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Streck e Chaer: De como o jargão jurídico induz o vulgo a ver injustiças na Justiça

Por Lenio Luiz Streck e Márcio Chaer O idioma jurídico costuma confundir o povo. Expressões como “incompetência”, “trânsito em julgado” ou “pedido de vista” atrapalham o raciocínio. Sem falar em “dívida ativa”, que significa o contrário da expressão ou “delegacia de roubo a bancos”, que dispensa apresentações. E os embargos? Desembargador é quem (des)embarga? Enfiteuse é ofensa? […]

26 comentários
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Por Lenio Luiz Streck e Márcio Chaer

O idioma jurídico costuma confundir o povo. Expressões como “incompetência”, “trânsito em julgado” ou “pedido de vista” atrapalham o raciocínio. Sem falar em “dívida ativa”, que significa o contrário da expressão ou “delegacia de roubo a bancos”, que dispensa apresentações. E os embargos? Desembargador é quem (des)embarga? Enfiteuse é ofensa? Ou “você é um aluvião”? O depositário é fiel ou infiel? A esposa dele sabe? E será que cabe candidato a vice em “eleição de cabecel”? Mas, cuidado, muito cuidado, porque “in rebus sic stantibus“.

A coisa fica feia quando se diz que um suposto criminoso foi solto por falta de imparcialidade do juiz ou porque a “denúncia” contra ele era anônima. Difícil explicar que essas metáforas ou alegorias escondem coisas horrorosas. Por vezes, um certo jus-proxenetismo.

O dono da padaria que ouviu dizer que Lula foi inocentado porque Sergio Moro faltou com o princípio da imparcialidade vai comparar a falha do juiz à infração de uma regra de etiqueta. Algo como ter colocado o guardanapo à mesa do lado errado. E dirá: quanta frescura. Quanta bobagem. E espalhará a notícia de que o juiz fez o certo; o garçom é que errou.

Não é bem assim. A guilda de Curitiba intrujou o processo. Escondeu provas. Mentiu para os tribunais. O juiz mandou grampear advogados. Os procuradores tentaram, mediante uma “foundation” (em inglês é mais chique), amealhar quantias bilionárias. Fabricou notícias fraudulentas para aterrorizar desembargadores e ministros, bastando, para tanto, ver, agora, a reação do STJ.

De abusos em abusos, somando e dividindo, dá empate com muitos réus, mesmo jogando no estádio errado (a CBF, quer dizer, o STF, já disse que o jogo não poderia ter sido disputado em Curitiba e que o juiz era de fora).

O enredo é de todos conhecido: autoridades (um juiz, secundado por procuradores) foram absolutamente parciais (agora incompetentes), o que quer dizer “tomaram lado” e usaram o direito para perseguir um adversário. Escolheram entre o diabo e o coisa ruim, disseram.

O Supremo Tribunal Federal, finalmente, disse que o árbitro do jogo marcou pênalti no meio do campo. Mas o dono da padaria continua dizendo que o problema está no guardanapo.

Mas não é só o padeiro. Jornalistas e jornaleiros dizem que isso tudo foi firula. Moro está certo, sustentam. Ele “apenas” quebrou algumas regras de “etiqueta”. Afinal, qual é o problema de o juiz mandar escutar, à socapa, escritórios de advocacia? Coisa mais “normal” do mundo. Qual é o “problema” de o juiz descumprir a lei das interceptações? É só uma leizinha mequetrefe. Enfim, foi apenas um guardanapo fora do lugar. No que atrapalha o butim?

Pior de tudo é que, se o garçom — que colocou o guardanapo no lugar errado —  fosse “o da defesa”, o jantar teria sido interditado e o pobre copeiro já estaria no ergástulo (que quer dizer “cadeia”).

É disso que se trata, pois não? O resto é narrativa. Você pode ter uma opinião sobre o tema, mas, por favor, não pode negar os fatos. Sim, fatos ainda existem, embora para algumas pessoas, em especial jornalistas da grande mídia, o ídolo seja Nietzsche (embora não saibam quem é o gajo), para quem “fatos não existem; só existem interpretações”. Logo, é possível mentir com ares de verdade. É possível dizer: ah, Moro foi parcial, mas… Aí é que está. O parcial, em direito, é fatal. Não tem nenhuma desculpa que venha depois desse “mas”.

