paixão em juízos que são de todos. Procuro fazer com que minha paixão não seja militante. Minha paixão diz respeito somente a mim; sequer diz respeito a minhas mulheres amadas (Se bem que esta está sendo uma fase em que estou um tanto rejeitado pela paixão delas).

O que levantei no texto abaixo (coloquei este texto aqui porque o tamanho das letras no meu tablet estão grandes para escrever e para receber textos. Os textos como segunda respostas não estou conseguindo ler), mas, retomando, o que levantei no texto escrito mais abaixo, que você respondeu, é mais simples: nos casos assimilados ao que eu ilustrei, do goleiro bruno, do time do Flamengo carioca, que mandou assassinar a mãe de um de seus filhos, se constatado que agentes públicos, juízes incluídos, por messianismo, no intento de fazerem justiça, tiverem incorrido em inadequações que possam ser classificadas como delitos, mas delitos sobre o que configure apenas procedimentos acessórios do processo, sendo que as provas do crime usadas para a condenação não foram forjadas pelos agentes públicos, deve-se anular todo o processo, a despeito de as provas do crime serem reais e de a condenação já ter passado por outros julgamentos de correção?

Abraço, Alexandre. Tenho apreço por você. Nossas concepções sobre a prática política diverge, mas estou certo de que possuímos a mesmas intenções em relação ao drama social. Uma das nossas diferenças talvez seja a de eu conceber que minha visão mais à esquerda pode não ser a solução inteira do drama. Eu penso que a visão de direita é parte necessária ao processo social, e uma visão tão legítima quanto a minha.
– não identifico o grosso dos partidos e de deputados como de direita. Eles não são motivados e não estão interessados em ideologia, apenas cuidam de interesses puramente pessoais. Se eu os identificar como de direita eu banalizo o conceito. Já a direita, essa é importante e tem meu respeito.

EdsonLuiz.

08/02/2021 - 17h05

É um texto de advogado. Não um texto de advogado discutindo tese; é um texto de advogado advogando.
Parece muito bom advogado. como advogado, se precisasse, eu o contrataria.

Mas proponho uma tese. É sobre um crime de outra natureza. O escolho para afastar paixões partidárias. Mas mesmo assim, é sobre provas, inadequações e crime.

Vamos à tese:

Há alguns anos o goleiro bruno, do time do Flamengo carioca, mandou que assassinassem uma mulher, mãe de um filho seu.

A jurisprudência para o caso, não faz muito tempo, era a de só condenar alguém por assassinato se aparecesse o corpo, mas o corpo não apareceu. Como essas coisas do direito legal atendem à cultura, e portanto mudam, este tipo de caso passou a ter condenação sempre que fosse ‘firmada convicção acima de qualquer dúvida’. Claro: acima de qualquer dúvida é certeza ainda mais certa que um mero aparecimento de corpo. Afinal, é possível desaparecer com um corpo e não sobrar dele nenhum resquício.

Feitas as investigações, juntadas as provas testemunhais e provas materiais conseguidas, o goleiro bruno foi condenado. O corpo da sua vítima não apareceu, mas foi possível aos julgadores ‘firmar convicção acima de qualquer dúvida’. O goleiro bruno paga a pena até hoje.

A tese que proponho: Caso agora fosse verificado que houve combinação, contato, interação, troca de informações entre os agentes públicos responsáveis pelas investigações, incluindo juízes e promotores de justiça, para a condenação do assassino, sendo que as provas coletadas eram todas idôneas, que nenhuma prova foi forjada, e, portanto, o assassino é realmente assassino, ele realmente mandou matar sua vítima: o julgamento deve ser anulado? O goleiro bruno deve ser inocentado, liberto, e a ele, nós, a sociedade, o Estado brasileiro, deve pedir desculpas? Talvez até indenizá-lo? Talvez até os agentes públicos, juízes juntos, devem ser condenados e presos?

Ou, sim, os agentes públicos devem ser investigados e julgados. Se ficar demostrado que eles forjaram provas para condenar, eles é que devem ser condenados e presos e o goleiro bruno inocentado e a ele devolvida a liberdade retirada e ser lhe pedidas desculpas. Mas se o que ocorreram foram apenas inadequações legais, sendo que as provas para condenação foram reais, não foram forjadas pelos agentes públicos, os que incorreram nas inadequações legais devem receber as penas cabíveis e o condenado, uma vez que as provas sejam legais, deve ter mantidas as suas condenações e pagar suas penas?

Observo que falo em tese. Não sei se quem foi julgado pelo ex juiz Sérgio Moro forjou as provas ou se só interagiu para suprir vazios da legislação penal, mas usou provas legais. Para revisar e dirimir isso há as várias instâncias colegiadas de revisão.