O que está na mesa, então? Simples. Pode um agente público fazer o que Moro fez? O Supremo já disse que não pode. Claro: você pode não acreditar nos fatos e nem no que o STF disse sobre os fatos.

O grande problema é que parcela considerável das pessoas — e nisso se inclui gente (de)formada em direito — continua dizendo (ou pensando) que os processos contra Lula foram bloqueados por causa de “firulas”. Foi o “guardanapo”. É o fator “dono da padaria”.

A questão é: em Direito (você pode não gostar), uma garantia fundamental  é a do juiz natural. Engraçado é que todas as pessoas, do padeiro ao procurador, querem as garantias quando estão sob a mira da justiça — Dallagnol, por exemplo, disse que a firula chamada “prescrição” era o câncer da impunidade e, pasmem, agarrou-se a essa coisa maldita.

Não, não, juiz natural não é contrário de juiz artificial.  Quer dizer, até é. Se você cometeu um delito em Santos, não pode ser julgado em Recife.

Pior ainda, se é que pode haver algo mais grave que a incompetência, é um juiz parcial. O que é um juiz parcial? Pense no futebol. Ele pode decidir o jogo. De vários modos. Quem conhece um pouco do ludopedismo sabe o que um árbitro parcial pode fazer. Mais grave ainda é se depois do jogo o juiz for assumir um cargo na diretoria do time que venceu, quer dizer, do time que foi beneficiado pelo referido apitador.

É isso. Vamos separar o joio do trigo. Não transformemos a discussão sobre a suspeição de Moro em uma questão de “almoço de família”.

A suspeição de Moro é algo tão evidente como a ineficiência dessas máscaras de papel vendidas em bancas de jornal e padarias. Ou você acredita que basta usar qualquer máscara que estará protegido? Bom, se sim, nem dá para discutir a suspeição de Moro. São coisas excludentes.

Enquanto isso, você pode escolher: acredita no padeiro ou acredita na ciência do direito? Acredita na cloroquina ou na vacina? Se acredita na cloroquina, quer dizer, no Moro, então você pode sofrer um “aluvião”. Ou uma “enfiteuse”. Ou você pode ser embargado. Ou sofrer um agravo. De instrumento. Não sabe o que é isso? Pois é. Nós também não sabemos o que é hebefrenismo ou Mononegavirales. São termos médicos. Por isso sempre respeitamos os médicos. Os cientistas. E não os padeiros.

Você concorda com isso? Sim? Então acredite aqui na gente. Parcialidade é uma doença grave do direito. É como a Covid-19. Não tem remédio. Só vacina. A vacina é a anulação de todas as provas.

OK? Estamos de acordo? Então pare de acreditar no dono da padaria. E nos jornaleiros.  

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Comentários

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Izabela

31/03/2021 - 17h37

Sensacional! O duplipensamento está aí, mas acaba caindo golpe também quem não quer.

Valdeci Elias

29/03/2021 - 10h07

A Democracia Brasileira, é muito fraca . Um funcionário público , interfere abertamente no processo eleitoral , e nenhuma instituição brasileira reage. Um dos pontos positivos dessa história , é Lula em vida , conseguir anular o processo . Sempre achei que daqui a 50 anos, o governo brasileiro reconheceria o erro, anularia o processo , e chamaria algum neto ou bisneto de Lula pra receber uma medalha ou diploma . O Moro achava que só responderia por seus crimes , quando fosse muito velho ou que já tive morrido.

Janster

29/03/2021 - 07h44

O dono da padaria, da papelaria e do sacolão sabem muito bem quem é Lula e nada vai mudar…votaram para Bolsonaro e votarão de novo …continuem espumando raiva pelos cantos da boca !! Kkkkkkkkk

Valeriana

29/03/2021 - 00h23

Marreco lalau

Tony

28/03/2021 - 22h18

Os bozolóides piram e se cagam de medo rs

helio

28/03/2021 - 21h36

Depois de postar meu comentário, resolvi ler os outros comentários, o que me levou imediatamente a buscar o título do “blog”, tal a presença de antidemocratas (serão bozós?).
A dificuldade de entender a essência da tese do texto, com o uso de figuras de linguagem; o ranço obscurantista; a agressividade figadal…

Helio

28/03/2021 - 21h31

Muito “padeiro” neste país kkkk

Tiago Silva

28/03/2021 - 20h40

É nisso que dá o site Cafezinho preferir o “caça-cliques” de insuflar o antipetismo desde 2018, pois Lula e PT geram engajamento, ao invés de se buscar alfabetizar politicamente a classe média que se radicalizou e parte dela é audiência e comentarista deste site.

Neste artigo o Lênio Streck, um dos maiores pensadores vivos do Brasil atual, tenta ser o mais didático possível em demonstrar os crimes praticados pelo juiz corrupto que buscou manipular a democracia, eleições e até opiniões com parcialidade flagrante!

Uma pena que os comentários, com as louváveis exceções, são para apoiar a injustiça praticada pelo Marreco Corrupto e Farsa-Jato…. O analfabetismo político nesse caso soma-se com ignorância jurídica e ignorância sobre o mais elementar entendimento do que seja justiça e legalidade (ou injustiça e ilegalidade).

Assim, o site Cafezinho nem tem direito (para fazer uma alusão ao brilhante texto de Lênio Streck) de inconformar-se de que a classe média desembarca de Bozo para o NeoFascista corrupto do Moro, que em pesquisas deste momento já está à frente do Ciro (que também contribuiu pra isso ao se demonstrar como Biruta de Aeroporto, quando não busca ajudar no reposicionamento de marca do PSDB, queridinho também do Moro, ou ajudar reposicionar golpistas literalmente ” filhotes e netos da Ditadura”)!!!

O pior cego é quem não quer ver….

    Alexandre Neres

    29/03/2021 - 11h34

    Prezado Tiago Silva, fique tranquilo que é um robô só. Até pelos horários se constata isso. Tem dia que diz se chamar Welington, tem dia que é Andressa. Daqui a pouco vão utilizar até seu nome rsrs. Abração

Daniel

28/03/2021 - 20h13

Alguém avise os babacoides que escreveram essa porcaria que a esquerda perdeu o monopólio da informação e por tanto daqui pra frente vai ser difícil impor o que eles acham bom para os outros.

A Bientot.

Ugo

28/03/2021 - 19h24

Se o dono da padaria for baba ovo de Lula assim como os energúmenos que escreveram essas cretinices certamente concordará com eles.

Olinda

28/03/2021 - 18h56

Presunção, arrogância, soberba e tentativa de descreditar a opinião alheia e impor a própria…a essência mais pura do esquerdismo.

    Janster

    29/03/2021 - 07h49

    Resumo perfeito.

Poliana

28/03/2021 - 18h54

Quem escreveu essa imundícia tem nojo da opinião da padaria né…?

O dono da padaria deve ter a opinião dele…?

Merda pura.

    Yuri Canastra

    28/03/2021 - 20h09

    O papel político que o STF está fazendo por falta de oposição a esse governo desde 1 de janeiro de 2019 é claro e evidente…fora os inquéritos ilegais, as prisões de jornalistas e políticos, as porqueiras jurídicas, as intervenções em assuntos do executivo, etc.

Willy

28/03/2021 - 18h51

Nesse texto asqueroso emerge todo o desprezo que a esquerda tem pela opinião popular e a costumeira arrogância.

Uma tentativa de impor a própria visão para os outros… nenhuma novidade.

Ronei

28/03/2021 - 18h48

Perguntem ao brasileiros se acreditam nas pilantragens de Lula ou nas sentencias de Moro…

    nelson

    28/03/2021 - 23h05

    É logico que é no POVO personificado na figura de LULA melhor PRESIDENTE que surgiu no MUNDO. Quem é bandido acredita no juiz ladrão.

      Ronei

      29/03/2021 - 07h47

      Levem Lula em praça pública sem avisar ninguém para ver….kkkkkk

      Junior

      29/03/2021 - 11h40

      Nelson, tu é doente. Sério!

Tony

28/03/2021 - 18h47

A opinião do vulgo (que a esquerda odeia e vê com desprezo absoluto quando não consegue impor ao mesmo o que ela quer) é soberana.

Podem anular a Lava Jato por completo que nada mudará…seus vermes.

Ronei

28/03/2021 - 18h45

Moro foi declarado suspeito exclusivamente porque Gilmar Mendes (o Bode) odeia a Lava Jato e Cármen Lúcia faz o que Gilmar mandar.