Qual entendimento é mais desejável e qual é mais viciado e por isso não aprimora o arcabouço legal?

Se as provas foram legais e tribunais colegiados, sem a prática de inadequações, também julgou e manteve as condenações centenas de vezes, devemos anular tudo?

Porque alguém quer e, para os que querem, só pode ser desse jeito?

    Alexandre

    09/02/2021 - 01h42

    Meu caro Edson, pelos seus textos vejo que você é uma pessoa correta, com boas intenções. Não sei se devo, mas vou te dar um toque: você deveria medir melhor suas palavras ao abordar temas jurídicos, sob pena de parecer leviano. Diz o ditado que não deve ir o sapateiro além das tamancas. Sou a favor de que as pessoas opinem sobre os mais diversos assuntos, não acho que mesmo temas técnicos devem ficar restritos aos entendidos, mas entrar na seara alheia requer cuidado. O direito é cheio de sutilezas e pequenos detalhes que mudam todo o resto.

    Faço questão de elogiar o blogue quando publica texto do Lenio Streck, pois o cara é bamba. É um grande jurista, que domina o assunto como poucos. É aposentado pelo Ministério Público do RS e tem vários livros publicados. É um cara íntegro, que chama a atenção para o ataque que o Direito vem sofrendo por decisões estapafúrdias. É um crítico contumaz das malfadadas 10 medidas, por fascistas. Vou replicar o link do último artigo publicado por ele:

    https://www.conjur.com.br/2021-fev-08/lenio-streck-recuperar-direito-plano-deltan

    Espero que você tenha a sorte de nem você nem algum familiar ou ente querido passar por um julgamento tal qual Lula sofreu, em que há conluio entre juiz parcial e acusação. Entendo que muita gente pense como você, afinal de contas a Lava Jato foi uma construção de narrativa em ritmo de telenovela da Globo, bem maniqueísta, com mocinho e vilão. Imagino que deve ser duro para um adulto se dar conta de que caiu no conto do vigário. Por fim, vou replicar um texto também de hoje, de alguém que não é do ramo para comprovar que não só pessoas com formação na área possam discorrer sobre o assunto. Demétrio Magnoli é sociólogo e antipetista ferrenho, mas sabe reconhecer quando está ante um descalabro. Os ministros do STF que ele cita no fim do artigo são os três luíses: Fux, Barroso e Fachin, três porcarias nomeados pelo PT.

    DEMÉTRIO MAGNOLI – Moro, o ‘nada jurídico
    COLUNISTAS
    segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021 – 03:47

    O Globo / Opinião
    Cenário Político-Econômico: Colunistas
    Rosangela Moro, advogada do marido, acionou o STF pedindo a Fachin a revogação da liminar de Lewandowski que dá à defesa de Lula acesso às mensagens trocadas entre Sérgio Moro e os procuradores da força-tarefa de Curitiba. A reclamação ilumina o desprezo do Partido da Lava-Jato pela verdade factual e, ainda, pela verdade jurídica.

    A peça da advogada repete as duas alegações básicas do ex-juiz e dos procuradores: 1) “Não há prova da autenticidade das mensagens”; 2) As mensagens “não provam fraude na condenação ou suspeição do juiz”.

    A primeira afirmação é uma tentativa de circundar, por um artifício jurídico, a questão da verdade factual. Temendo cometer perjúrio, os acusados não declaram que as mensagens são falsas – mas referem-se a elas como se fossem diálogos entre terceiros desconhecidos sobre os quais nada sabem.

    A segunda afirmação, se verdadeira, tornaria a primeira desnecessária. Afinal, se os diálogos não contêm ilegalidades, por que não admitir sua autenticidade? Contudo, como as trocas de mensagens evidenciam graves violações da lei, a advogada tira da cartola um terceiro coelho manco e solicita a eliminação processual delas: seriam um “nada jurídico”, devido aos meios ilegais utilizados na sua obtenção.

    Nos diálogos. Moro oferece orientações aos procuradores sobre fontes, os instrui sobre possíveis provas e combina com eles a sequência de operações policiais. São evidências abundantes de conluio entre o Estado-julgador e o Estado-acusador. A gangue de Curitiba suprimiu do processo legal o juiz imparcial.

    A verdade jurídica não é idêntica à verdade factual, pois a segunda só se torna a primeira quando percorre a estrada do devido processo. Sorte de Moro e de seus comparsas: a verdade factual expressa nas trocas de mensagens seria suficiente para condená-los por subversão do processo legal, se não tivesse vindo à luz pelo túnel da ilegalidade. Tal circunstância não implica, porém, a completa invalidação jurídica dos diálogos criminosos.