Gilmar Mendes foi claramente parcial no seu voto, presunçoso, arrogante, revoltado com o voto do Ministro Cássio, espumando raiva pela boca e até chorando para o Advogado de Lula…. uma scena ridícula nunca vista antes no meio jurídico….patético.

TRF4 e STJ confirmaram os crimes de Lula que são nítidos do começo ao fim…assim como são o do Sítio de Atibaia.

O resto é esquerdofrenia.

Cezar

28/03/2021 - 18h39

De fato, a tradição bacharelesca leva ao elitismo do diálogo, quiçá do monólogo ou conversa entre acadêmicos. Faz com que os operadores do Direito fiquem muito distantes do povo. De tanto grafar os termos, reproduzir os conceitos, institutos e princípios jurídicos, acabam por reduzir o interesse difuso, geral, de todos, em “debate de estrela”. Diz a máxima popular que o uso do cachimbo deixa a boca torta.
Nesse passo, melhor a dicção tem Lula, que comunica-se com o público com naturalidade e maestria. Socorre-se de exemplos e imagens “futibolísticas” bem ao sabor da maioria daqueles que decidem (o povo). Coisa que a Dilma, Ciro e tantos outros não conseguem.
Hipoteticamente falando, seria bom que os juristas traduzissem para Lula o hermético “juridiques”, para o povo possa entender que suspeição significa a existência de uma situação real (fática), que não o juiz julgar com isenção, por exemplo: se a parte ou o advogado é sua mulher, seu filho etc. Ou se o juiz ajudou uma das partes ou “roubou na partida para um time, em prejuízo do outro”. Um horror de linguagem nos ouvidos dos juristas e puristas do Direito, mas devemos lembrar que não estamos na Suíca.
Mas aí vem a pergunta, hipoteticamente, seria inútil perguntar às pessoas se elas aceitariam, que sua mãe (não genitora do juridiquês) ou seu filho fossem condenados a 12 anos de cadeia por um juiz ladrão, corrupto ou politiqueiro? As pessoas aceitariam isso tranquilamente, sem reagir, sem se rebelarem?
Será que achariam isso normal?
Ou indagar-lhes se concordariam que seu time fosse “roubado” por um juiz de futebol que inventasse pênalti, apitasse a partida desonestamente contra seu time e, depois, assumisse um cargo na diretoria do time adversário? Seria normal?
A toda evidência que as perguntas precitadas não estariam no padrão formal dos autos, ou da academia, mas, humildemente, seria uma sugestão para chegar até quem decide, Sua Excelência, o Eleitor, pois, ao fim e ao cabo, o que importa é o voto na urna.
Depois de ganha a eleição, os juristas retornariam ao leito formal da linguagem de tertúlia jurídica (kkk).
SMJ

Alexandre Neres

28/03/2021 - 18h31

Bem, acho que mais claro que isso só se desenhar. Lavajatistas, vocês acreditaram numa quimera. Foram levados no bico sobretudo pela Globo e endossaram práticas espúrias inequívocas praticadas por santos do pau oco que corromperam flagrantemente o sistema judicial brasileiro. A sorte dos gaiatos é que o Congresso teve siso e não aprovou as dez medidas fascistas propostas pela República de Curitiba. Senão, se fosse como eles propuseram, seria possível aproveitar as provas obtidas de modo ilícito pelos hackers para processá-los. De todo modo, dentro em breve essa escumalha terá que responder pelos atos que cometeram na esfera criminal. E então, lavajatistas, irão fazer autocrítica por estarem defendendo bandidos?

Este outro artigo dele é ótimo pra entender as chicanas do Fachin.
https://www.conjur.com.br/2021-mar-26/streck-breda-castro-supremo-duelo-plenario-turma

Paulo

28/03/2021 - 18h09

“Então pare de acreditar no dono da padaria. E nos jornaleiros.” E vamos acreditar em quem? Nos advogados, que são parte no processo? Ou nos “adevogados” do STF? Esse Lênio Streck se parece cada dia mais com o Roberto Requião dos rábulas…

    Bandoleiro

    29/03/2021 - 09h39

    Tem que acredita no que Lenio Esterco diz e pronto….nao sabia disso ?


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