    A jurisprudência não admite o uso de provas obtidas ilegalmente para condenar alguém, mas permite utilizá-las para sustentar a presunção de inocência. Lula pode até ser factualmente culpado – mas, na vigência do estado de direito, não é possível condená-lo ao arrepio do devido processo. E dever do STF anular as sentenças condenatórias do líder petista tingidas pela mão de gato de Moro.

    Moro enxerga a lei como fonte de privilégios e discriminações. No pacote anticrime que formulou quando ministro de Bolsonaro, introduziu o “excludente de ilicitude”, mecanismo destinado a impedir a punição de crimes cometidos por policiais. Na reclamação ao STF, sua advogada alega que as trocas de mensagens “não provam inocência” de Lula, como se cidadãos acusados tivessem o ônus de provar ausência de culpa.

    “Nada jurídico” – o qualificativo não serve para invalidar os diálogos que repousam no STF, mas define à perfeição os processos conduzidos pelo Partido da Lava-Jato. As mensagens expõem acertos entre o juiz e os procuradores para plantar notícias na imprensa e financiar a divulgação de propostas legislativas, além da ambição de reformar o sistema político-partidário. Nada jurídico, tudo político : a gangue manipulava suas prerrogativas de agentes da lei para deflagrar um projeto de poder centrado na figura de Moro.

    A demanda da advogada ao STF pretende soterrar tanto a verdade factual quanto a jurídica. A guerra contra a verdade tem a dupla finalidade de evitar a desmoralização jurídica da gangue e de conservar os resíduos de um projeto político envenenado pela associação de Moro com Bolsonaro.

    Na hora da morte da força-tarefa, o Partido da Lava-Jato conta com três fiéis militantes no STF. Mesmo assim, diante do grito das evidências, a manutenção integral das condenações tornou-se um sonho improvável. Circula, por isso, a ideia criativa de preservar, ao menos, o legado da interdição de candidatura de Lula. “In Fux We Trust”: o compromisso imoral concluiria, melancolicamente, a trajetória de juízes que confundem a lei com suas próprias convicções políticas.

Alexandre Neres

07/02/2021 - 23h26

Parabéns ao Cafezinho por replicar textos do jurista Lenio Streck. Pra ver se ilumina a cabeça de alguns obtusos que são piores do que o gado bolsonarista. Caíram no conto do vigário lavajatista ao acreditarem no conluio entre os maiores crápulas do sistema judicial pátrio. Outros supostamente progressistas repetem o discurso moralista e lavajatista da Globo. Não enxergam um palmo diante do nariz, são como papagaios de pirata, vira e mexe e falam, ah, mas a corrupção. Todo o processo instaurado contra Lula começou pelo fim. Já tinha a condenação, pois o objetivo era tirá-lo das eleições de 2018, e foram construindo a narrativa para se ajustar à decisão tomada de antemão. Então, provavelmente não irá esclarecer nada, esses velhacos e oportunistas continuarão repetindo suas baboseiras cheirando a naftalina. São incapazes de reconhecer que compactuam com a barbárie. Já ouviram falar do caso Dreyfus, suas toupeiras? De todo modo, parabenizo o blogue por ao menos fornecer ferramentas para quem quiser enxergar o óbvio, para quem não abdicou de pensar.

    Renato

    08/02/2021 - 13h04

    Texto do jurista Lenio Streck iluminar obtusos ? A única coisa que os textos do Lênio iluminam é o caminho dos corruptos; daqueles que roubam milhões e nunca pagam pelos seus crimes. Para Lênio e sua turminha (Kakay, Carol Proner , grupo Prerrogativas,etc) só é boa a imparcialidade de Gilmar Mendes , Lewandowski, Tóffoli e , agora , Kássio Nunes. A imparcialidade de Fux, Fachin, Rosa Weber, Alexandre de Morais , Barroso e Carmem Lúcia não presta. Para Lênio e sua turminha , parcialidade só vale quando é a favor do corrupto; contra o corrupto não vale. Depois de 18 anos sem julgamento definitivo, os crimes da Máfia dos Fiscais do Rio estão prestes a prescrever e , pasmem, o dinheiro da corrupção pode voltar aos acusados. O Major que comandou a tortura e a morte do Amarildo, condenado a mais de 13 anos , foi há pouco reintegrado ao quadro de oficiais da PM/RJ. É dessa justiça e dessa imparcialidade que Lênio e sua turminha gostam !


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